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12 de maio de 2019

A pejotização sob ataque

Não se podem ignorar as novas arrumações do sistema produtivo que passaram a exigir soluções “mais racionais e mais modernas”, em busca de maior eficácia nas relações de trabalho.
As siglas foram inventadas para encurtar nomes ou expressões. Mas, curiosamente, pejota é um nome que encompridou uma sigla.
PJ é a sigla de pessoa jurídica (empresa, em oposição à pessoa física) e pejotização é o sistema que, na prática, transforma um profissional ou funcionário em empresa. Em vez de ganhar como empregado, cria uma empresa da qual é sócio, por meio da qual presta serviços, e recebe não como assalariado, mas por meio de dividendos pagos pela empresa, que, por sua vez, garante receitas por emissão de notas fiscais.
A pejotização está hoje sob ataque de várias frentes. Há os trabalhistas, para os quais a pejotização não passa de esquema cujo objetivo é fugir do pagamento de encargos sociais e dos direitos trabalhistas. Isto é, ao contratar uma pessoa física como PJ, e não por contrato de trabalho regido pela CLT, a empresa ou o empregador deixa de pagar abono de férias, 13.°, FGTS, INSS e outros encargos, além de não ter de arcar com custos de transporte e alimentação. São incontáveis as decisões da Justiça do Trabalho que invalidam contratos desse tipo.
Há os tributaristas, como o economista Bernard Appy, que denunciam o que entendem por “distorção injustificável” desse sistema que cobra do sócio de uma PJ apenas uma fração de Imposto de Renda (calculado sobre o lucro presumido) cobrado por um assalariado comum: 11% em vez de 27,5%.
Se os dividendos voltarem a ser submetidos ao recolhimento do Imposto de Renda, como quer o secretário da Receita, Marcos Cintra, a primeira vítima de uma decisão desse tipo seria o pejota, que perderia a isenção fiscal sobre as transferências pagas por sua empresa. Outro impacto aparece nas finanças da Previdência Social, na medida em que o “empregador disfarçado” está dispensado de recolher sua contribuição ao sistema, como ficou dito.
Dos mais de quatro milhões de empregadores registrados pela Pnad Contínua no primeiro trimestre de 2019, 80,9% têm CNPJ (Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica). Já entre as pessoas físicas, os PJs ocupam 20,1% de um total de 23,7 milhões. (Veja tabela.) O coordenador de Trabalho e Rendimento do IBGE, Cimar Azeredo, observa que a pejotização vem crescendo por conta da crise, que intensificou as demissões. Muitos desses funcionários foram readmitidos depois como PJ, simplesmente porque é mais barato.
Dos mais de 4 milhões de empregadores registrados pela Pnad Contínua no primeiro trimestre de 2019, 80,9% têm CNPJ.
O problema não está em acabar pura e simplesmente com a pejotização, porque o sistema apareceu na década de 90 para combater distorções, que voltariam a crescer se o sistema acabasse. A mais grave dessas distorções tem a ver com o próprio desemprego, como observa o ex-ministro do Trabalho e ex-presidente do Tribunal Superior do Trabalho Almir Pazzianotto Pinto.
Entre as mais importantes razões que explicam o alto desemprego no Brasil, está o alto custo dos encargos sociais para qualquer empresa – sem falar dos passivos trabalhistas tão frequentemente criados arbitrariamente pela própria Justiça do Trabalho. “A pejotização está intimamente ligada ao desemprego”, adverte Pazzianotto. O próprio governo do Partido dos Trabalhadores reconheceu o problema quando tratou de derrubar – embora desajeitada e atabalhoadamente – os encargos sociais das empresas.
Não se podem ignorar as novas arrumações do sistema produtivo que passaram a exigir soluções “mais racionais e mais modernas”, em busca de maior eficácia nas relações de trabalho, como é o caso da terceirização.
Exemplo de terceirização ligada à pejotização é o home office, modalidade em que o funcionário pode trabalhar em casa ou até mesmo na rua, como coworking. Com isso, a empresa contratadora dos serviços do PJ reduz custos de locomoção, de refeições e de equipamentos, como mesa, telefone e computador. Em cenários de estagnação, como os de agora, essa tem sido a saída encontrada por muitas empresas.
Outra distorção que a pejotização procurou combater foi à elevada burocracia ao criar empresas e a excessiva carga tributária a que são submetidas. Tudo fica mais fácil para uma clínica médica, um escritório de advocacia ou, até mesmo, para pequenos fornecedores se os procedimentos forem agilizados por meio da criação de um pejota.
“A pejotização veio para ficar”, avisa Pazzianotto. Para ele, não há como evitar as consequências da disseminação dos aplicativos e a robotização do trabalho. O mercado passa por transformações que criam conflitos entre a necessidade de gerar empregos e o emprego indispensável de tecnologias que destroem postos de trabalho. “A criação de PJs é um jeito de escapar desse desastre.”

Autor: Celso Ming – Estado de SP

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