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29 de outubro de 2019

O Brasil à beira do precipício!

Bolsonaro representa uma parte expressiva das elites políticas brasileiras, formadas no terreno fértil do racismo, misoginia, aporofobia e servidão às nações imperiais.
Há um ano, em 28 de outubro de 2018, era eleito o atual presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, em segundo turno, derrotando o candidato de esquerda, Fernando Haddad, do Partido dos Trabalhadores (PT). Com 55% dos votos, a extrema-direita voltava a governar, mais de três décadas após o fim da ditadura dos generais, estabelecida em 1964.
O deslocamento político foi notável. Desde o fracasso de Fernando Collor, primeiro presidente eleito diretamente depois do golpe militar, o bloco conservador tivera como núcleo duro uma coalizão entre o Partido da Socialdemocracia Brasileira (PSDB) e o antigo Partido da Frente Liberal (PFL), atualmente denominado Democratas (DEM), nascido de uma costela do partido da ditadura.
Fragmentada e desmoralizada, a direita tradicional teve que se vincular a uma agremiação oriunda do campo democrático, embora profundamente abraçada às ideias neoliberais. Essa coligação governou o Brasil entre 1992 e 2003, consolidando seu domínio a partir de 1994, quando Fernando Henrique Cardoso, principal líder do PSDB, conquistou a Presidência da República.
A força propulsora dessa coalizão, porém, esgotou-se na virada do século. Os efeitos de médio e longo prazos do neoliberalismo recessão endêmica, desemprego estrutural, desidratação dos serviços públicos, aguçamento da desigualdade social, crescimento da pobreza e da miséria empurraram o pêndulo da história em favor do PT de Luiz Inácio Lula da Silva, que ganharia as eleições presidenciais de 2002.
Durante os treze anos de governos petistas, somando os mandatos de Lula (2003-2010) e Dilma Rousseff (2011-2016), o país começou a experimentar outra política econômica, alicerçada sobre programas distributivos e investimentos públicos favoráveis a mercado interno de massas, com expressiva elevação dos salários, sob reforçada regulação do Estado.
A burguesia brasileira, forjada por acintoso padrão de exploração do trabalho, suportou esse modelo em sua fase expansiva, até que os efeitos da crise mundial de 2008 travassem a economia brasileira. A alta dos salários, com a queda da taxa de lucro, até então era compensada pela expansão do consumo doméstico e o dinamismo das exportações de commodities, além de ganhos financeiros patrocinados por uma ortodoxa política monetária.
Desde 2010, no entanto, o empresariado foi paulatinamente considerando insuportável o petismo, incluindo aqueles setores que se beneficiaram de soluções decididas por Dilma Rousseff para conter a retração produtiva e a radicalização do choque distributivo. Os investimentos privados foram despencando, apesar da ampliação de subsídios estatais, embolsados como recuperação de margem, com forte custo fiscal. A queda da taxa de juros, entre 2012 e 2013, ao contrário de servir como estímulo, foi percebida como erosão de receita financeira.
Reeleita em 2014, a presidente viu-se cercada por uma escalada que já pedia sua cabeça. Sem maioria parlamentar, absorveu parte do programa neoliberal dos opositores, tentando deter ou abrandar seus ataques. Tudo deu errado: os inimigos a sentiram vulnerável, redobrando os esforços de guerra, enquanto passou a reinar confusão, divisão e desânimo nas bases progressistas.
Os resultados na economia também foram trágicos. Frente a relevantes sinais de desaquecimento desde 2013, medidas como a abrupta elevação da taxa de juros e o corte de benefícios sociais, adotadas no final de 2014, significaram apagar incêndio com jatos de gasolina. O país entrou em recessão, o desemprego disparou, as camadas médias consolidaram seu giro conservador e parte das classes trabalhadoras abandonou o PT. O desfecho seria o golpe parlamentar de 2016, com a derrubada de Dilma Rousseff.
Estava em curso uma ofensiva reacionária, perante a qual o petismo se viu aturdido e indefeso. Não pairavam ameaças frontais ao capitalismo e ao seu poder político, mas as classes dominantes queriam derrubar qualquer obstáculo, pelos meios que fossem necessários, para a adoção de um programa que revitalizasse prontamente a rentabilidade relativa e absoluta de seus negócios. A agenda deixava ser a versão moderada dos anos 90, para assumir a feição de um neoliberalismo sem peias, cujo modelo confesso referencia-se no Chile de Pinochet.
Não há compatibilidade possível entre esse caminho e a ordem democrática. A derrubada de uma presidente legítima se associa à Operação Lava Jato, desmascarada pelas mensagens publicadas por The Intercept, como elementos de um golpe de tipo novo, por dentro das instituições, com um papel destacado do sistema de justiça e do parlamento. A prisão do ex-presidente Lula, através de uma fraude judicial, foi o corolário indispensável para garantir o controle do processo eleitoral de 2018.
Os velhos partidos conservadores, à frente o PSDB e o DEM, lideraram o movimento golpista com a missão de dar vida às reformas exigidas. Naufragaram, contudo, nas eleições presidenciais. Representavam o regime político que ajudaram a enterrar, contra o qual havia se jogado a Operação Lava Jato para destruir o PT e Lula, e foram abandonados pelos setores sociais cativados pelo discurso de ruptura do sistema como a única saída para a prosperidade capitalista.
O principal filho e herdeiro dessa contrarrevolução preventiva é Jair Bolsonaro. Medíocre e aloprado, representa o rosto sem maquiagem de parte expressiva das elites brasileiras, formadas no caldo do racismo, da misoginia, do ódio aos pobres e da subserviência às nações imperiais. Como outras vezes na história, diante de crise geral das instituições, a extrema-direita emerge como solução bonapartista, abraçada à exploração dos preconceitos e das crenças mais atrasadas para constituir base de massa à uma variável neofascista.
Diante da incapacidade do conservadorismo tradicional em derrotar estrategicamente as forças de esquerda e os movimentos populares, criando as condições políticas para viabilizar o programa neoliberal, Bolsonaro irrompeu como hipótese plausível, mesmo exibindo contornos indefinidos, de mudança do regime político, atraindo novamente as Forças Armadas para o comando do Estado.
As dificuldades do governo em consolidar essa opção, em meio a uma grave crise econômica e social, são ingredientes de um cenário marcado pelo que Antonio Gramsci chamava de “equilíbrio catastrófico”, caracterizado pela incapacidade de qualquer das forças políticas ou classes sociais estabelecer sua hegemonia sobre as demais. Esse ambiente, longe de afastar a hipótese autoritária, costuma ser o terreno no qual dão frutos soluções de tipo bonapartista.
As frações do bloco conservador que divergem dessa alternativa, a ela estão acorrentadas, mesmo que provisoriamente e a contragosto, porque partilham o mesmo projeto nacional, a mesma política econômica e a mesma lógica golpista. Sua oposição é restrita e débil, limitada às manobras mais extravagantes do presidente, em uma luta permanente para domesticá-lo, e seu limite é especular acerca de um bolsonarismo sem Bolsonaro.
A saída democrática depende da derrota do programa neoliberal, que está dilacerando países da região. O Brasil somente poderá sair da beira do precipício quando as correntes de esquerda forem capazes, associadas a um movimento de desobediência civil como o que está sacudindo o Chile, de apresentar uma alternativa de governo que construa um novo regime constitucional, soldado pela distribuição de renda, riqueza e poder.

Autor: Breno Altman é jornalista e diretor editorial do site Opera Mundi. Artigo publicado no El País.

24 de outubro de 2019

Recitando Darío…

A extraordinária liberdade e audácia com que o escritor nicaraguense criou sua própria tradição libertou a poesia em língua espanhola do regionalismo e a devolveu ao universalismo dos clássicos.
Em minhas caminhadas matutinas, neste outono madrilenho que parece não se despedir nunca do verão, a memória me devolve de repente longos poemas de Rubén Darío que aprendi há mais de sessenta anos. Onde estiveram escondidos todo esse tempo? No inconsciente, segundo a descoberta (ou a invenção) genial de Sigmund Freud. Naquela longínqua adolescência, li muito o inventor da psicanálise, atiçado pelo doutor Guerra, nosso professor de Psicologia na San Marcos, que ilustrava as teorias freudianas com os romances de Dostoiévski e tinha uma voz tão fraquinha que mal o ouvíamos, uma voz que parecia o trinado de uma avezinha. 
Só voltei a ler Freud nos anos sessenta, quando, em Londres, a amizade com Max Hernández, que estava fazendo sua análise profissional no Instituto Tavistock, me ressuscitou a curiosidade por seus livros. Eram fecundos aqueles sábados londrinos que combinavam psicanálise, os sebos e a revolução ácrata, porque Max e eu nos reuníamos todas as semanas com alguns anarquistas britânicos, saídos não sei de onde e desencantados com o Ocidente, que sonhavam que a Ideia de Bakunin e Kropotkin, morta na Europa, ressuscitasse em algum momento lá longe, entre o Amazonas e o Orinoco...
Descobri Darío em um seminário dado por Luis Alberto Sánchez para os alunos dos cursos de doutorado da Faculdade de Letras, quando voltou do exílio para o Peru, por volta do final da ditadura do general Odría, em 1955 ou 1956. Era um magnífico professor. Não tão rigoroso como Porras Barrenechea, que em suas aulas de Fontes Históricas revelava sempre os dados de uma pesquisa pessoal, mas agradável, estimulante, cheio de histórias, mexericos e comentários da atualidade que transformavam seu seminário em uma coisa viva, em uma áscua intelectual. Saíamos de suas aulas correndo para a velha biblioteca com teias de aranhas da San Marcos para ler os livros que havia explicado. Darío foi o poeta de quem mais versos memorizei naqueles anos de leituras frenéticas. O poema que mais admiro dele, Responso a Verlaine, tive de ler com um dicionário à mão para saber o que queriam dizer “sistro”, “propileo”, “canéforas”, “náyade”, “acanto”, misterioso palavreado que soava tão bonito.
Recordo uma discussão apocalíptica, em Paris, com o poeta chileno Enrique Lihn, que havia publicado na revista Casa das Américas um poema esplêndido e ferozmente injusto, debochando das princesas e dos cisnes de Rubén Darío e propondo que, armados de trinchantes e facas, comêssemos de uma vez por todas o cordeiro pascal...
Como Lihn, muitos poetas da época se incomodavam com o cenário modernista dos poemas darianos, aquelas indescritíveis miscelâneas da Grécia clássica com a França oitocentista, seus vasos de cristal, seus violoncelos, as donzelas de decotes grandes e pés curtos, suas “mãos de marquês”. Queriam que a poesia fosse menos decorativa e suntuosa, que expressasse mais intimamente a existência e não se dispersasse e ficasse frívola dessa maneira na adoração do francês. Equivocavam-se ao julgar assim Darío, que também podia ser íntimo, profundo e pessoal, como em El Fatal ou naquele tenebroso chamado dos últimos tempos, o de Francisca Sánchez, Acompáñame.
Esta cheguei a conhecer, levado a sua casinha de Las Ventas por meu professor Antonio Oliver Belmás, da Complutense; era uma velhinha imortal, miúda, simples, de lenço na cabeça, que jamais se permitia confianças com o grande morto, a quem chamava sempre de "don Rubén". Quando Darío partiu para a louca aventura estadunidense da qual não regressaria, ela retornou a seu povoadinho castelhano, com todo o arquivo de don Rubén, que depois legaria à Espanha.
Eu lhe perguntei como Darío se dava com José Santos Chocano. “Don Darío tinha muito medo dele”, me respondeu. “Dizia: um dia é capaz de entrar na casa e me maltratar.” E, com efeito, a correspondência entre ambos está cheia de cartas em que o peruano exigia com intimidação ao nicaraguense artigos elogiosos sobre os livros que lhe dedicava.
Na verdade, o que Darío fez foi romper o provincianismo que asfixiava a poesia de nossa língua, que, desde os grandes tempos clássicos com Quevedo e Góngora, se havia apequenado e recuado aos afetos locais, e sair para enfrentar o mundo inteiro para se apropriar dele, precisamente com aquelas mesclas e combinações que só um homem da periferia poderia ter feito, ou seja, alguém que, ao contrário de um poeta francês ou britânico ou alemão, não escrevia condicionado pelo peso de uma tradição.
A extraordinária liberdade e audácia com que Darío criou sua própria tradição, nessas alianças inescrupulosas em que os deuses gregos dançam o minueto com as coquetes indiscretas dos salões do Rei Sol, liberou a poesia em língua espanhola do regionalismo e a devolveu ao universalismo dos clássicos.
Graças a ele foram possíveis, de uma parte, os abalos telúricos e épicos do Neruda do Canto Geral, a muito íntima poesia de Vallejo, e, no outro extremo, o internacionalismo de um Borges. Este último reconheceu, de maneira irrefutável: “Sua labuta não cessou e não cessará”, escreveu; “aqueles que alguma vez o combatemos, compreendemos hoje que o continuamos”. Por isso, Sergio Ramírez deu como título El Libertador ao excelente ensaio que lhe dedicou.
Deslumbrado por Darío, decidi fazer minha tese de graduação sobre seus contos. Meus dois orientadores, Luis Alberto Sánchez e Augusto Tamayo Vargas, me faziam de vez em quando revisar as declarações e me exigiam precisões bibliográficas.
Mas seria muito pior mais tarde, em Madri, onde o orientador de minha tese de doutorado sobre García Márquez, o professor Alonso Zamora Vicente, passou anos me exigindo novas correções e detalhes, em inacabáveis passeios deliciosos pela Madri dos Áustrias. Na época eram importantes as teses universitárias. Agora, não é raro que as plagiem, e que os plagiários, em vez de vergonha e reprimendas, recebam desagravos e felicitações.
Em todo o meu percurso, esta manhã, recitei em voz baixa “Era un aire suave...”, o poema inicial de Cantos de Vida y Esperanza , que começa com aquele verso deslumbrante “Yo soy aquel que ayer nomás decía” e, pelo menos três vezes, o “Responso a Verlaine”. Se reduzo um pouco o passo, conseguirei recitá-lo uma quarta, talvez.
Luis Alberto Sánchez contava naquele seminário que havia comprado por um punhado de francos, em um bouquiniste de Paris, o exemplar de Prosas Profanas dedicado de próprio punho por Rubén Darío a Remy de Gourmont, a quem tanto admirava. E que o livro ainda não estava desglosado. De modo que o polígrafo francês, tão célebre então e agora mergulhado no esquecimento, nem sequer se havia inteirado da homenagem que lhe prestava, do outro lado do mundo, aquele desconhecido nicaraguense com aquele livro, mais importante que todos os seus reunidos.
Não acho que, um século e meio depois, Remy de Gourmont tenha muitos leitores agora, nem sequer que seus livros sejam encontrados nas livrarias francesas. O seu distante admirador, por sua vez, continua sendo admirado e estudado em ambos os lados do oceano e, tenho certeza, ganha todo o dia leitores tão apaixonados por seus versos como eu no vasto mundo da língua espanhola. E me parece que escuto, ali onde quer que se encontre, o fantasma de Darío, que, como a travessa Eulalia, ri, ri, ri,...

Autor: Mario Vargas Llosa – El País - Direitos mundiais de imprensa em todas as línguas reservados a Edições EL PAÍS, SL, 2019. © Mario Vargas Llosa, 2019.

18 de outubro de 2019

Agrotóxico na água não é novidade, mas há outros compostos que também preocupam!

Recentemente, uma matéria jornalística repercutiu importantes informações sobre problemas na qualidade da água bruta envolvendo agrotóxicos, também preocupada com a grande liberação de novos agrotóxicos no Brasil em curso em 2019 e a eventual potencialização da degradação da qualidade de nossos mananciais com estes novos compostos lançados nos cursos de água (1).
Foto: Portal Tratamento da Àgua
Foto: Portal TratamentoFoto: Portal Tratamento da Água
Há de fato inúmeros problemas relacionados à qualidade da água bruta no Brasil para o consumo humano e, como apontado na matéria, o agrotóxico é um dos compostos responsáveis pelo aumento da degradação de sua qualidade. Mas há também preocupações com nitrogênio e fósforo (2), cianotoxinas (3), metais (4), drogas ilícitas, como cocaína, ou mesmo com remédios diversos e hormônios (5), e mais recentemente com nanopartículas (6) e plásticos (7). Para nitrogênio, fósforo, cianotoxinas e metais o tema há mais tempo é debatido e também mais estabelecido.
Para minimizar o impacto desses compostos na qualidade da água bruta e na saúde pública há soluções. Primeiro, controlar os usos dos espaços, pois não se deve permitir qualquer uso em qualquer micro bacia, já que o descontrole no uso potencializa o comprometimento na qualidade da água. Em conjunto, deveria ser realizado o monitoramento da qualidade da água bruta, com ampliação do número de compostos que hoje se estuda e tem avaliado sua concentração.
Complementam os estudos testes de toxicidade com organismos, a serem realizados no laboratório, bem como em campo, no próprio manancial, o que de fato comprovará a toxicidade potencial desses compostos em situação de campo. Neste caso, é necessário alterar a legislação vigente para ampliar a lista dos compostos que hoje são monitorados e dos testes de toxicidade com organismos que também são realizados, já que muitos dos compostos listados acima, apesar de sua toxicidade potencial conhecida, não são contemplados no monitoramento oficial.
Concomitantemente, baseado em estudos de campo, é também fundamental proteger e conservar o manancial considerado em bom estado e manejar e recuperar aquele manancial que hoje se apresenta em pior qualidade (8). Meios para se fazer isso existem. Deve-se também coletar e tratar o esgoto de modo adequado, conforme a carga e qualidade do esgoto gerado, para que este atinja nível de qualidade de lançamento que minimamente comprometa o manancial.
Isto implica na ampliação do que hoje se pratica de modo rotineiro nas estações de tratamento de esgoto (ETEs), com aplicações de técnicas mais sofisticadas, como as terciárias e quaternárias, mas normalmente mais custosas. Mas a quantidade de ETEs também deve ser ampliada em número para se atingir a universalidade no tratamento de esgoto no Brasil, hoje muitíssimo aquém do adequado (9).
Esse conjunto de ações (disciplinar, monitorar, manejar, tratar e universalizar) se bem planejados e executados, sem dúvida contribuirão para minimizar e reverter a degradação da qualidade de nossas águas, com sustentabilidade, além de reduzir riscos de contaminações e de doenças. Há histórico de sucesso no Brasil (10).
No entanto, caso a gestão dos recursos hídricos siga como hoje, no futuro não haverá o que comemorar e esperar melhora na qualidade da água e do sedimento de nossos mananciais. Pelo contrário, seguiremos jogando e contaminando nossos rios e reservatórios com agrotóxicos, remédios, drogas, metais e outros novos compostos produzidos pelo homem, contribuindo para o aumento da degradação do meio ambiente como um todo.
Cabe ao poder público as ações para na prática cuidar do manancial, da água bruta, e de instalar ETEs, bem como realizar todas as análises e testes necessários, atestando a qualidade da água bruta para o uso humano, quando comparada com padrões internacionalmente aceitos.
Mas também cabe a todos fiscalizar e cobrar ações da prefeitura e do estado, visando garantir os interesses e a saúde da população. Vale reforçar que a presença desses compostos nas águas brutas abre a possibilidade real de suas presenças nas águas entregues em nossas torneiras, como já detectados (11), o que deve ser evitado a todo custo, decorrente das incertezas de seus efeitos na saúde humana no longo prazo, mesmo em baixíssimas concentrações.
Referências:
    2-   Compartimentalização e qualidade da água: o caso da Represa Billings
http://periodicos.puc-campinas.edu.br/seer/index.php/bioikos/article/viewFile/2522/1864 
    3-   Cianobactérias/cianotoxinas: Procedimentos de coleta, preservação e análise
https://portalarquivos2.saude.gov.br/images/pdf/2015/janeiro/19/cianobacterias-cianotoxinas-2...pdf 
    4-   Avaliação da composição química de águas do Sistema Guarapiranga: estudo de caso nos anos de 2002 e 2003
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-40422007000500018&lng=en Impact of copper sulfate application at an urban Brazilian reservoir: A geostatistical and ecotoxicological approach
https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0048969717317990 Biodisponibilidade de metais no sedimento de um reservatório tropical urbano (reservatório Guarapiranga – São Paulo (SP), Brasil): há toxicidade potencial e heterogeneidade espacial?
https://geobrasiliensis.emnuvens.com.br/geobrasiliensis/article/view/364 
    5-   Ecological and toxicological responses in a multistressor scenario: Are monitoring programs showing the stressors or just showing stress? A case study in Brazil
https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0048969715301431 Occurrence of cocaine and benzoylecgonine in drinking and source water in the São Paulo State region, Brazil
https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S004896971632263X Anthropogenic contaminants of high concern: Existence in water resources and their adverse effects
https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0048969719331651 
    6-   Nanoparticles: Environmental problems or problem solvers?
https://academic.oup.com/bioscience/article/68/4/241/4915956 
    7-   Microplastic pollution revealed ‘absolutely everywhere’ by new research
https://www.theguardian.com/environment/2019/mar/07/microplastic-pollution-revealed-absolutely-everywhere-by-new-research Water Pollution: Everything you need to know
https://www.nrdc.org/stories/water-pollution-everything-you-need-know The effect of dams on river transport of microplastic pollution
https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0048969719305078 
    8-   Monitoramento e manejo de macrófitas aquáticas em reservatórios tropicais brasileiros
http://ecologia.ib.usp.br/portal/macrofitas/ 
    9-   Atlas Esgotos: Despoluição das bacias hidrográficas
http://atlasesgotos.ana.gov.br/ 
    10-   Efeitos de diferentes intervenções no processo de eutrofização do lago Paranoá (Brasília – DF)
https://dialnet.unirioja.es/descarga/articulo/2882932.pdf 
    11-   Contaminantes químicos em águas destinadas ao consumo humano no Brasil
https://pdfs.semanticscholar.org/7b13/6b382c8657fd24f266502c2d2d782d701205.pdf Metais pesados, hormônios e agrotóxicos estão na água que chega às torneiras
https://www.redebrasilatual.com.br/saude-e-ciencia/2018/03/esgoto-hormonios-metais-pesados-e-agrotoxicos-estao-em-amostras-de-agua-que-chega-as-torneiras/ Contaminantes emergentes podem ser uma ameaça na água para consumo humano
https://www.embrapa.br/busca-de-noticias/-/noticia/32796742/contaminantes-emergentes-podem-ser-uma-ameaca-na-agua-para-consumo-humano 

Autor: Marcelo Pompêo é professor do Departamento de Ecologia do Instituto de Biociências da USP.

16 de outubro de 2019

Querem nos roubar o melhor do Brasil!

Hoje existe um Brasil na superfície, envenenado por políticas alheias à sua vocação de diálogo e de encontro que despertaram o pior que existe até nas profundezas das almas mais nobres.

Uma família carioca aproveitando um piscinão no Rio de Janeiro. 


NACHO DOCE (REUTERS)
Os brasileiros estão vivendo um momento paradoxal. Somos nós, os que vieram de fora, que mais os apreciamos e amamos, e por isso somos os que mais nos surpreendemos, nestes momentos, ao ver que estão com medo de amar e de se amar entre si, porque o ódio substituiu o amor. E da glória ao inferno sempre há apenas um passo.
Fiquei comovido com uma reportagem gráfica publicada pela Folha de S. Paulo sobre o que alguns imigrantes pensam do Brasil. Talvez porque confirma minha teimosia de que os brasileiros estão sendo envenenados e convencidos a serem piores do que realmente são ou do que imaginam ser e que o melhor é fugir deste país que está sendo envenenado pela política de extrema-direita e pela guerra à cultura.
Nessa reportagem, os não brasileiros que chegaram até aqui não entendem por que de repente os brasileiros se sentem mal com eles mesmos, têm vergonha de ser o que são e até são agora eles que preferem emigrar. E, ao mesmo tempo, os imigrantes lembram sua felicidade quando chegaram aqui e tiveram seus primeiros encontros com os brasileiros. O africano Absoulaye lembra: “Aqui eu tive aulas de forró, de sertanejo e de samba. A cultura muçulmana não aceita a dança. Aqui eu realizei esse sonho”. Emocionante a confissão de Nbuduzu, da África do Sul: “Aprendi a falar português e a cantar na prisão. Lá consegui libertar minha música e meu canto”. E a portuguesa Maria Luisa confessa que chegam a perguntar-lhe: “Mas o que você está fazendo aqui?”. E comenta triste: “Achei que o Brasil gostasse mais de si mesmo”.
O Brasil, onde mesmo no inferno das prisões alguém se sente com espaços de liberdade para cultivar sua arte, reflete melhor o Brasil feliz como nós sempre vimos este país, apesar dos pecados daqueles que se aproveitaram da vocação para a felicidade de sua gente para tê-la subjugada, perpetuando o inferno que deixou a herança da mais longa escravidão que se conhece na história.
Hoje existe um Brasil na superfície, envenenado por políticas alheias à sua vocação de diálogo e de encontro que despertaram com a exaltação da violência e seu amor às armas o pior que existe até nas profundezas das almas mais nobres, arrastando-o a um crescimento alarmante da depressão. E existe o Brasil verdadeiro, do qual meu colega e escritor espanhol, Antonio Jiménez Barca, ao deixar a direção da edição brasileira do EL PAÍS para voltar à sede principal em Madri, à minha pergunta sobre o que o Brasil lhe deixava como lembrança, me respondeu: “O Brasil me ensinou a ser feliz”.
Como dizia Freud, o ser humano precisa se proteger de seus instintos de violência e procurar dominar os outros, ao mesmo tempo em que vai sempre em busca de sua realização e felicidade. Segundo o criador da psicanálise, são o impulso de morte, o tânatos, e o instinto de vida, o eros, que movem o mundo, que se ainda existe é porque o instinto de vida é mais forte que o de morte. Também no Brasil, por conjunturas da natureza, talvez melhor do que em outras partes do mundo, o impulso de vida que implica o do encontro, da autoestima, do diálogo pacífico, da liberdade de expressar os sentimentos, o de compartilhar em paz o pouco ou o muito que a vida lhe deu, é maior do que seu impulso de morte.
A resistência que estão vivendo os brasileiros que não se conformam com esse clima negro de violência, de castração do encontro amigável e da falta de pensar como se deseja, é a de poder, uma vez vencida a batalha contra o derrotismo estéril que começa a asfixiá-lo, o Brasil luminoso, com espaços para que todos possam expressar livremente seu modo de ser feliz. Que volte a ser o Brasil que trazem nos olhos os imigrantes que chegam aqui na espera de uma praia de liberdade para melhor expressar toda a sua criatividade, em vez do campo de batalha no qual o estão convertendo.
O Brasil, sua terra privilegiada e sua gente enriquecida com a rica pluralidade de suas culturas, tem de voltar a ser o país que, segundo uma feliz expressão, Deus havia escolhido para viver. Sim, o Deus de todos, especialmente o dos que mais nos esquecemos sempre, o Deus da paz e do encontro e não o Deus dos mais privilegiados, cuja política de exclusão também está querendo para o Brasil.
O Deus encarnado profeticamente nos olhos doces com a pobreza e a fragilidade e severos com a injustiça, de santa Irmã Dulce. Talvez não seja a primeira santa nascida no Brasil, ao qual imigrantes de meio mundo, em busca de paz e de belezas naturais que querem roubar-lhe a ganância de um capitalismo sem alma, ainda sonham para viver e morrer. A primeira santa brasileira também gostava de cantar e dançar.
Estão tentando despojar o Brasil do melhor de sua história e de sua alma plural e festiva. Um pecado sem perdão.

Autor: Juan Arias – El País

13 de outubro de 2019

Reforma Tributária é mais um sonho perdido!

O Produto Interno Bruto – PIB... mede tudo...
exceto aquilo que faz a vida valer a pena.
Robert F. Kennedy

Há muitos anos ouvimos e lemos no Brasil a necessidade de reformas estruturais. Foram muitos os discursos a favor destas reformas, que incluíam a Reforma Trabalhista, Previdenciária, Tributária e a Política.
Nunca ninguém se preocupou com o fato de que estas reformas estruturais seriam elaboradas e/ou aprovadas pelo Congresso Nacional, não importando quem seria o presidente da república. Isso implica dizer que uma reforma já foi aprovada (Trabalhista) e a outra está praticamente aprovada e os resultados ainda são muito aquém das promessas.
A Trabalhista foi aprovada a toque de caixa no governo espúrio de Michel Temer, um homem com sete processos de corrupção às costas e que se dizia um reformista. Não se poderia esperar algo moderno, reformador e que trouxesse a CLT e o trabalho para respirar os ares do Século XXI.
Muito ao contrário, a reforma é tão pífia e descaradamente favorável aos setores empresariais que mantém diversas coisas inaceitáveis para o nosso tempo. Não atualiza e regulariza novas profissões surgidas nos últimos quarenta anos no país. É tão mal escrita que no seu bojo o Estado do Acre é descrito como Território. O Acre é Estado desde 1962, tempo suficiente para que quem escreveu, relatou e aprovou o texto devesse perceber... 
A Reforma da Previdência segue o mesmo rito, foi aprovada na Câmara e está em fase final de aprovação no Senado, em ambas as casas o governo tem maioria e, portanto, não teve nem terá dificuldade alguma em aprova-la.
Trata-se de uma reforma que penaliza os que um dia gostariam de se aposentar, massacra os mais pobres, as pensionistas e não altera nada em relação aos devedores de quase um trilhão de reais ao sistema previdenciário nacional. Não altera forma de custeio, nem define claramente a questão das desigualdades entre o setor privado e o público. Mantém do mesmo jeito a situação caótica da Previdência nos Estados e nos munícipios, com rombos estratosféricos. Os militares são um capítulo à parte dentro da confusa nova sistemática que não define com clareza e transparência como ficarão as aposentadorias e pensões desta classe.
O que imaginar da futura Reforma Tributária e Fiscal? Pelo andar da carruagem e pelas proposições que escapam na mídia, a classe média terá ainda mais problemas pela frente quando esta for aprovada. Fala-se em acabar com os abatimentos de Saúde e Educação no acerto anual com o I.R., querem criar novos impostos, enfim, o sonho de uma carga tributária menor e mais enxuta não passa de uma utopia.
A Câmara e o Senado não se entendem sobre alguns pontos importantes no começo da discussão sobre a reforma fiscal e tributária. Entenda as diferenças entre as propostas de reforma tributária das duas Casas:
UNIFICAÇÃO
Senado - IPI, PIS, Cofins, IOF, CSLL, Cide, Salário Educação (federais); ICMS (estadual); ISS (municipal).
Câmara - IPI, PIS, Cofins (federais), ICMS (estadual), ISS (municipal).
ALÍQUOTAS
Senado - Definidas por cada Estado e município.
Câmara - Definição pelo Comitê Gestor do IBS.
IMPOSTO SELETIVO COM ALÍQUOTAS DIFERENCIADAS
Senado - Bebidas alcóolicas e não alcoólicas, fumo, veículos, comunicações, energia elétrica, petróleo e gás natural.
Câmara - Fumo e bebidas alcoólicas.
INCENTIVOS E DESONERAÇÕES
 Senado - Imposto zero para remédios e alimentos. Outros incentivos definidos por cada Estado e município.
Câmara - Não prevê incentivos e desonerações.
TRANSIÇÃO ATÉ NOVO MODELO
Senado - 15 anos
Câmara - 10 anos, além de 50 anos para compensar eventuais impactos a Estados e municípios.
O grande problema no nosso sistema democrático está no fato de que quem manda é o Poder Executivo, porém, quem dá as cartas é o Poder Legislativo. Sendo assim, os deputados federais e os senadores eleitos pelo povo brasileiro, que em sua maioria representam diversos setores menos o povo, não permitem que nenhum avanço seja realizado em nenhuma lei ou projeto, muito menos numa reforma estrutural.
Quem manda são os Banqueiros, Latifundiários, Setores do Agronegócio, Industria Farmacêutica, Petrolífera, Empresários de grandes conglomerados. Tanto que no Congresso Nacional existe a Bancada da Bala, Evangélica, da Bola, só não tem a bancada do povo representada em todos os sentidos.
Para piorar, o eleitor brasileiro em geral, se preocupa com o nome do candidato a presidência e relega a terceiro plano sua escolha pelo deputado federal e senador. Escolhe sem critério, sem perceber que será este grupo eleito irá definir o futuro do país e da sociedade através de leis, projetos, decretos que afetam o seu próprio cotidiano.
Não falei sobre a Reforma Política por que estou tratando de coisas que podem acontecer ou que já e tornaram realidade, não posso discorrer de assuntos que são ficção científica, coisas inatingíveis e sem perspectivas nos próximos vinte anos.   

Autor: Rafael Moia Filho é Escritor, Blogger e Graduado em Gestão Pública.

8 de outubro de 2019

Da desordem à liberdade!

Muitos peruanos têm-se desencantado ante o espetáculo bochornoso de um Parlamento que parecia dedicado exclusivamente a impedir que funcionassem as instituições e a defender a corrução!
Fernando Vicente
Fez muito bem o presidente do Peru, Martín Vizcarra, ao dissolver o Congresso e convocar novas eleições para o próximo 26 de janeiro, data que acaba de ser confirmada pelo Júri Nacional de Eleições. E fizeram muito, mas muito bem, as Forças Armadas e a Polícia peruanas reconhecendo a autoridade do chefe de Estado; não tem sido muito frequente na história do país que as forças militares apoiem um Governo constitucional como o que preside Vizcarra; o “normal” seria que ajudassem a derrubá-lo.
A decisão de fechar o Congresso foi rigorosamente constitucional, como mostraram diversos eminentes juristas e explicou ao grande público, com sua lucidez característica, uma das melhores e mais valentes jornalistas do Peru: Rosa María Palacios. A Constituição autoriza o chefe de Estado a fechar o Congresso após este rechaçar por duas vezes a moção de confiança; ao mesmo tempo, obriga-o a convocar imediatamente eleições para substituir o Parlamento destituído. As duas questões foram cumpridas nesse caso. Pelo mesmo motivo, não se trata nem de longe de um “golpe de Estado”, como quis fazer acreditar a aliança entre apristas e fujimoristas, que tinha maioria simples no Congresso e o havia transformado em um circo grotesco de foragidos e semianalfabetos, com algumas poucas (embora muito respeitáveis) exceções. Por isso centenas de milhares de peruanos saíram às ruas, em todas as cidades importantes do país, para aplaudir o presidente Vizcarra, celebrando a medida em nome da liberdade e da legalidade, ridicularizadas pela maioria parlamentar de apristas e fujimoristas.
Como sempre, por baixo e por trás das discussões legais que sustentam as instituições da democracia, há interesses pessoais, muitas vezes abjetos, que costumam prevalecer. Para isso existem a liberdade de expressão e o direito de crítica que, bem exercidos, fazem as denúncias e estabelecem os limites necessários, determinando as prioridades e tirando a verdade e a liberdade das trevas em que seus inimigos quiseram mergulhá-las.
Nesses casos, sem a menor dúvida, ambos os valores estão representados pela decisão do presidente Vizcarra, e os genuínos inimigos da verdade e da liberdade são os que até agora sujaram, até extremos inconcebíveis, o Congresso da República, transformando-o num instrumento da vingança de Keiko Fujimori contra Pedro Pablo Kuczynski, que a derrotou numa eleição presidencial que ela pensava ter vencido: era o que indicavam as pesquisas. Então ela, através do Congresso, dedicou-se a derrubar ministros e impedir que ele governasse. Por sua vez, Kuczynski, que muitos de nós considerávamos ser o presidente mais bem preparado da história do Peru e que acabou sendo um dos piores, achou que aplacava o tigre oferecendo-lhe cordeiros (ou seja, indultando o ex-presidente Fujimori da pena de 25 anos de prisão que cumpre por ser assassino e ladrão). Com isso, fez o haraquiri e finalmente precisou renunciar. Agora está em prisão domiciliar, investigado pelo Poder Judiciário, acusado de lavagem de dinheiro.
Provavelmente nada do que ocorreu teria alcançado tais proporções se, nesse ínterim, não tivesse aparecido o famoso caso Lava Jato no Brasil, em que a empreiteira Odebrecht e as “delações premiadas” – isto é, autoconfissões de atos ilícitos em troca de penas reduzidas ou simbólicas – revelaram que no Peru vários presidentes, ministros e parlamentares haviam sido comprados pela tristemente célebre empresa (e por outras também) para favorecê-la com concessões de obras públicas e outros privilégios. Isto irritou sobretudo os apristas e fujimoristas, envolvidos nessas sujas maracutaias. E seu pânico aumentou quando, ao mesmo tempo em que tudo isso acontecia no Brasil, surgia dentro do Poder Judiciário peruano um grupo de promotores honestos e corajosos determinados a aproveitar as delações premiadas para revelar a corrupção no Peru e punir os culpados.
Essa é a razão profunda que está por trás dos atropelos e ilegalidades cometidos pela maioria parlamentar simples mantida pela aliança de apristas e fujimoristas, que obrigaram o presidente Vizcarra a fechar este Congresso e a convocar eleições para substituí-lo. Tomara, diga-se de passagem, que os peruanos votem no próximo 26 de janeiro melhor do que nas eleições anteriores, e não mergulhem de novo o Peru em um Parlamento tão medíocre e obtuso como o recém-desaparecido. Mas as próprias condições dessa eleição não favorecem a existência de muitos bons candidatos para ocupar os assentos; o tempo de vida que terão será muito pequeno – cerca de 16 meses – e, como não há reeleição segundo as novas disposições eleitorais, os incentivos para os novos congressistas não são nada estimulantes.
Em todo caso, porém, trata-se de um passo adiante na consolidação da democracia no Peru. Muitos peruanos, ante o espetáculo vergonhoso deste Parlamento, que parecia exclusivamente preocupado em impedir o funcionamento das instituições, em defender a corrupção e seus líderes desonestos, haviam se decepcionado com a legalidade. Para isso serviam as eleições livres? Agora sabem que, por mais erros que se possam cometer dentro de uma democracia, numa sociedade livre pode-se trazer à luz tudo aquilo que funciona mal, e que essa é a grande superioridade das sociedades abertas em relação às ditaduras.
Gostaria também de destacar o espírito cívico que levou tantos peruanos às ruas para renovar seu convencimento de que a liberdade é sempre a melhor opção. Uma das boas coisas que havia no Peru, apesar do Congresso, era a liberdade de expressão. O jornalismo peruano funcionou nesses anos expressando a grande diversidade política que existe no país, e muitas das críticas desta imprensa foram certeiras e impediram que, em meio à desordem, a legalidade perecesse. Mas um país não funciona apenas com a democracia. É imprescindível que haja trabalho, que os cidadãos sintam que existe igualdade de oportunidades, que todos possam progredir se se esforçarem para isso, e que existe uma ordem jurídica à qual podem recorrer se forem vítimas de injustiças e atropelos.
Curiosamente, nesses anos de desordem política, o país é um dos poucos da América Latina que cresceram economicamente; a classe média aumentou e, apesar dos desastres naturais, o Peru avança na criação de riqueza e oportunidades. Uma única mancha nesse panorama: a ideia de que toda mineração é negativa e que é preciso combatê-la para que não destrua o meio ambiente. Isso é um absurdo, mas tem penetrado na sociedade além dos demagogos da extrema esquerda que o promovem. E, ao mesmo tempo em que isso ocorre, cresce a mineração ilegal – ela, sim, uma ameaça gravíssima à saúde ecológica de um país. Tomara que, livre desse Congresso repelente e das desordens que auspiciava, a democracia peruana comece também a funcionar dentro de uma legalidade e uma liberdade dignas desses nomes.

Autor: Mario Vargas Llosa: Direitos mundiais de imprensa em todas as línguas reservados a Edições EL PAÍS, SL, 2019. © Mario Vargas Llosa, 2019.

6 de outubro de 2019

A baixeza humana!

Peço licença às leitoras e leitores para substituir minha análise política rotineira por ligeiras linhas sobre o espírito do nosso tempo. Começo com o alerta feito por Nietsche em seu retiro nos Alpes suíços em 1880: "Vejo subir a preamar do niilismo". Prenunciava a chegada de tempos medíocres e vulgares.
"A história se repete, a primeira vez como tragédia, a segunda como farsa". Nesses tempos de baixeza moral, a atestar que o estágio civilizatório de um povo nem sempre segue o rumo da grandeza, urge dar novo sentido à frase acima de Karl Marx. A história se repete uma, duas, cinco ou mais vezes, e portando novas tragédias. Olhe-se ao redor. Um clima de emboscada nos segue com agressões de todos os tipos. Insegurança nas ruas, gangues em todas as regiões, balas perdidas, querelas por pequenos incidentes - um esbarrão nos ônibus, um palavrão no trânsito. Fosse só isso, seria até suportável.
Mas os tempos são mais sombrios e abatem a moral de nossa gente. Oportunistas e carreiristas se abrigam em guetos na administração pública. Larápios se disseminam e corroem as riquezas da Nação. Em pleno tempo de Lava Jato, apoiam-se em modelagens tecnológicas para sugar bens do Estado. A honradez cede lugar às artimanhas.
Profissionais da política trocam a missão de bem servir à sociedade, ideal aristotélico, por uma profissão bem remunerada. Servir-se em lugar de servir. Muitos trocam a palavra e sua índole moral por uma prebenda. Corações e cérebros escamoteiam a verdade, arrumam desculpas para explicar a mudança de posição em importantes decisões. As circunstâncias determinam o ir e vir. Firmeza de propósitos? Quimera.
Nessa paisagem de folhas secas, grupos se digladiam em redes sociais com xingamentos e acusações, multiplicando Fake News em um cabo de guerra imaginário. Debater em um fórum de ideias? Não. O ódio racha a sociedade, a bílis escorre. É um jogo de soma zero.
Frios, apáticos, cegos, milhões não enxergam os horizontes do amanhã de prosperidade, caso substituíssem a mentira pela verdade, o deboche pelo respeito, o oportunismo pela oportunidade de ajudar os carentes, a indignidade pelo zelo, a torpeza pela civilidade. O que se vê são impostores e hipócritas. A injustiça impera, apesar do Judiciário, do Ministério Público e dos sistemas de controle. O espetáculo motiva operadores do Direito, interessados apenas na visibilidade. A hipocrisia dá o tom. A maldade se bifurca na encruzilhada dos malfeitores. O primeiro germe da perfeição moral se manifesta quando alguém pratica o bem, ensina coisas certas, admira as virtudes. Mas esse germe é escasso, convenhamos.
O país se locupleta de pessoas refratárias a gestos dignos. Que navegam no pântano. Caçadores de fama, aproveitam o niilismo para surfar nas ondas do favorecimento. Resta pinçar o timoneiro Simon Bolívar, que há 170 anos perorava: "Não há boa fé na América, nem entre os homens nem entre as nações; os tratados são papéis, as constituições não passam de livros, as eleições são batalhas, a liberdade é anarquia e a vida, um tormento. A única coisa que se pode fazer em nossa América é emigrar".

Autor: Gaudêncio Torquato – Coluna Opinião do Jornal da Cidade de Bauru.

3 de outubro de 2019

Ética, Cidadania e Políticas públicas!

“Se queremos ser éticos, jamais podemos
adotar a omissão como atitude.
Essa é uma questão de caráter pessoal”
Blaise Pascoal.

A Ética são os princípios que norteiam a conduta humana. Aquilo que pertence o “bom costume”, ou portador de “bom caráter”. São valores e moral de um indivíduo ou de uma sociedade onde vivemos, e das pessoas com quem convivemos. É latente a necessidade de um mundo pautado de civilidade, onde podemos contribuir com o propósito maior de construir relações interpessoais que sejam saudáveis e, que produzam bons resultados aos envolvidos. E tragam de forma geral ao ambiente onde vivemos e convivemos.

Ética não pode ser um atributo de qualidade, precisa ser uma condição natural, algo que se espera de todos. É, obrigação não apenas de um indivíduo, mas de uma sociedade como um todo. É um dever básico um princípio fundamental que se possa construir uma sociedade mais justa.

A Cidadania sempre esteve fortemente atrelada aos “direitos e deveres” é ter direito a vida, a liberdade, a igualdade perante a LEI, conforme diz o Artigo 5º da nossa “Constituição”, o direito a educação, saúde, segurança, moradia, salário justo a uma velhice tranquila, etc.

É, poder ter uma ideia e, poder expressá-la, é também exercer o cumprimento de seus deveres e poder cobrar seus direitos. Já que somos uma sociedade, marcada profundamente pela desigualdade. Cujo fundamento, é primordial do estado democrático de direito, que possibilita o cidadão o alcance de uma vida digna com inclusão social e econômica.

O exercício da Cidadania, também constitui, em participar nas tomadas de decisões de assuntos que dizem a respeito da sociedade, em que vivemos em busca da luz de entendimento.
Somos um País, de contrastes carregamos sob os alicerces da desigualdade social, da violência desmedida do mando descontrolado do estado. Cidadania é luto e grito pelos nossos direitos, exigindo e oferecendo respeito e direito do outro.

Políticas Públicas são direitos assegurados em nossa constituição federal. Os problemas inerentes, das políticas públicas… recorrente no Brasil, não tem merecido a devida atenção por parte dos nossos Agentes Públicos. O Poder Público tem sido inerte com a falta de decisões, planejamentos e ações. É, uma garantia de condições digna de vida ao cidadão de forma equânime, e que precisaria ser efetivamente bem planejada, e, executada de forma ampla.
Cuja, ação gerencial que desenvolve entre o setor público e a sociedade. São ações e programa governamental, que não tem sido de forma primordial.

Há muitas falhas nesses programas de assistência social, previdência, saúde, educação, trabalho, etc. São milhões de recursos que deveriam ser investidos corretamente, de acordo a necessidade de cada Pasta, mas são subtraídos por desvios e grandes escândalos por parte, dos nossos Agentes Públicos.
Se o dinheiro público fosse devidamente investido nas prioridades ficaria bem mais barato, do que os rombos do governo. Não poderia deixar de exaltar o grande e admirado trabalho dos “Voluntários da Pátria”, que muito contribuem, diretamente ou indiretamente, com as Políticas Públicas, em prol a uma sociedade de grande carência, que ainda existem no Brasil.

Os “Voluntários da Pátria” fazem um relevante trabalho… por esse Brasil adentro cada um de sua maneira, muitos nem aparecem apenas contribuem de forma anônima.

Ética, Cidadania e, Políticas Públicas precisam caminhar sempre de mãos atreladas e, que devem ser tratadas de forma justa e, equitativa, em pé de igualdade e, com a mesma ênfase. São a essência das normas, valor em qualquer realidade social e moral de um indivíduo ou de uma sociedade.

Autor: Rafael Moia Filho  - Escritor, Blogger e Graduado em Gestão Pública.

1 de outubro de 2019

Como Serra e Aécio escaparam da Lava Jato!

A explicação de Janot é que as duas testemunhas-chaves haviam morrido.
Foto: GGN
Desde a prisão de Mariano Marcondes Ferraz, várias vezes manifestamos estranheza com a falta de preocupação da Lava Jato em se aprofundar nas investigações sobre a Trafigura, uma das 50 maiores empresas do planeta, segundo a lista da Forbes.
Trata-se de uma comercializadora de petróleo que montou o maior esquema de corrupção da era moderna – conseguindo o monopólio da extração e da importação de petróleo em Angola.
O autor do feito foi justamente Marcondes Ferraz, promovido a membro do board da companhia. A Trafigura tinha contratos vultosos com a Petrobras para transporte e comercialização de derivados, um mercado imensamente maior do que o das obras da empresa. No início da Lava Jato, Paulo Roberto Costa já havia mencionado a Trafigura.
Surpreendentemente, a Lava Jato se restringiu ao lobby que Marcondes Ferraz fazia para a Decal, uma empresa italiana sediada no porto de Suape, praticamente um bico de lobby, perto dos interesses da Trafigura.
O livro de Rodrigo Janot esclarece a dúvida.
No final de 2016, a PGR recebeu um pedido de colaboração da Espanha, referente a Gregório Preciado, casado com uma prima de Serra. Preciado era suspeito de ter pago subornos no valor de 10 milhões de euros a políticos brasileiros, para a obtenção de um contrato pela Defex, uma sociedade de capital misto controlada pelo Estado espanhol. O contrato da Defex foi para um empreendimento para exportação de minério de ferro, sociedade de Eike Batista com a Trafigura. Segundo as autoridades espanholas, as propinas aos políticos brasileiros teriam sido pagas por uma empresa offshore de nome Iderbras, administrada por Preciado e em nome de Vivencia Talan, prima de Serra.
Para atender à colaboração da Espanha, havia a necessidade de uma formalização através do Ministério da Justiça. Serra era o Ministro das Relações Exteriores de Temer, e figura chave no impeachment. O Ministro da Justiça era Alexandre de Moraes que, logo em seguida, foi substituído por Osmar Serraglio e Torquato Jardim. E a cooperação jamais foi formalizada. Não houve vazamentos para a mídia, não houve pressão da mídia, e o caso dormiu nas gavetas da PGR.
Outro caso emblemático foi o não indiciamento do senador Aécio Neves. Na época, um filho de Teori comentou com amigos a estranheza do pai, pelo fato de Janot ter proposto o indiciamento de Lindberg Farias e negado o de Aécio Neves, segundo Teori, tendo indícios muito mais concretos do que o petista.
A explicação de Janot é que as duas testemunhas-chaves haviam morrido – o ex-deputado José Janene, também beneficiário de Furnas, e que havia descrito em detalhes a participação de Aécio no esquema; e Airton Daré, da Bauruense, empresa que lavava o dinheiro da mesada.
Ora, haviam morrido, mas a contabilidade e as movimentações financeiras ainda existiam. E, desde 2010, repousava na PGR o inquérito Norbert, que localizara contas de Aécio em Liechtenstein, provavelmente para as propinas da JBS.
Segundo Janot, ele não indiciou o conterrâneo para não criar um novo Berlusconi. Pouco importa o fato de não haver a menor relação entre poupar Aécio ou criar um Berlusconi brasileiro.
Aécio só entrou novamente quando a JBS apareceu com as gravações de conversas com ele. Ali, não havia como refugar.

Autor: Luis Nassif – Publicado no GGN