A
crise industrial começou no País bem antes de chegar a covid-19.
A pandemia forçou o governo a cuidar da economia real e até dos pobres, mas falta um plano para consolidar a retomada, combiná-la com o conserto das contas públicas e, sobretudo, reconduzir o País ao desenvolvimento. Falta um governo do tipo necessário a um país emergente. O Brasil já ia muito mal antes do novo coronavírus. Com o desastre ocasionado pela covid-19, muita gente parece haver esquecido aquele quadro sombrio. O desafio imediato é sair do buraco e retomar as condições anteriores ao grande tombo. Mas o problema real é muito maior e qualquer discussão séria – sem populismo e sem jogadas eleitorais – tem de partir desse ponto. Para onde rumava o País antes da tragédia de 2020?
A pandemia forçou o governo a cuidar da economia real e até dos pobres, mas falta um plano para consolidar a retomada, combiná-la com o conserto das contas públicas e, sobretudo, reconduzir o País ao desenvolvimento. Falta um governo do tipo necessário a um país emergente. O Brasil já ia muito mal antes do novo coronavírus. Com o desastre ocasionado pela covid-19, muita gente parece haver esquecido aquele quadro sombrio. O desafio imediato é sair do buraco e retomar as condições anteriores ao grande tombo. Mas o problema real é muito maior e qualquer discussão séria – sem populismo e sem jogadas eleitorais – tem de partir desse ponto. Para onde rumava o País antes da tragédia de 2020?
Sinais
vitais do comércio e da indústria têm melhorado, mas em junho a produção
industrial continuou abaixo do nível de fevereiro. Se tivesse voltado àquele
nível, ainda estaria 16,6% abaixo do pico alcançado em maio de 2011. A partir
desse topo o declínio da indústria, até a recessão de 2015-2016, é bem visível
nas séries do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Houve alguma
reação em 2017 e 2018, mas o impulso acabou no primeiro ano de mandato do
presidente Jair Bolsonaro.
Depois
de três anos de queda, a produção da indústria avançou 2,5% em 2017 e 1% em
2018, mas declinou 1,1% em 2019. Bolsonaro e equipe tiveram uma estreia
desastrosa – mesmo sem contar a vergonha diplomática e o vexame da política
ambiental. O produto interno bruto (PIB) cresceu 1,1% – menos que em cada um
dos dois anos anteriores – e o desemprego permaneceu na faixa de 12% a 13%. De
novembro a fevereiro, antes, portanto, da nova crise, a produção industrial foi
sempre menor que no mês correspondente do ano anterior.
Com
a pandemia, a partir de março ficou menos visível a diferença entre os novos
desafios econômicos e os velhos problemas estruturais, exceto pelos detalhes
mais chocantes. Quando foi preciso pensar em prevenção, isolamento, contenção
do contágio e, enfim, socorro aos mais vulneráveis, mais luz foi lançada sobre
a pobreza extrema e as condições de saneamento e de habitação de milhões de famílias.
Dados abstratos, como o coeficiente de Gini, transformaram-se de repente em
cenas assustadoras ao vivo e em cores.
A
desigualdade passou de mero indicador a fato escancarado. A realidade confirmou
a advertência do Fundo Monetário Internacional (FMI): para executar as
políticas emergenciais os governos latino-americanos precisariam chegar a
segmentos sociais ainda intocados pelas políticas públicas. A experiência
brasileira comprovou de forma chocante essa previsão.
Mas
nem seria preciso chegar às cenas de pobreza extrema para perceber o enorme
desafio. Bem antes da pandemia e da recessão no primeiro semestre de 2020, o
desenvolvimento brasileiro havia sido travado. A baixa qualidade do emprego, a
informalidade e os níveis escandalosos de pobreza eram os sinais mais claros da
interrupção de um longo processo.
Tinha
havido alguma redução da desigualdade nas últimas décadas e crescente inclusão,
embora os indicadores sociais continuassem ruins. A crise da indústria, visível
antes da recessão de 2015-2016, realçou problemas cada vez mais graves: baixa
produtividade, formação deficiente de capital humano, pouca inovação, ampla
predominância dos segmentos de baixa tecnologia e escassa competitividade.
Protecionismo
excessivo e insuficiente participação nas cadeias globais foram facilmente
identificados, há anos, como entraves importantes. Burocracia, insegurança
jurídica, tributação disfuncional e financiamento escasso também têm sido
apontados, há muito tempo, como obstáculos à eficiência e à competitividade.
No
mesmo período o agronegócio brasileiro se consolidou como potência mundial. A
trajetória começou há décadas. Foi essencial a ação do setor público, por meio
do trabalho da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e de sua
cooperação com outras instituições. Também houve boas estratégias de
financiamento, de logística, de zoneamento e de difusão de tecnologia. Com
eficiência, em 30 anos a produção cresceu muito mais que a área ocupada.
Poupando terras, o agronegócio tem garantido a segurança externa da economia
brasileira.
Por
que a agropecuária cresceu e ocupou espaços no mercado global, enquanto a
indústria, com exceção de alguns segmentos e grupos empresariais, emperrou e
até regrediu? Como programar a retomada industrial? Como ordenar as ações?
Essas perguntas poderiam abrir um reexame do crescimento, da modernização e das
funções das políticas públicas.
É
inútil propor esse tipo de assunto ao presidente Bolsonaro. Ele repassará a
questão ao seu “posto Ipiranga”, o ministro da Economia. Mas será uma surpresa
se ele responder com algo diferente de seu discurso habitual. Aprovada a
reforma da Previdência, ele se concentrou em duas missões, aparentemente
essenciais, em sua opinião, para a prosperidade brasileira: eliminar os
encargos da folha salarial e recriar com nova cara a CPMF. Para que complicar a
conversa?
Autor:
Rolf Kuntz é jornalista. Artigo publicado no jornal O Estado de S.Paulo.
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