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20 de agosto de 2025

Escolha de palavras.

Cada palavra possui um significado único. Mesmo no caso de sinônimos, a escolha entre um e outro leva em consideração uma série de vontades e verdades pessoais, fato que os dicionários escondem. Há vocábulos efêmeros, que simbolizam acontecimentos momentâneos que o tempo apaga. E existe o que é sem ter um rótulo específico. O que há algum tempo tem sido denunciado pelo mau uso das redes sociais envolvendo crianças, ressurge com o nome de adultização, termo que aparece já no final dos anos 1960, sendo mais frequente nos anos 1980, mas sem constar dos dicionários até hoje. Curioso que o verbo do qual é originário não aparece em consulta à hemeroteca digital da Biblioteca Nacional. Ou seja, Aurélio e Houaiss não se interessaram por aquilo que representava a supressão criminosa da infância de crianças. Sérgio Rodrigues, na Folha de S. Paulo, é quem está atento ao jogo de palavras no qual estamos inseridos, mesmo sem o querer. Além da adultização, dia desses ele falou da origem da traição, outra palavra atual, não traindo seus princípios ao redigir a coluna (https://www1.folha.uol.com.br/colunas/sergio-rodrigues/2025/08/trairagem-e-sabor-de-sorvete-da-moda.shtml).

Muito bom! Sugeri estender a significância para a tradução, que pode até não ter a mesma origem, mas tem a ver com transpor uma palavra para outra e lembra o ditado italiano (traduttore traditore), muito importante quando a subserviência aos EUA leva a traduzir - e trair - os mandos e desmandos de lá.

Outro dia, criticavam as palavras escolhidas como xingamentos usando animais. Asno, burro, vaca, piranha, jararaca, e por aí vai. Mas a patrulha limita-se à ignorância e ao furor de cada um. Canalha, por exemplo, ficou fora da lista, mas sua origem é do cão, um bom animal, julgo eu. Os gatunos têm um nível ofensivo um pouco menor, mas desrespeitam a felinicidade (https://adilson3paragrafos.blogspot.com/2025/08/felinicidade.html). Outro conjunto perigoso com o qual lidar é o de gentílicos, e condeno-me, desde já, pelo uso que faço a seguir. Se os extremistas de direita não são gentis, os gentílicos dão o tom. Pode ser o gentílico gramatical, de designação de origem, ou também o do gentio não civilizado, a critério do leitor e de seus conceitos e preconceitos. Assim, a espanhola presa pela polícia italiana é símbolo dos antipatriotas brasileiros que enaltecem o governo norte-americano por querer transformar nosso país em enredo de filme mexicano. Resgatam os princípios do partido alemão que causou destruição ao povo europeu e levou à morte de milhões de judeus, mas hoje subvertem a história para confundir a sina israelense com o morticínio palestino. A coisa parece ficar russa quando, na verdade, o que se busca é um negócio chinês que seja bom para todas as partes.

Somos inteligentes para a criação e dependentes do que criamos, incluindo as palavras e a tal da inteligência dita artificial (IDA). Nossa consciência da morte levou a angústias da própria existência. Por que viver, se finita é a vida? Da mais simples reflexão à mais complexa filosofia, a pacificação psíquica se dá pelo entendimento ou aceitação do que realmente somos e para onde vamos. Sei que somos átomos universais, nada mais que isso, e entendo e respeito que outros precisem de aceitação da efêmera existência intermediada pelo mítico e místico. Sim, criamos a inteligência artificial há muito tempo, quando, refugiados em árvores, escondidos em cavernas, nos assustamos com a natureza e criamos deuses para explicá-la. Deuses inteligentes que, sem fios, bits ou bytes, transformaram-se ao longo do tempo até vingar a ideia de um deus atual, onipresente e onipotente, pregador da guerra e da paz, conforme as conveniências de quem o segue. Além da palavra para dizer o que somos, criamos divindades para querer, talvez, ser o que nunca seríamos.

Autor: Professor Adilson Roberto Gonçalves – Publicado no Blog dos Três Parágrafos.

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