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25 de julho de 2020

Teto constitucional: uma mentira aplicada apenas em quem não é político ou do juiz!

            O chamado Teto Constitucional significa o abatimento de valores de remuneração, subsídio, provento ou pensão recebida, que excedam o teto remuneratório definido pela Constituição Federal. Nos Estados e no Distrito Federal, o teto é o que ganha o governador, no caso do Poder Executivo, e os desembargadores do Tribunal de Justiça, no caso do Judiciário.
O valor do teto constitucional em 2020 é de R$ 39.293,00, entretanto, o sistema judiciário brasileiro pagou mais de R$ 100 mil a pelo menos 8.226 juízes entre setembro de 2017 a abril de 2020. O montante extrapola o teto constitucional.
Neste período foram feitos no total 13.595 pagamentos acima de R$ 100 mil. Muitos magistrados receberam este valor mais de uma vez. 507 magistrados receberam vencimentos acima de R$ 200 mil 565 vezes.
O jornal analisou dados dos 27 Tribunais de Justiça dos estados, 5 Tribunais Federais, 24 cortes trabalhistas, 3 tribunais militares estaduais e dos tribunais superiores. A Justiça Eleitoral não foi inclusa no levantamento.
A partir de 2017 os tribunais, com exceção do Supremo Tribunal Federal (STF), passaram a encaminhar folhas para o CNJ (conselho Nacional de Justiça).
Mais da metade dos salários de 26.177 juízes e aposentados nos anos analisados superaram o teto constitucional. Segundo os dados levantados, 95,79% dos magistrados receberam pelo menos uma vez salários superiores ao teto.
Os salários acima do teto são mais recorrentes em tribunais estaduais. Apesar da Constituição determinar um valor máximo para os salários dos magistrados, são somados aos montantes recebidos os auxílios, verbas indenizatórias e vantagens eventuais, com 13° e acúmulo de funções que explicam os supersalários dos juízes.
Os salários pagos pelo poder Judiciário seguem uma escala que toma como base os salários dos ministros do STF. Seguindo este escalonamento, os ministros dos tribunais superiores como STJ, TST e STM devem receber até 95% do que ganham magistrados do Supremo, enquanto que os desembargadores dos TJs recebem o equivalente a 90,25%. Juízes Federais recebem até 80%, magistrados titulares de uma vara federal recebe 85% do teto. Os desembargadores federais recebem o teto de 90%.
Para provar que esse teto constitucional é uma falácia, em São Paulo, onde o PSDB está no poder há 25 anos, os governadores não aumentam seus salários como manda a lei, retendo assim, parcela considerável dos vencimentos dos servidores públicos do Estado. O salário do governador R$ 23.048,59 é inferior ao dos prefeitos das capitais brasileiras, desmerecendo assim a importância o cargo e dos seus secretários que ganham um valor ainda menor.
Os empregados de empresas estatais, hoje, quase todas já privatizadas nunca sofreram descontos enquanto na ativa, porém, os empregados beneficiários da Lei 4819/58, extinta em 13 de maio de 1974, ao se aposentarem passam a receber suas aposentadorias pela Fazenda Estadual, que então passa a aplicar o teto salarial do Estado.
Ao contrário da aplicação do Teto Constitucional federal, no Estado de SP, não se leva em conta, apenas o salário bruto, mais todo e qualquer adicional de carreira que o aposentado tiver no seu salário. Estes empregados não são funcionários públicos, nunca tiveram quaisquer regalias concedidas pelo Estado, como por exemplo, a “Sexta-parte”, adicional que todos os funcionários públicos em SP têm direito.
Ao entrar com ação, quando esta chega à terceira e última instância os mesmos desembargadores que recebem regalias à revelia do Teto Constitucional Federal, julgam estas ações improcedentes. “Façam o que eu digo, mas não faça o que eu faço”.    

Autor: Rafael Moia Filho – Escritor, Blogger e Graduado em Gestão Pública.

23 de julho de 2020

O tamanho do Brasil e do seu desperdício!

Nos governos corruptos, em que há pelo menos
suspeita geral de muita despesa desnecessária e
grande malversação da renda pública, a quantidade
e quantia de impostos são enormes. Adam Smith

Milhares de vez já ouvimos a frase: “O Brasil é uma país com um território imenso, cheio de riquezas, porém, pobre”. A pobreza está ligada diretamente a estirpe de nossa classe política aliada a falta de acesso a educação e informação do nosso povo.
A nossa participação política é pequena, se restringe quando muito ao período eleitoral. Sabemos que a participação política é fundamental, é o exercício da liberdade individual para a construção do bem comum. Além de ser um direito fundamental consagrado no Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, artº 25 e parte da Declaração Universal dos Direitos Humanos, artº 2.
Isso muitas vezes explica a escolha de governantes que ao invés de ajudarem no desenvolvimento do país, acabam envolvidos em corrupção, atraso e destruição dos sonhos da nação.
 O Brasil é tão grande que dentro do seu vasto território cabem vários países do mundo como Equador, Hungria, Senegal, Reino Unido, Alemanha, Dinamarca, Suíça, Espanha, Finlândia, Trinidad e Tobago, Venezuela, França, Israel, Nova Zelândia, Guiné, Laos, Nepal, Mongólia, Guiana, Tajiquistão, Angola, Itália, Grécia, Bósnia, Croácia, Portugal, Haiti. Ou seja, vinte e sete países de vários continentes cabem dentro do nosso Brasil.
Sua grandeza, porém, termina neste aspecto, deixando a desejar quando pensamos na construção de uma sociedade com Índice de Desenvolvimento Humano compatível com seu tamanho e importância. O desperdício de riquezas minerais, água, alimentos, terras improdutivas, fauna, flora e petróleo demonstram de forma cabal que não nascemos para liderar e sermos ricos.
Somos dependentes das grandes potências que acima de qualquer coisa desenvolveram seu sistema educacional em primeiro lugar. São produtores de aço e tantos outros produtos que o Brasil, embora tenha matéria prima, é totalmente dependente de exportações.
Entretanto nossa maior fraqueza, nossa maior mazela está na classe política, desde o mais simples vereador numa pequena cidade do extremo norte até o presidente da república. Gente hipócrita, corrupta, avessa a honestidade, a ética e ao que afeta ao seu próprio povo. Com isso, produzimos um sistema político que está falido moralmente, onera os cofres com milhares de servidores desnecessários (assessores e demais cargos em comissão), caros e improdutivos na maioria dos casos.
Esta mesma classe política que legisla e executa o orçamento das cidades, Estados e da Nação desviando finalidades, investindo pouco em Saúde, Educação, Habitação, Segurança e Saneamento, porém, destinando bilhões ao que não nos interessa.
O desperdício de tempo, recursos financeiros e de ciência e tecnologia no país é algo imensurável. Talvez jamais possamos recuperar tempo e os valores perdidos por falta de capacidade de gestão pública, do desperdício em opções desvantajosas para a nação e pela corrupção que está entranhada no nosso cotidiano.   

Autor: Rafael Moia Filho: Escritor, Blogger e Graduado em Gestão Pública.

Guedes - Um caderno em branco!

“Há os especialistas do dizer,
do falar e não do pensar”.
Milton Santos

O ministro da economia chegou ao ministério precedido de tanta expectativa que mais parecia um enorme balão inflado pairando no ar da esplanada ministerial. Chegou a ser chamado de “Posto Ipiranga” uma alusão a propaganda veiculada daquela empresa que dizia “Pergunte lá no posto Ipiranga”.
A primeira voz dissonante que ouvi em relação a ele foi numa palestra do Historiador Marco Antônio Villa no aniversário de um ano da Rádio Jovem Pan News Bauru. Ele desmontou completamente o ministro que não tem um livro sequer publicado sobre economia, jamais defendeu uma tese de mestrado sobre economia e nem tem publicações em revistas especializadas.
Percebi que o então queridinho do mercado financeiro era uma espécie de caderno em branco, vazio, sem nada a oferecer, sem um projeto a médio e longo prazo para a recuperação da economia nacional e a volta do pleno emprego.
Sua participação no atual governo está restrita até agora pela sua insistência na aprovação da Reforma da Previdência, que não trouxe nem nunca irá trazer os benefícios alegados a época junto ao Congresso e a sociedade brasileira. A reforma tinha como objetivo primordial prejudicar e dificultar a aposentadoria para o trabalhador brasileiro, além de retirar recursos das pensões que viessem a ocorrer posterior à sua implantação.
Depois da reforma promulgada, Guedes sumiu, desapareceu do noticiário e agora reaparece com a insistente tentativa de recriar a CPMF, desta vez chamando-a de “Imposto sobre Transações Eletrônicas” que pretende cobrar 0.2% sobre pagamentos efetuados sobretudo em compras eletrônicas. Somente em junho, em plena pandemia, esse comércio arrecadou algo em torno de R$ 24,0 bilhões.
Aliás, a reforma tributária que Guedes e Bolsonaro pretendem não propõe redução na obscena carga de impostos que o brasileiro paga, mas sim, manter a mesma arrecadação com um número menor de tributos, agregando-os somente. Emprego? Está no caderno vazio, aquele com as páginas em branco. Desenvolvimento sustentável da economia? Está no mesmo caderno em branco. Nenhuma linha sequer ou um desenho que seja.
Arte: Amarildo

Autor: Rafael Moia Filho: Escritor, Blogger e Graduado em Gestão Pública.
 

17 de julho de 2020

PPP - Prefeito Perdeu o Passo!

“Não se podem censurar os jovens preguiçosos,
quando a responsável por eles serem
assim é a educação dos seus pais.”
Esopo

Entende-se como PPP - Parceria Público-Privada um contrato de prestação de serviços de médio e longo prazo (de 5 a 35 anos) firmado pela Administração Pública e regulado pela Lei nº 11.079/2004, cujo valor não seja inferior a vinte milhões de reais, sendo vedada a celebração de contratos que tenham por objeto único o fornecimento de mão-de-obra, equipamentos ou execução de obra pública.
Na PPP, a implantação da infraestrutura necessária para a prestação do serviço contratado pela Administração dependerá de iniciativas de financiamento do setor privado e a remuneração do particular será fixada com base em padrões de performance e será devida somente quando o serviço estiver à disposição do Estado ou dos usuários.
Em Bauru, o prefeito quer lançar uma PPP para resolver o problema da iluminação pública da cidade aos 47 minutos do segundo tempo, quando as luzes já estão se apagando em sua gestão.
Deveria tê-lo feito no início de seu governo, visto que tinha maioria na Câmara, apoio popular e condições de levar adiante junto à sociedade um empreendimento deste vulto financeiro.
O processo envolve recursos na ordem de R$ 360 milhões e tem de ser aprovado pela Câmara, onde hoje, faltando cinco meses para o final do mandato, o prefeito não conta mais com a maioria folgada para aprovação.
Este processo precisa ser discutido à exaustão com a sociedade, com as entidades civis, para que não fique uma dúvida sequer sobre sua implantação, custo, melhorias a serem efetuadas, prazos e outros detalhes inerentes ao sistema.
De acordo com a consultoria contratada pelo município, durante o período de concessão, usando valores atuais, a empresa vencedora terá uma despesa de R$ 235 milhões - são R$ 95 milhões para investimentos, R$ 110 milhões para operação e manutenção, e R$ 30 milhões com custo administrativo. Portanto, ainda será possível aferir um lucro bruto de até R$ 125 milhões, se o valor da CIP for mantido, e sem considerar a inflação e correções posteriores.
A gestão que está chegando ao final foi péssima em vários sentidos, deixar para o final algo tão importante é apenas mais um detalhe dessa ópera bufa que representou a gestão de Gazzeta à frente da municipalidade.
Tanto que a descrição da PPP em Bauru poderia ser outra, aliás, deveria ser Prefeito Perdeu o Passo. Não somente na resolução da iluminação pública, mas também na conclusão da Estação de Tratamento de Esgoto, remodelação da estação de tratamento de água, asfalto, saúde, educação, etc. Enfim, sua gestão foi mesmo uma PPP...

Autor: Rafael Moia Filho: Escritor, Blogger e Graduado em Gestão Pública.

16 de julho de 2020

Como explicar 2020?

“Há os especialistas do dizer,
do falar e não do pensar”.
Milton Santos
Criador: Kira-Yan Crédito: Getty Images/iStockphoto
O meu querido amigo bauruense João Bidu, astrólogo e dono de uma editora, cujas previsões são publicadas em diversos jornais e revistas do país há muitos anos, fez uma previsão em dezembro de 2019 que viralizou na internet. À época, numa entrevista concedida a um jornal de Bauru, no interior paulista, ele disse: “podemos esperar um ano mais leve do que 2019, não só para as pessoas, mas para o mundo em geral.”
Ele é um homem sério, correto, trabalhador, porém, foi traído por este inusitado e atemporal ano de 2020. Um ano que ficará marcado para sempre na história deste século em que vivemos.
Não encontrei ainda algum astrólogo, vidente ou quem quer que seja que tenha previsto tudo isso que estamos vivenciando neste ano de pandemia, vírus chinês e isolamento social num mundo completamente à mercê do novo, do inusitado, da ciência e do medo.
Um ano que começou com as notícias vindo do outro lado do mundo dando conta do surgimento de um vírus que poderia levar a morte. Nem os países da Europa, nem os da América do Norte deram muita importância, achando que aquele vírus não chegaria tão distante. Na América do Sul, normalmente com países governados por ineptos, a tragédia anunciada não poderia ser pior.
As mudanças na sociedade começaram em março, com o estabelecimento do isolamento social, algo nunca feito nem vivido por esta nossa geração. O inusitado entrou em cena, neste momento esperava-se que com trinta dias tudo pudesse ser resolvido, o sacrifício seria pequeno diante do problema gigante.
Porém, nada disso aconteceu, não houve seriedade nem dos governantes, nem dos brasileiros em geral. Em meio a boatos infundados de surgimento de medicamento para a suposta cura, lá se foi mais um tempo perdido.
Os dias foram se passando e depois de 120 dias ainda temos isolamento social, casos novos surgindo, óbitos e muita confusão na saúde, economia e na vida da sociedade em geral.
A humanidade não soube lidar com o inusitado, o novo assustou e transformou o que seria difícil em algo insuportável para essa travessia de alguns meses. Desemprego, comércio fechando portas, negócios ruindo, mais de setenta mil mortos, ou seja, um caos.
Um presidente negacionista e com visão limitada, que não aproveitou a oportunidade para ser um líder, preferindo ser o bobo da corte. Governadores perdidos entre seguir a ciência e ceder a pressão da economia, deixando como sempre o rastro da corrupção a vista nas compras emergenciais e nas licitações.
Sairemos como entramos, nem melhores nem piores, não aprendemos a lição que a pandemia possibilitou, com raras exceções de gestos humanitários, vimos mais do mesmo neste quadro patético da nossa sociedade gananciosa, que pensa em si e apenas em si mesmo e no seu vil metal.
Perdemos a chance de crescer como seres humanos, de dignificarmos nossa passagem neste planeta. Não foi desta vez. 

Autor: Rafael Moia Filho: Escritor, Blogger e Graduado em Gestão Pública.

População do Brasil deve encolher em quase 50 milhões até o fim do século, aponta estudo

Até o fim desde século, a população do Brasil deve encolher em quase 50 milhões de pessoas, a China cairá de primeiro para terceiro país mais populoso do mundo, Japão, Itália e Portugal devem ter suas populações reduzidas a menos da metade e a lista dos 10 países com mais habitantes no planeta incluirá 5 africanos - hoje, só a Nigéria faz parte dessa lista.
Pesquisadores apontam que a estimativa de vida dos brasileiros poderá saltar de em torno de 76 anos para uma média de 82 até o fim do século.
Este novo mundo com populações mais enxutas e idosas, onde migrações e trocas multilaterais preencherão vácuos na força de trabalho e abrirão espaço para novas potências é descrito por um novo estudo feito por pesquisadores da escola de medicina da Universidade de Washington e publicado nesta terça-feira (14) pela revista científica britânica The Lancet.
A partir de novas fórmulas para estimar taxas de natalidade, mortalidade e fluxos de circulação de pessoas, os autores desafiam previsões consagradas ao apontarem que a população mundial não deve crescer indefinidamente.
Para os pesquisadores, depois de alcançar um pico de 9,7 bilhões de pessoas, a população global começará a encolher a partir de 2064 até chegar a 8,8 bilhões em 2100 - quase 2 bilhões de pessoas a menos que o previsto em estimativas da ONU, por exemplo.
Resultado de um aumento no acesso à educação e no acesso a métodos contraceptivos em todo o mundo, a queda no número de filhos por família se repetiria em 183 dos 195 países e territórios estudados, incluindo o Brasil.
Segundo os autores, a população brasileira saltaria de 211,8 milhões (dado de 2017) para um pico de 235,49 milhões em 2043, quando entraria em queda acentuada, até chegar a 164,75 milhões de brasileiros em 2100.
As mortes decorrentes do novo coronavírus, ressaltam os pesquisadores, "dificilmente vão alterar significativamente as tendências de longo prazo previstas para a população global".
Ainda assim, apontam os pesquisadores, quando o tamanho da população e a distribuição destas pessoas por faixa etária mudam, a maneira como as pessoas vivem, o meio ambiente, as políticas públicas e a economia também se transformam.
O Brasil do fim do século 21
Os autores da pesquisa, que teve entre seus financiadores a Fundação Bill e Melinda Gates, apontam que a queda já percebida na quantidade de filhos por família no Brasil deve se intensificar nas próximas décadas.
Ao mesmo tempo em que a taxas de natalidade diminuirão, eles apontam que a estimativa de vida dos brasileiros poderá saltar de em torno de 76 anos para uma média de 82 até o fim do século.
O resultado direto seria uma população mais velha que a atual – o que também pode significar um encolhimento na economia brasileira, como explica à BBC News Brasil o norueguês Stein Emil Vollset, professor de saúde global da Universidade de Washington e um dos autores do estudo.
“Prevemos reduções no PIB total no Brasil como resultado do encolhimento da população em idade ativa, o que por sua vez é impulsionado pelas baixas taxas de fertilidade no país”, disse o professor por e-mail à reportagem.
“As taxas de fertilidade no Brasil estão abaixo do nível necessário para manter os níveis atuais da população há vários anos e prevemos que as taxas de fertilidade permanecerão abaixo do nível necessário para crescimento ao longo deste século”, continuou Vollset.
Segundo o levantamento, o Brasil se manteria como 8ª maior economia do mundo até 2050. Mas, até 2100, o Brasil seria ultrapassado por Austrália, Nigéria, Canadá, Turquia e Indonésia, e cairia para a 13ª posição no ranking das maiores economias do mundo.
Dono da sexta maior população mundial em 2017, ano usado como referência pelo estudo, o Brasil deve ocupar a 13ª colocação entre os países com mais habitantes até 2100.
Um novo futuro
Em nota enviada a jornalistas, o editor-chefe da revista Lancet, Richard Horton, disse que a pesquisa “oferece uma visão sobre mudanças radicais no poder geopolítico”.
“O século 21 assistirá a uma revolução na história de nossa civilização humana. A África e o mundo árabe moldarão nosso futuro, enquanto a Europa e a Ásia recuarão em sua influência”, diz.
Entre as principais movimentações no ranking das 10 maiores economias do mundo entre 2017 e 2100, segundo o estudo, destacam-se o avanço da Índia para o pódio dos maiores PIBs mundiais (um salto da sétima para a terceira posição) e uma ascensão meteórica da Nigéria, que saltaria da 28ª posição para a nona e se tornaria o primeiro país africano entre as 10 mais.
“Até o final do século, o mundo será multipolar, com Índia, Nigéria, China e EUA como potências dominantes. Este será realmente um mundo novo, para o qual devemos nos preparar hoje”, diz Horton.
A Rússia, por sua vez, cairia da atual 10ª posição para a 14ª. O vácuo dos russos seria ocupado pelo Canadá, que pularia da 11ª para a 10ª posição.
Segundo o professor Vollset, as flutuações nos PIBs dos países resultariam, entre outros fatores, de um "declínio no número de adultos em idade ativa (...) que poderá resultar em grandes mudanças no poder econômico global até o final do século.”
No mundo inteiro, segundo o estudo, a fatia da população com mais de 65 anos será bem maior que a com menos de 20 (ou 2,37 bilhões contra 1,7 bilhão).
Os pesquisadores argumentam que essa queda na proporção de jovens pode significar uma redução em índices como inovação das economias.
Também encolheria o mercado interno - formado por pessoas aptas a consumir bens e serviços. “Aposentados têm menos probabilidade de comprar bens de consumo duráveis do que os adultos de meia idade e jovens”, exemplificam os autores em nota à imprensa.
Segundo os autores, o fenômeno expõe “enormes desafios ao crescimento econômico trazidos por uma força de trabalho em declínio”, além de sobrecargas a sistemas de previdência social e saúde frente a populações cada vez mais idosas.
A explosão africana
O levantamento indica que as populações de 183 países do mundo devem encolher – “a não ser que a baixa natalidade seja compensada por imigração”.
Ainda assim, a população da África subsaariana, em média, deve triplicar até o fim do século, passando de 1,03 bilhões em 2017 para 3,07 bi em 2100.
Países subsaarianos, junto aos do norte da África e às nações do Oriente Médio serão os únicos, segundo o estudo, a registrarem aumento populacional até o fim do século.
O ranking dos cinco países mais populosos do mundo trará Índia (1,09 bilhão), Nigéria (791 milhões), China (732 milhões), EUA (336 milhões) e Paquistão (248 milhões).
Já a lista das 10 maiores populações incluirá, além da Nigéria, outros quatro países da África: República Democrática do Congo, Etiópia, Egito e Tanzânia. A situação é bem diferente da Ásia e da Europa – continentes onde acontecerão as maiores quedas em termos populacionais. No primeiro grupo, o Japão deve encolher das atuais 128 milhões de pessoas para 60 milhões em 2100, e a Tailândia deve ver sua população caindo de 71 para 35 milhões. A queda prevista para a China é ligeiramente menor, porém ainda impactante: de 1,4 bilhão em 2017 para 732 milhões em 2100.
Já na Europa, a população espanhola pode encolher de 46 a 23 milhões, enquanto a Itália perderá 30 milhões de cidadãos (de 61 para 31 milhões) e os portugueses irão de 11 para 5 milhões.
A jornalistas, o diretor da escola de medicina da Universidade de Washington, Christopher Murray, disse que o “estudo oferece aos governos de todos os países a oportunidade de começar a repensar suas políticas sobre migração, força de trabalho e desenvolvimento econômico para enfrentar os desafios apresentados pelas mudanças demográficas".
“Para países de alta renda com populações em declínio, políticas abertas de imigração e políticas de suporte para que famílias tenham a quantidade de filhos que desejarem são as melhores soluções para sustentar os atuais níveis populacionais, de crescimento econômico e de segurança geopolítica”, diz o professor. Os autores também ressaltam que as respostas de governos ao declínio da população não podem em qualquer hipótese interferir na liberdade e nos direitos reprodutivos das mulheres.
Limites
Entre os possíveis problemas do estudo, os autores dizem que as previsões podem ser afetadas pela quantidade e qualidade dos dados, “embora o levantamento tenha usado os melhores dados disponíveis”. Eles também apontam a possibilidade de imprevistos que possam afetar ritmos de “fertilidade, mortalidade ou migração”.

Autor: Ricardo Senra - BBC News Brasil em Londres

13 de julho de 2020

“A China é um país capitalista?”

O Estado não tem tanto peso na economia do gigante asiático como pensamos, escreve o economista em seu último livro, ‘Capitalismo sem rivais’ (Editora Todavia).
Camponeses da província de Hunan, na fronteira com Hubei - 05-3-20. Noel Celis-AFP-Getty Images
Mas será́ a China realmente um país capitalista? Trata-se de uma pergunta feita com frequência as vezes de forma apenas retórica, outras vezes de forma genuína. Podemos responder-lhe com certa brevidade usando a definição-padrão de capitalismo de Marx e Weber (...). Para ser classificada como capitalista, uma sociedade deve estar organizada de tal modo que sua produção seja empreendida a partir da propriedade privada dos meios de produção (capital, terra), que a maioria dos trabalhadores seja assalariada (sem estar atrelada legalmente à terra ou trabalhar como autônoma, usando seu próprio capital) e que a maior parte das decisões referentes à produção e à fixação de preços seja tomada de modo descentralizado (ou seja, sem que alguém as imponha as empresas). A China se mostra claramente capitalista nesses três quesitos.
Antes de 1978, a taxa de participação das empresas estatais (EE) no conjunto da produção do país estava próxima de 100%, já́ que a maioria das indústrias pertencia ao Estado. Elas operavam de acordo com um planejamento central, que, embora mais flexível e abrangendo um leque muito menor de mercadorias do que ocorria na União Soviética, incluía, de toda maneira, todos os setores industriais essenciais (carvão e outros minerais, aço, petróleo, água, luz, gás etc.), alguns deles até́ hoje mantidos predominantemente por EEs. Em 1998, a participação do Estado na produção industrial já́ havia caído pela metade, ficando em torno de 50%. Desde então, ela vem declinando ano a ano, de forma consistente, encontrando-se hoje pouco acima de 20%.
A situação na agricultura é mais clara ainda. Antes das reformas, a maior parte da produção era comandada pelas autoridades das comunas locais. A partir de 1978, com a introdução do sistema de responsabilidade, que permitiu o arrendamento privado de terras, quase a totalidade da produção passou a ser realizada de modo privado — embora obviamente os agricultores não sejam trabalhadores assalariados e sim, em sua maioria, autônomos, dentro daquilo que a terminologia marxista chama de produção simples de mercadoria. Esse sempre foi, historicamente, o modo típico de organização da agricultura chinesa, de modo que a estrutura atual de propriedade nas áreas rurais constitui de certa forma um retorno ao passado (com uma diferença significativa a ausência de latifundiários). Mas, à medida que prossegue o êxodo rural em direção as cidades, é provável também que mais relações capitalistas de produção se instalem na agricultura do país. Podemos mencionar também as empresas localizadas em pequenas cidades ou vilarejos (empresas de propriedade coletiva), que, embora menos importantes hoje do que no passado, cresceram rapidamente utilizando os ganhos obtidos com a mão de obra rural para produzir mercadorias não agrícolas. Elas usam trabalho assalariado, mas sua estrutura de propriedade, que combina, em proporções diversas, participação do Estado (ainda que apenas no nível local), cooperativas e propriedades puramente privadas, é bastante complexa e varia conforme a região do país.
As empresas privadas não só́ são muitas numericamente como também são de grandes dimensões. De acordo com dados oficiais, a participação de empresas privadas no 1% das maiores companhias por valor total agregado cresceu de cerca de 40% em 1998 para 65% em 2007 (Bai, Hsieh e Song, 2014).
Os modelos de propriedade na China são complexos, envolvendo com frequência, em proporções variadas, participação estatal —nos níveis central, provincial e comunal, privada e estrangeira. Mas o peso do Estado no PIB, calculado no que se refere à produção, dificilmente passa de 20%, enquanto a mão de obra empregada nas EEs e nas empresas de propriedade coletiva corresponde a 9% do total, incluindo campo e cidade (Anuário Estatístico sobre Trabalho na China 2017). Esses percentuais se assemelham aos registrados na Franca no começo dos anos 1980 (Milanović, 1989). Como veremos (...), uma das características do capitalismo político é, com efeito, que o Estado desempenha um papel significativo, para além do seu papel de mero representante, por meio da propriedade formal de capital. Mas o que pretendo aqui, neste momento, é apenas descartar certos questionamentos existentes quanto à natureza capitalista da economia chinesa —questionamentos feitos não em bases empíricas (já́ que os dados os contrariam nitidamente), mas apenas pelo fato, concreto, de que o partido dominante é chamado de comunista, como se isso, por si só́, bastasse para determinar a natureza de um sistema econômico.
A distribuição dos investimentos fixos entre os diversos tipos de propriedade também mostra uma tendência clara de crescimento do investimento privado. Este já́ é responsável por mais da metade dos investimentos fixos, enquanto a participação do Estado é de cerca de 30% (o restante provem do setor coletivo e do investimento privado estrangeiro).
Zonas rurais e urbanas
A mudança se reflete de modo gritante também na participação dos trabalhadores das EEs no conjunto dos empregos existentes nas cidades. Antes das reformas, quase 80% dos trabalhadores urbanos trabalhavam em EEs. Atualmente, depois de uma diminuição continua, ano a ano, essa participação está abaixo de 16%. Nas áreas rurais, a privatização de facto da terra por meio do sistema de responsabilidade transformou quase todos os trabalhadores rurais em agricultores do setor privado.
Por fim, o contraste entre os modos de produção socialista e capitalista aparece mais acentuadamente na descentralização das decisões relativas à produção e à precificação. No início das reformas, o Estado determinava os preços de 93% dos produtos agrícolas, 100% dos produtos industriais e 97% das mercadorias do varejo. Em meados dos anos 1990, as proporções se inverteram: 93% dos preços do varejo eram definidos pelo mercado, assim como 79% dos preços de produtos agrícolas e de 81% dos produtos industriais (Pei, 2006, p. 125). Hoje, o percentual de preços determinados pelo mercado é ainda mais alto.

Autor: Branko Milanovic (Belgrado, 1953) é um economista especialista em desigualdade, além de professor na City University. de Nova York e na London School of Economics. Este texto pertence ao livro ‘Capitalismo sem rivais’, lançado pela editora Todavia.

11 de julho de 2020

Jurisprudência!

Três coisas devem ser feitas por um juiz:
ouvir atentamente, considerar
sobriamente e decidir imparcialmente.
Sócrates

O Juíz João Otávio de Noronha do Supremo Tribunal de Justiça – STJ, ao longo do tempo negou idosos, pessoas doentes, a concessão de prisão domiciliar, entretanto, mudou seu modo de agir quando recebeu o pedido do advogado de Fabrício e Márcia Queiroz.
Além de não ter jurisprudência sequer para suas próprias decisões, chamou ainda mais a atenção do mundo jurídico o fato de que concedeu a esposa de Queiroz o benefício mesmo com ela ainda foragida da justiça.
Uma das justificativas do juiz é de que marido estava doente e precisava dos cuidados da esposa. Primeiro, ele ficou foragido longe da esposa por mais de um ano, logo, essa tese é inócua. Em segundo lugar não há previsão na lei sobre esposa cuidar do marido, ou vice-versa, argumento usado por João Otávio de Noronha para conceder o habeas corpus.
O Código do Processo Penal diz que o juiz pode substituir a prisão por domiciliar quando for “mulher com filho de até 12 anos” ou “homem, caso seja o único responsável pelos cuidados do filho de até 12 anos. Em decorrência dessa decisão estranha e completamente inaceitável, as consequências no meio jurídico começam a surgir no horizonte. Um pedido de habeas corpus coletivo foi impetrado, no Superior Tribunal de Justiça em favor de todas as pessoas que apresentam um risco maior de contrair coronavírus e estejam em prisão preventiva.
Ele cita a decisão do presidente da corte, João Otávio Noronha, que transferiu Fabrício Queiroz para a prisão domiciliar, demandando que o direito seja garantido a todos na mesma situação que o ex-assessor de Flávio Bolsonaro. A ação é assinada por 14 advogados do Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos (CADHU) e deve ser analisada pelo próprio Noronha por ser o responsável pelo plantão de férias do STJ.
Assim caminha a mediocridade na terra das nuances alheias ao bom senso, as próprias leis e a jurisprudência que deveria assim como, nos EUA, nortear as decisões de juízes diferentes em causas idênticas.

Autor: Rafael Moia Filho: Escritor, Blogger e Graduado em Gestão Pública.

Nosso sistema judiciário é uma afronta a sociedade!

A injustiça num lugar qualquer é
uma ameaça à justiça em todo o lugar.
Martin Luther King
A justiça atrasada não é justiça;
senão injustiça qualificada e manifesta.
Rui Barbosa

Nosso país tem problemas seculares, alguns dizem até que partes destes começaram com a chegada das caravelas portuguesas ao solo tupiniquim. Nosso poder executivo é servil a grupos empresariais, setores produtivos, porém, sempre está alheio aos anseios da sociedade. Possui milhares de funcionários que oneram e transformam a folha de pagamento do Estado brasileiro numa das maiores e mais ineficientes do planeta.
O legislativo não fica um centímetro atrás no quesito ineficiência e representação dúbia. Como tem a incumbência de legislar, o faz olhando para o próprio umbigo, suas leis sempre tem o viés da facilitação para seus pares, em detrimento da isonomia com que deveria agir e ditar o regramento para a sociedade.
Além do mais, tem uma relação quase que promiscua com o Executivo, aonde garimpa cargos atrás de poder e recursos que são normalmente usados para duas finalidades – Corrupção e Reeleição dos envolvidos e de seus apoiadores financeiros e políticos.
Porém, tudo poderia ser amenizado se tivéssemos um Poder Judiciário autônomo, independente e ágil em suas decisões, algo que estamos anos luz de presenciar.
Possuímos um Judiciário inchado de marajás, que recebem aquilo que os demais brasileiros não podem e não conseguem perante as próprias leis. Um exemplo são os penduricalhos como são chamados os adicionais que os desembargadores, juízes e outros recebem em seus holerites, porém, estão em desacordo com o chamado Teto Constitucional, o qual estão afetos os demais servidores do país.  
Além da sua ineficiência comprovada, da sua letargia conhecida por todos, este poder julga com dois pesos e duas medidas.
Recentemente tivemos um caso policial onde uma mulher furtou um frasco de Shampoo que não deve custar mais do R$ 30,00 (Trinta reais) num supermercado. Ela foi encaminhada a um presidio feminino e lá se encontra presa. Já Fabrício Queiroz que desviou milhões da ALERJ do gabinete de Flávio Bolsonaro, cometeu diversos atos ilícitos, estava foragido da Justiça há mais de um ano e recebeu da mesma Justiça a condição de prisão domiciliar.
Estes são dois casos apenas, na prática temos centenas no país, que configuram injustiça e acontecem porque o sistema diferencia pobres de ricos, cidadão comum de políticos e empresários famosos, deixando claro que possui dois andares distintos para efetuar seus julgamentos.
A sociedade fica no porão, os políticos e demais poderosos no andar de cima, com ar condicionado, café fresco, água mineral Perrier e muitas outras mordomias.

Autor: Rafael Moia Filho: Escritor, Blogger e Graduado em Gestão Pública.

8 de julho de 2020

Bolsonaro está doente da alma!

Sua soberba ficou, se isso é possível, mais evidente na maneira arrogante e provocadora com que anunciou que foi contaminado.
Bolsonaro após anunciar que seu exame deu positivo para covid-19, nesta terça-feira.
Mais do que doente de coronavírus, o que aflige o presidente Jair Bolsonaro é algo muito mais grave, é uma doença da alma, uma doença sem cura.
Do vírus ele poderá se curar ou morrer, como todo mundo. No entanto, o mal que nele é grave é sua soberba, sua teimosia em querer negar as evidências. Primeiro, enquanto se gabava de sua condição de atleta e exibia sua imunidade, levando os outros a acreditar que era uma simples gripe que a ciência e a medicina exageravam e que ele não tinha nada a ver com os mortos. E enquanto os cadáveres se amontoavam e cresciam as lágrimas daqueles que perdiam seus entes queridos, Bolsonaro continuava rindo e minimizando o risco de contágio.
Sua soberba ficou, se isso é possível, mais evidente na maneira arrogante e provocadora com que anunciou que sim, que foi contaminado. Ao dar a notícia, nunca fora visto rindo com tanto gosto. Parecia até feliz. E manifestou sua felicidade ao afirmar que, no fim das contas, o coronavírus era “uma chuva” que iria molhar todo mundo. E chegou a provocar a ciência e a medicina recomendando novamente o uso da cloroquina, cuja eficácia não só não foi comprovada, como seu uso poderia piorar o quadro dos pacientes com o vírus.
Exatamente no momento em que poderia ter demonstrado à nação com um gesto de humildade que havia se equivocado ao minimizar a doença que de alguma forma tinha se vingado dele, permaneceu fiel à sua teimosia e soberba ao afirmar que se está exagerando a força da pandemia. E voltou a repetir que mais importante que as mortes e mais urgente é que todos voltem ao trabalho para render culto ao deus da economia.
Enquanto ouvia o presidente falar, em minhas veias sentia pena, raiva e vergonha por este país que merecia nestes momentos de tragédia nacional, com 66.000 mortos, uma palavra de consolo e não de arrogância de quem detém a mais alta autoridade do Estado.
Bolsonaro alardeia ser católico, evangélico e se importar mais com a Bíblia do que com a Constituição. Deveria saber que nesses textos fica evidente que todos os pecados podem ser perdoados, menos o da soberba que pressupõe que a pessoa se coloca acima de Deus. O vírus de Bolsonaro é de um gênero diferente dos milhões já contagiados. O seu é diabólico.

Autor: Juan Arias – El País.

6 de julho de 2020

Cancelamento do diálogo põe democracia em risco!

A cultura do cancelamento caminha de mãos dadas com o discurso de ódio e a desinformação quando se nega a aceitar a diversidade de trajetórias e de ideias.
Unsplash - Facebook
Nos idos de 2010, a revista Time escolheu Mark Zuckerberg como a pessoa do ano ao transformar “o mundo solitário e antissocial da aleatoriedade em um mundo amigável, um mundo serendipitoso”. Em 2020, Zuckerberg está tendo que lidar com aquela que provavelmente é a pior crise de imagem de sua empresa: o Facebook e outras plataformas estão sendo confrontados pela sociedade sobre a toxicidade que impera em diversas bolhas por trás de curtidas e compartilhamentos.
Além de promover o encontro de pessoas com afinidades, as redes sociais deram voz aos que eram excluídos de uma estrutura tradicional de comunicação, feita de um para muitos. Se antes só poucos veículos conseguiam circular informação para as massas, agora indivíduos têm o potencial de viralizar conteúdo com um único post. Infelizmente, o aumento do número de vozes não veio acompanhado nem da qualidade da informação e nem da qualidade da escuta. Entre gritos, ataques e grunhidos, diversas camadas das redes foram contaminadas por uma surdez generalizada.
Dez anos depois da capa da Time, Zuckerberg enfrenta um boicote histórico. Grandes empresas, entre elas anunciantes como Unilever e Coca-Cola, estão apoiando o Stop Hate for Profit (pare de lucrar com o ódio, em tradução livre). A iniciativa, liderada por organizações da sociedade civil americana, pede que empresas deixem de anunciar no Facebook durante o mês de julho. O objetivo é pressionar a plataforma para reduzir a circulação e o engajamento dos discursos de ódio. Zuckerberg anunciou que vai apertar a fiscalização de postagens prejudiciais aos direitos civis.
Um relatório da Anti Defamation League revela que a exposição a conteúdo tóxico nas redes sociais atingiu níveis sem precedentes. Segundo a organização, o aumento da dependência digital provocada pela pandemia criará novas oportunidades de exploração para quem quer prejudicar outras pessoas usando serviços e ferramentas digitais. De janeiro a abril deste ano o Facebook removeu 9,6 milhões de comentários que continham discursos de ódio da plataforma.
No Brasil, a capacidade de diálogo também tem se deteriorado nos últimos anos. Em 2019, um levantamento da Ipsos em 27 países apontou que os entrevistados no país estavam menos propensos a aceitar as diferenças. Segundo o instituto, 32% dos brasileiros acreditam que não vale a pena nem tentar conversar com pessoas que tenham visões políticas diferentes das suas.
Precursor da Comunicação Não-Violenta no Brasil e integrante do Redes Cordiais, Dominic Barter alerta para o risco de quando a briga supera a escuta: “A ausência de diálogo é fatal. Quando alguém afirma que passou o tempo de diálogo, essa pessoa está afirmando que começou o tempo de guerra”.
Mas diálogo não é uma simples conversa, um bate-papo. É caminhar na direção mútua rumo a um destino desconhecido. “Porque, se o destino é algo que descobrimos juntos, então é implícito que ninguém manda no outro”, ensina Barter.
Seria, portanto, o contrário da cultura do cancelamento, que prega a “morte virtual” e a interrupção do apoio a um artista, um político, uma empresa ou marca devido à demonstração de algum tipo de postura considerada inaceitável — algo que, de certa maneira, está ocorrendo com o Facebook.
O problema é que o cancelamento caminha de mãos dadas com o discurso de ódio e a desinformação quando se nega a aceitar a diversidade de trajetórias e de ideias, e se apoia em uma tática de exclusão e julgamento, o que pode trazer consequências assombrosas, com relações cada vez mais tóxicas, que se retroalimentam da disputa.
As redes sociais não foram desenhadas para o silêncio. Nasceram para interação e engajamento. O algoritmo favorece o movimento e entende como algo positivo tanto os likes quanto os dislikes. A cultura do cancelamento aproveita essa arquitetura das redes, mas vai contra o propósito para o qual foram pensadas —uma nova esfera pública, bem diferente da redução do diálogo ou do radicalismo do cancelamento, que não tolera o processo de desconstrução e de aprendizado.
“Quando as pessoas falam cara a cara, elas seguem normas de educação e civilidade. A comunicação on-line não apenas facilita o discurso que fere os direitos civis, mas dá audiência para essas narrativas,” destaca a pesquisa “Convivendo com o Não: Polarização Política e Diálogos Transformativos”, da Universidade de Missouri (EUA), que analisa a efetividade de métodos de diálogo para abordar os desafios da polarização.
“O diálogo em uma democracia não substitui o processo político, nem deveria ser., no entanto, pode apoiar e fortalecer o processo político para que se torne mais construtivo diante de divisões e conflitos, mesmo quando esses conflitos parecem intratáveis,” defendem os autores da pesquisa.
A necessidade de fortalecimento da democracia passa por reaprendermos a dialogar e a levar isso para as redes. Parece contra intuitivo, mas o grito é um ato de generosidade para compensar a surdez do outro. Não adianta se falar de frente ampla se não pudermos voltar a conversar no almoço de domingo com a família ou falar livremente e sem briga sobre política no grupo de WhatsApp dos amigos. E o diálogo tem que ser retomado de baixo para cima. Escuta de qualidade é algo que se precisa treinar. E o maior presente que você pode dar a uma pessoa é ouvi-la de verdade. A democracia agradece.

Autores: Alana Rizzo e Clara Becker são jornalistas e cofundadoras do Redes Cordiais, projeto de combate à desinformação e aos discursos de ódio em redes sociais.