Crédito Matheus Britto.
Atualmente, um número alarmante de idosos continua trabalhando, não por escolha, mas por necessidade. Diante disso, como garantir dignidade a uma geração que envelhece à margem da proteção social?
Os brasileiros estão preocupados com a aposentadoria e isso revela um problema da precarização do nosso sistema previdenciário. A realidade aponta para a necessidade urgente de planejamento financeiro individual. Conforme estudo publicado pela Global Pension Report da Allianz, o Brasil está na 65ª posição entre os 75 países avaliados em 2023. Isso reflete uma estrutura previdenciária frágil, que é ameaçada por transformações demográficas e políticas. O envelhecimento da população, conjuminado a uma baixa taxa de natalidade, compromete o modelo atual baseado na contribuição da população economicamente ativa.
Desde a Reforma da Previdência, conquistar a aposentadoria tornou-se um desafio ainda maior. Hoje, homens só podem se aposentar aos 65 anos, com no mínimo 20 anos de contribuição, enquanto as mulheres precisam ter 62 anos de idade e ao menos 15 anos de contribuição. A modalidade por tempo de contribuição foi extinta, afastando ainda mais o direito de quem depende dessa renda para garantir estabilidade financeira no futuro. Reflexo disso é o crescimento do endividamento entre os idosos: de acordo com dados do Serasa, em maio de 2025, mais de 12,7 milhões de brasileiros com mais de 60 anos estavam endividados, um salto de 32,7% em relação a 2019.
Há, hoje, um número assombroso de idosos que seguem trabalhando não por opção, mas por necessidade. Cerca de 47% dessa população está na informalidade, sem qualquer proteção social. Em muitos lares, a aposentadoria de um familiar com mais de 60 anos representa a única fonte de renda fixa, uma base econômica frágil e cada vez mais ameaçada.
Outro ponto crítico é que os reajustes da Previdência não acompanham a evolução do salário-mínimo. Em 2024, por exemplo, enquanto houve um aumento de 6,97%, os benefícios previdenciários foram corrigidos em apenas 3,71%. Isso gera dois efeitos preocupantes: de um lado, há o achatamento dos valores acima do mínimo; de outro, uma elevação automática daqueles abaixo do piso, por força de lei.
Pela Constituição, nenhum benefício que substitua a remuneração pode ser inferior ao salário-mínimo. No entanto, o que ocorre na prática é que muitos benefícios são inicialmente calculados abaixo desse valor e depois ajustados apenas para cumprir a exigência legal. Isso mostra que o sistema previdenciário já opera no seu limite mínimo de proteção. Uma possível desvinculação dos benefícios em relação ao salário-mínimo representaria um colapso na renda de milhões de brasileiros, aprofundando ainda mais a vulnerabilidade social.
O que se observa nas últimas décadas é a consolidação de manobras institucionais que minam o papel da Previdência Social. Reformas e ajustes legais, muitas vezes distantes da realidade da população, têm expropriado direitos sob a justificativa de equilíbrio fiscal. Leis mal elaboradas, ou propositalmente elitizadas, contribuem para o esvaziamento de um dos maiores instrumentos de justiça social já construídos no país.
Atualmente, cerca de 32 milhões de brasileiros estão na informalidade, segundo dados da Agência Brasil. Ou seja, nenhum deles tem carteira assinada. Isso interfere diretamente na previdência social do país, afinal, como será a velhice de quase 40% da população daqui a alguns anos? Como garantir dignidade a uma geração que envelhecerá à margem da proteção social?
A Previdência Social é mais do que um direito: é um pilar de combate à fome e à desigualdade, previsto na Constituição como um dever do Estado. Não existe programa de transferência de renda que substitua sua importância. O Brasil precisa decidir que futuro quer construir para o seu povo e isso passa, obrigatoriamente, por políticas públicas sérias, inclusivas e baseadas no princípio de que o Estado deve servir à base que o sustenta: o cidadão comum.
Autor: Fernando Lamounier é educador financeiro e sócio-diretor da Multimarcas Consórcios. Publicado no Site Le Monde Diplomatique Brasil.
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