Não se podem
ignorar as novas arrumações do sistema produtivo que passaram a exigir soluções
“mais racionais e mais modernas”, em busca de maior eficácia nas relações de trabalho.
As siglas foram inventadas para
encurtar nomes ou expressões. Mas, curiosamente, pejota é um nome que
encompridou uma sigla.
PJ é a sigla de pessoa jurídica
(empresa, em oposição à pessoa física) e pejotização é o sistema que, na
prática, transforma um profissional ou funcionário em empresa. Em vez de ganhar
como empregado, cria uma empresa da qual é sócio, por meio da qual presta
serviços, e recebe não como assalariado, mas por meio de dividendos pagos pela
empresa, que, por sua vez, garante receitas por emissão de notas fiscais.
A pejotização está hoje sob ataque de
várias frentes. Há os trabalhistas, para os quais a pejotização não passa de
esquema cujo objetivo é fugir do pagamento de encargos sociais e dos direitos
trabalhistas. Isto é, ao contratar uma pessoa física como PJ, e não por
contrato de trabalho regido pela CLT, a empresa ou o empregador deixa de pagar
abono de férias, 13.°, FGTS, INSS e outros encargos, além de não ter de arcar
com custos de transporte e alimentação. São incontáveis as decisões da Justiça
do Trabalho que invalidam contratos desse tipo.
Há os tributaristas, como o economista
Bernard Appy, que denunciam o que entendem por “distorção injustificável” desse
sistema que cobra do sócio de uma PJ apenas uma fração de Imposto de Renda (calculado
sobre o lucro presumido) cobrado por um assalariado comum: 11% em vez de 27,5%.
Se os dividendos voltarem a ser
submetidos ao recolhimento do Imposto de Renda, como quer o secretário da
Receita, Marcos Cintra, a primeira vítima de uma decisão desse tipo seria o
pejota, que perderia a isenção fiscal sobre as transferências pagas por sua
empresa. Outro impacto aparece nas finanças da
Previdência Social, na medida em que o “empregador disfarçado” está dispensado
de recolher sua contribuição ao sistema, como ficou dito.
Dos mais de quatro milhões de
empregadores registrados pela Pnad Contínua no primeiro trimestre de 2019,
80,9% têm CNPJ (Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica). Já entre as pessoas
físicas, os PJs ocupam 20,1% de um total de 23,7 milhões. (Veja tabela.) O
coordenador de Trabalho e Rendimento do IBGE, Cimar Azeredo, observa que a
pejotização vem crescendo por conta da crise, que intensificou as demissões.
Muitos desses funcionários foram readmitidos depois como PJ, simplesmente
porque é mais barato.
Dos mais de 4 milhões de empregadores registrados pela Pnad Contínua no primeiro trimestre de 2019, 80,9% têm CNPJ.
O problema não está em acabar pura e
simplesmente com a pejotização, porque o sistema apareceu na década de 90 para
combater distorções, que voltariam a crescer se o sistema acabasse. A mais
grave dessas distorções tem a ver com o próprio desemprego, como observa o
ex-ministro do Trabalho e ex-presidente do Tribunal Superior do Trabalho Almir
Pazzianotto Pinto.
Entre as mais importantes razões que
explicam o alto desemprego no Brasil, está o alto custo dos encargos sociais
para qualquer empresa – sem falar dos passivos trabalhistas tão frequentemente
criados arbitrariamente pela própria Justiça do Trabalho. “A pejotização está
intimamente ligada ao desemprego”, adverte Pazzianotto. O próprio governo do
Partido dos Trabalhadores reconheceu o problema quando tratou de derrubar –
embora desajeitada e atabalhoadamente – os encargos sociais das empresas.
Não se podem ignorar as novas
arrumações do sistema produtivo que passaram a exigir soluções “mais racionais
e mais modernas”, em busca de maior eficácia nas relações de trabalho, como é o
caso da terceirização.
Exemplo de terceirização ligada à
pejotização é o home office, modalidade em que o funcionário pode trabalhar em
casa ou até mesmo na rua, como coworking. Com isso, a empresa contratadora dos serviços
do PJ reduz custos de locomoção, de refeições e de equipamentos, como mesa,
telefone e computador. Em cenários de estagnação, como os de agora, essa tem
sido a saída encontrada por muitas empresas.
Outra distorção que a pejotização
procurou combater foi à elevada burocracia ao criar empresas e a excessiva
carga tributária a que são submetidas. Tudo fica mais fácil para uma clínica
médica, um escritório de advocacia ou, até mesmo, para pequenos fornecedores se
os procedimentos forem agilizados por meio da criação de um pejota.
“A pejotização veio para ficar”, avisa
Pazzianotto. Para ele, não há como evitar as consequências da disseminação dos
aplicativos e a robotização do trabalho. O mercado passa por transformações que
criam conflitos entre a necessidade de gerar empregos e o emprego indispensável
de tecnologias que destroem postos de trabalho. “A criação de PJs é um jeito de
escapar desse desastre.”
Autor:
Celso Ming – Estado de SP
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