Nos tempos da União Soviética, os
grupos não comunistas, que normalmente rezavam pela cartilha de Moscou eram
chamados de linha auxiliar. Na nova era, o presidente Bolsonaro e seu chanceler
Araújo podem ser considerados linha auxiliar do governo Trump.
Mesmo não sendo cidadãos
estadunidenses, suas primeiras posições em política externa atendem aos
interesses dos EUA de Donald Trump, ignorando ou mesmo prejudicando os nossos. A
anunciada (felizmente suspensa) instalação da embaixada brasileira em Jerusalém
violaria decisões da ONU e enfureceu os palestinos e os árabes, de modo geral.
No século passado, o Conselho de
Segurança da ONU não rejeitou a tomada da cidade pelo exército israelense e
recomendou que fosse dividida entre judeus e árabes. Todos os países
respeitaram esta posição, a qual tem força de lei. Até no ano passado, quando
os EUA de Donald Trump, mudaram sua embaixada para Jerusalém (seguidos, num
átimo, pela Guatemala).
Os EUA agiram desse modo para agradar
a Israel, seu maior aliado no Oriente Médio, e ao vasto eleitorado evangélico
do presidente republicano, que precisa contar com seu voto nas próximas
eleições presidenciais.
Já o Brasil não ganharia absolutamente
nada se imitasse Tio Sam. Em compensação arriscava-se a perder as importações
árabes de produtos brasileiros, em retaliação à mudança que fortaleceria um
reconhecimento internacional de Jerusalém indivisa como capital de Israel. Jerusalém é uma das principais cidades-santas
do islamismo. Renunciar a ela é inaceitável para os seguidores de Maomé, que
exigem a parte oriental da cidade como capital do futuro Estado palestino.
Uma eventual perda das exportações de
commodities brasileiras para os países árabes, que levaria bilionários recursos
a virarem fumaça, provocou protestos de agricultores, pecuaristas e membros do
governo não contaminados pela ideologia olavista.
Brasília acabou desistindo, ao menos
momentaneamente, de se comportar como linha auxiliar da administração de The
Donald.
Depois do beija-mão da Casa Branca, Bolsonaro, seu chanceler, Araújo, e outros dignitários viajaram a Israel, para cumprir promessa eleitoral e estreitar uma aliança com o governo Netanyahu.
Interessava a Donald Trump aproximar seus aliados, para vitaminar as iniciativas ianques nos foros internacionais. Também nesta viagem o Brasil não ganhou nada; felizmente as perdas não foram das maiores, os árabes acabarão por aceitar a fundação de um escritório brasileiro para negócios inexistentes com Israel. De volta ao Brasil, depois da uma tirada humorística que associava o nazismo à esquerda, o folclórico Araújo parece pronto para uma nova incursão da sua campanha pela ideologização da política externa brasileira. Em entrevista à Folha de S. Paulo, ele informou que estaria sendo discutida uma aliança geopolítica com os Emirados Árabes Unidos, destino da próxima viagem presidencial. Por sinal, trata-se de mais uma monarquia absoluta, invariavelmente fiel à política norte-americana no Oriente Médio.
Depois do beija-mão da Casa Branca, Bolsonaro, seu chanceler, Araújo, e outros dignitários viajaram a Israel, para cumprir promessa eleitoral e estreitar uma aliança com o governo Netanyahu.
Interessava a Donald Trump aproximar seus aliados, para vitaminar as iniciativas ianques nos foros internacionais. Também nesta viagem o Brasil não ganhou nada; felizmente as perdas não foram das maiores, os árabes acabarão por aceitar a fundação de um escritório brasileiro para negócios inexistentes com Israel. De volta ao Brasil, depois da uma tirada humorística que associava o nazismo à esquerda, o folclórico Araújo parece pronto para uma nova incursão da sua campanha pela ideologização da política externa brasileira. Em entrevista à Folha de S. Paulo, ele informou que estaria sendo discutida uma aliança geopolítica com os Emirados Árabes Unidos, destino da próxima viagem presidencial. Por sinal, trata-se de mais uma monarquia absoluta, invariavelmente fiel à política norte-americana no Oriente Médio.
Segundo o ministro, esse país estaria
disposto a ampliar seus investimentos no Brasil. Dinheiro não faltaria aos
emires, grandes produtores de petróleo. O chanceler lembrou que os Emirados são
o terceiro maior importador árabe do Brasil, somente superado pelo Egito e a
Arábia Saudita, outra escala da nova viagem dos próceres da nova era. Continuando suas declarações à Folha,
um entusiasmado Araújo deixou-se levar pelo seu wishful thinking afirmando que:
“os Emirados poderiam ser usados pelo Brasil como um hub logístico para enviar
produtos agrícolas para Índia e a Malásia e negociar um acordo de facilitação
aduaneira”. Com muita propriedade, ele empregou o condicional nessa enumeração
de benesses, sujeitas a um futuro remoto e incerto.
Não é de graça que os emires aceitarão
tornar realidade os sonhos do Itamaraty da nova era. O preço é o alinhamento do Brasil na cruzada
anti-Irã, liderada pelos EUA. Nosso papel já fora definido pelos emires:
pronunciar-se contra o regime de Teerã em todas as votações nos organismos
internacionais e, principalmente, condenar o Acordo Nuclear, com que se
resolveu uma questão que o Ocidente via como assustadora.
Na proposta dos Emirados, há certos
aspectos a considerar. Se for atendida, o Brasil terá passado a hostilizar o
Irã, que certamente deixaria de continuar sendo nosso parceiro. Resultado:
perderíamos um importador extremamente importante. Em 2018, o Irã comprou
produtos brasileiros no valor de 4 bilhões e 888 milhões de dólares (COMEX,
6-04-2019), mais do dobro dos Emirados Árabes Unidos, que adquiriram apenas cerca
de 2 bilhões de dólares (Folha de São Paulo, 5-04-2019).
Nota-se que não são os interesses
nacionais os motivadores da operação. Em termos práticos, eles seriam
contrariados num lance que desfalcaria nossa economia em preciosos bilhões de
dólares anuais. A causa real é corrigir o rumo da política externa do Brasil,
enveredando pelo alinhamento à política dos Estados Unidos. O que seria uma
ideologização. Exatamente o que Araújo diz condenar e prometia mudar.
O Acordo Nuclear com o Irã nada teve
de ideológico. Atendia simplesmente aos receios da Europa, EUA e de alguns
países asiáticos de que o desenvolvimento da indústria nuclear iraniana poderia
detonar uma guerra regional, com chances de se expandir pelo planeta.
Depois de vários anos de discussões,
nas quais o então governo de Barack Obama teve parte destacada, as principais
potências e o Irã chegaram a um acordo bastante satisfatório. Logo a seguir,
veio a aprovação unânime na ONU e da opinião pública de todo o mundo, inclusive
os EUA. Na verdade, somente Israel e algumas potências regionais inimigas do
regime de Teerã foram contra.
Isso antes de Trump chegar ao poder.
The Donald, não só retirou seu país do acordo nuclear, como se lançou numa
campanha para a destruir o regime do Irã. Não conseguiu convencer seus aliados,
nem da Europa, nem dos demais continentes. Os EUA ficaram isolados, francamente
contestados em toda a parte.
Claro, não é por capricho que
Washington pretende colocar o Irã de rastos. Há razões geopolíticas envolvidas.
O regime de Teerã ousa desafiar a hegemonia norte-americana no Oriente Médio. Por
ela, Trump está jogando pesado, impondo sanções aos iranianos, tão duras que
podem levar o país ao caos. Ao lado do
presidente republicano estão apenas Israel – esse país e o Irã são inimigos de
morte, a Arábia Saudita e os Emirados Unidos, além de umas três ou quatro
ilhotas no Pacífico e outras nações irrelevantes.
A “nova era” parece interessada em
ingressar nesse pequeno grupo que se opõe ao concerto mundial. O Brasil não tem
nenhum motivo sério para se juntar à cruzada anti-iraniana. O alinhamento aos
EUA até agora só produziu lugares comuns, promessas vazias e negócios
desimportantes, a maioria sem vantagens reais. Teria, porém, muito a perder:
além das vultosas exportações para Teerã, também, principalmente, o respeito da
comunidade internacional.
Vale ouvir o conselho de Thomas
Jefferson, um dos Pais da Pátria norte-americana: “paz, comércio e amizade com
todas as nações, não se envolvendo com nenhuma”.
Autor: Luz Eça
– Começou sua vida profissional como jornalista e redator de propaganda.
Escreve sobre Política Internacional no Correio da Cidadânia.
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