Se
pensas em mudar o mundo, podes conseguir, mas não perceberás. Os de sua geração
não irão se beneficiar, irão te criticar e poucos reconhecerão seus esforços.
Se obter um resultado muito bom, a sensação de que está sozinho será muito
grande, como no pico mais alto sem ninguém para conversar.
Por
aqui a ciência também é exercida na universidade pelos professores. Em outros
países, é desenvolvida em institutos de pesquisa e a universidade sem a
"obrigação" de produzir trabalhos científicos, mas de formar pessoas.
Aqui,
se usa critérios e postulados antiquados para um indivíduo ser bom
"professor": 1. Qualidade não importa, o que vale é a quantidade. 2.
Se a pesquisa não melhorou a humanidade, pouco importa. 3. Se acrescentou algo
no conhecimento, também não importa. 4. Números são números, nada mais, mas é o
que importa.
A Carreira
Você
começou o mestrado e quer evoluir na carreira, escolha uma metodologia com um
aparelho e repita-o em 50 células ou tecidos diferentes. Terás 50 trabalhos
publicados: "presença da proteína tal sobre a célula da pele", depois
no fígado, rim e sucessivamente. Para quê? Para nada, só para mostrar que tem
esta proteína!
Escolha
uma substância qualquer como um ácido ou sal e o quantifique em todos líquidos:
água, refrigerante, leite, urina, água de coco, sangue e outros. Cada dosagem,
um trabalho no exterior. Cada um destes trabalhos vem de uma dissertação de
mestrado ou tese de doutorado, e se dirá: este professor "formou" 40
pessoas. Formar pessoas não significa abrir laboratórios para a pesquisa, mas
formar pessoas implica em induzir a capacidade de análise crítica, formar o
cidadão e o ser humano, preparar o indivíduo para a vida social e acadêmica
dentro de padrões éticos.
Consiga
um aparelho para mensurar a forma ou tamanho de objetos e materiais. Será um
trabalho publicado para cada objeto ou material. Mas isto não é pesquisa? É,
mas não é de ponta, está mais para controle de qualidade, estabelecimento de
protocolo de conduta ou uniformização de procedimentos. Na pesquisa de ponta se
deve inovar, esclarecer, desvendar, criar, apontar e até demonstrar, mas não
repetitivamente para fazer currículo e passar em concursos. É assim que se faz
e não é ilícito, apenas estranho, esquisito e improdutivo com o dinheiro
público. Em mais de 95% dos trabalhos nada se modifica, acrescenta e quando
repete algo, ainda se faz mal feito. A literatura científica é igual internet:
leia quem quer e acredite em quem quiser.
Requisitos
Para
ser professor universitário e evoluir na carreira precisa-se passar em
concursos que leva em consideração estes critérios, então só lhe resta abrir
mão da vida e pensamento próprio por anos e publicar coisas que não interessa a
ninguém, em inglês e em muita quantidade. Você tem que ficar zanzando anos a
fio pelo campus como zumbi: se tiver opinião e luz própria não vai interessar a
ninguém! Nem se mostre muito competente e autossuficiente.
Se
teu potencial lhe apontar como um grande professor, a ideia do sistema é cortar
o mal pela raiz! Para ser aceito no sistema, não seja nem crítico e nem
reflexivo; seja sonso, bicho morto, um cordato que pensa o que todo mundo
pensa! Seja amorfo, inodoro e deixa claro: sou "apolítico". Caso não
siga esta regrinha, ninguém vai te querer como parceiro! Se tuas aulas são boas,
pouco importa! Se trata bem as pessoas, considera os demais, possui elegância e
trata eticamente os subordinados: besteira! O que vale é publicar.
Divindade
Deus
nunca chegaria a ser professor universitário pelos critérios ultrapassados e
ainda utilizados. Tem apenas uma publicação em hebraico, sem resumo em inglês e
sem referência bibliográfica. Não tem nenhuma publicação em revistas indexadas,
pairando dúvidas se o texto realmente seja dele, pois teve 11 colaboradores.
Nunca mais publicou e os cientistas não conseguem reproduzir seus resultados
originais. Aliás o seu trabalho não foi aprovado em comitê de ética ou
pesquisa. Em suas aulas, cita sempre o mesmo livro e valoriza demais os
talentos do filho, um explícito caso de nepotismo. Em seu currículo não consta
nenhum estágio e mesmo participação em congressos.
Conclusão
Ahh!
Toda regra tem exceção: vamos à luta!
Autor: Alberto
Consolaro é professor titular da USP - Bauru. Escreve todos os sábados no
JC.
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