O discurso
altamente ideologizado do presidente tem feito com que categorias como
professores, ambientalistas, sindicalistas, ativistas e artistas sejam
automaticamente associados ao PT e estigmatizados por aliados e por ele próprio.
A parcela da esquerda que não está
presa à armadilha autoimposta de passar os dias bradando “Lula Livre” nas redes
sociais e defendendo a ditadura de Nicolás Maduro na Venezuela vai, aos poucos,
detectando um flanco para enfrentar o governo de Jair Bolsonaro: a falta de
projetos voltados aos mais pobres. O caminho, diga-se, foi mostrado pelo
próprio presidente e seu entorno.
O discurso altamente ideologizado de
Bolsonaro tem feito com que categorias como professores, ambientalistas,
sindicalistas, ativistas de organizações não governamentais e artistas sejam
automaticamente associados ao PT e estigmatizados – quando não xingados de
larápios de dinheiro público, canalhas e outros adjetivos – por aliados do
presidente, ministros e quando não pelo próprio. O exemplo mais recente foi o
entrevero entre Bolsonaro e artistas no carnaval. Na visita de Juan Guaidó a
Brasília, Bolsonaro brincou que a esquerda gosta tanto de pobres que acaba por
“multiplicá-los”. Mas o que o governo propõe para reduzir a pobreza?
Por ora não se sabe. A agenda liberal
do governo tem levado a mudanças como as referentes ao Benefício de Prestação
Continuada e à aposentadoria rural na reforma da Previdência, à redução de
repasses para as faixas mais populares do Minha Casa Minha Vida e à suspensão
da reforma agrária.
Já há setores do governo preocupados
com essa balança social desequilibrada. O próprio presidente deu mostras de que
pode não bancar a proposta de “focalização” do BPC defendida pela equipe
econômica, justamente pelo peso do programa junto aos mais pobres,
principalmente nos Estados do Nordeste.
Na campanha eleitoral, Bolsonaro tinha
feito uma inflexão em seu discurso histórico contra o Bolsa Família (sempre
associado por ele à compra de votos pelo PT) ao dizer que iria manter e ampliar
o programa, instituindo inclusive um 13.º para os beneficiários. Parecia
entender que, para ampliar sua base social, precisaria falar aos mais
necessitados da pirâmide social. Os primeiros meses não trouxeram um conjunto
de iniciativas voltadas a esse público, e a oposição, que mostrou na eleição
que não tem um projeto que fale ao conjunto da sociedade, percebe a lacuna e
começa a se reorganizar para atuar nela.
Fora do radar. Pobres apareceram em discurso, não em projetos. Foto: Dida Sampaio - ESTADÃO
CINZAS - Articulação da reforma em marcha
lenta pós-carnaval
A equipe da Secretaria Especial da
Previdência só retoma na quinta-feira a mobilização em prol da reforma.
Deputados só retornam em massa a Brasília a partir da semana que vem, e os dias
pós-folia serão usados para coordenar o discurso. A pausa carnavalesca foi
comemorada por articuladores do governo, que avaliam que será benéfica para
mitigar o efeito das declarações de Bolsonaro na semana passada, quando admitiu
graciosamente negociar aspectos do texto.
“Vamos voltar com a defesa do texto
que foi enviado”, me disse ontem um dos negociadores da reforma. As atenções
estarão voltadas para a composição da Comissão de Constituição e Justiça e da
Comissão Especial que analisará o mérito da proposta. O nome do jovem Fernando
Franceschini (PSL-PR) para presidir a CCJ foi recebido com ceticismo na área
técnica do governo, que prefere a deputada Bia Kicis (PSL-DF), considerada mais
firme e mais madura para uma comandar a principal comissão da Câmara.
Autora: Vera
Magalhães, O Estado de São Paulo.
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