Os esforços se concentram em atender às demandas do capital volátil, para impedir qualquer movimento que pressione a inflação.
O Boletim Focus projeta uma taxa Selic de 15% em 2025, seguida por 12,25% em 2026, 10,5% em 2027 e 10% em 2028. Essas expectativas, que moldam a política monetária, indicam uma economia amarrada até pelo menos 2027 — justamente quando o Brasil deveria estar investindo em sua transição industrial, explorando vantagens competitivas em terras raras e energia verde. Em vez disso, o país se vê diante de um esforço fiscal sufocado por juros estratosféricos.
Déficits que não fecham
O resultado primário do setor público — diferença entre receitas e despesas, sem contar os juros — está previsto em -0,50% do PIB em 2025, -0,60% em 2026 e -0,40% em 2027. Já o resultado nominal, que inclui os juros da dívida, é alarmante: -8,50% em 2026, -8,40% em 2027 e -7,40% em 2028. A precisão milimétrica dos números não esconde a realidade: o país está preso a uma armadilha fiscal que inviabiliza qualquer projeto de desenvolvimento.
Reféns do mercado
Governos frágeis, sem consenso político amplo, tornam-se reféns do mercado. O primeiro passo é abrir as fronteiras ao livre fluxo de capitais. A promessa é sedutora: o capital internacional viria em busca de países mais baratos, provocando um transbordamento de desenvolvimento. Mas a realidade é outra. O capital-gafanhoto entra quando o país está “barato”, sai quando está “caro” e impede qualquer estabilidade necessária para planejamento de longo prazo.
Com isso, o Banco Central perde o controle sobre o câmbio, que passa a oscilar conforme a entrada e saída de dólares. Mais dólares, o real se valoriza; menos dólares, o real se desvaloriza. E tudo — inclusive os índices de preços — passa a depender desse movimento errático.
O custo da Selic
A Selic, hoje, é o centro gravitacional da política econômica. E seu custo é brutal:
- Cada ponto percentual da Selic custa cerca de R$ 54 bilhões por ano.
- Reduzir 1 ponto por 8 anos geraria uma economia de R$ 550 bilhões — suficiente para universalizar o tratamento de esgoto no país.
- Com apenas 0,62% da Selic, seria possível financiar integralmente o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico.
- Com 2,12 pontos, o BNDES poderia dobrar seus financiamentos.
- Com 2,08 pontos, o governo federal poderia dobrar os gastos com todo o sistema federal de ensino.
- 4,31 pontos equivalem ao gasto total com saúde; 2,08 ao gasto total com educação.
- 0,47 ponto cobriria integralmente a nova faixa de isenção do Imposto de Renda.
- 0,46 ponto equivale à arrecadação da nova taxação dos super-ricos.
Esses números mostram que a política de juros altos não é apenas uma escolha técnica — é uma escolha política, com consequências sociais profundas.
Sem pacto, sem saída
Um país é um corpo complexo, que se desdobra em vários objetivos. O principal deles é o desenvolvimento com viés social, formando o círculo virtuoso de melhoria da economia –> melhoria da renda –> melhoria do consumo –> aumento da receita. Quando se escancara as portas para o capital volátil, perde-se o controle sobre a política econômica.
Todos os esforços se concentram em um único ponto – atender às demandas do capital volátil, para impedir qualquer movimento que pressione a inflação. E a um custo que inviabiliza qualquer política pública.
Não há saída individual para um governo acuado. A única alternativa é a construção de um pacto nacional. Um governo fortalecido por consenso social e político terá condições de atravessar o período de transição — inevitavelmente turbulento — resistindo às pressões do mercado, às chantagens do Congresso e às sabotagens internas.
Lula caminha para conquistar o apoio do centro e do centro-direita civilizado.
É urgente que cessem as desconfianças entre os lados civilizados do país. Só assim será possível, enfim, pensar no futuro — com soberania, desenvolvimento e justiça social.
Autor: Luis Nassif – Publicado no Site GGN.
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