“Aqueles
que corrompem a opinião
pública
são tão funestos como àqueles
que
roubam as finanças públicas”
Adlai Stevenson
Preço do petróleo em terreno negativo pela primeira vez na história
A pandemia do
novo Coronavírus trouxe consigo além das mortes, alterações no modo de vida dos
seres humanos em todo planeta, o mundo parou em quarentena com a necessidade do
isolamento social. A utilização do petróleo como combustível e fonte
energética sofreu uma redução drástica, com isso, a produção reduziu a extração
e as vendas caíram muito.
A Arábia Saudita
tentou no final de 2019 alertar os demais países produtores sobre a necessidade
de redução da extração e produção de petróleo, uma vez que o movimento aéreo e
o consumo seriam afetados em todo planeta. Porém, os russos não aceitaram tal proposta,
mantendo-se assim o nível alto de produção nas bacias petrolíferas do Oriente
Médio. Como os sauditas
haviam previsto, os preços caíram vertiginosamente, chegando ao ponto
inimaginável de assistirmos os preços do barril de petróleo West Texas
Intermediate (WTI), óleo do tipo leve, que é negociado na Bolsa de
Nova York e é referência para os preços nos EUA ficarem negativos.
Ou seja, o
vendedor estava pagando para o comprador levar seu produto. Por trás disso
estão tecnicalidades das operações do mercado futuro de petróleo, os brutais
efeitos da crise de demanda provocada pela covid-19 e também os
acordos nem sempre exitosos de reduzir a produção envolvendo os países da OPEP+ (grupo
formado pela OPEP e outros onze países produtores liderados pela Rússia) e contrações
do chamado grupo America+2 (EUA, Canadá, Brasil, Colômbia, Noruega e
Reino Unido).
Além deste
problema, outro surgiu e expôs os problemas de funcionamento do mercado de
petróleo, principalmente na relação entre o mundo físico e o mundo financeiro.
Os detentores dos contratos do mercado futuro no qual os compradores assumem
hoje o compromisso de comprar petróleo no futuro, a um preço pré-estabelecido
com vencimento em maio, optaram por não receber o petróleo que tinham direito
em função da escassez de estoque para armazena-lo.
Isso ocorreu
porque esses contratos venceram no dia 21 de abril em condições muito
desfavoráveis para os compradores. Dada a redução da capacidade de estoques, a
oferta mundial mesmo com os cortes de produção anunciados pela Opep+― continua
num patamar muito acima tanto da demanda por petróleo, como da necessidade de
processamento nas refinarias.
A alternativa
que restou para os operadores financeiros foi aceitar os preços negativos, minimizando
assim suas perdas com as obrigações contratuais do mês de maio. Portanto, o que
ficou negativo na verdade foi o preço de trocar o contrato vendido por
comprado, e não os próprios barris físicos do petróleo. Uma das contradições
entre o mundo financeiro e o mundo físico é essa: os contratos open
interest em que as transações ainda não foram completadas (antes da data do
vencimento) envolvem volumes muitas vezes maiores que o volume físico
transacionado diariamente, o que mostra como os preços do petróleo são
determinados principalmente por fatores financeiros.
Esse desastre do
mercado futuro abalou os mercados de ações. Empresas de petróleo foram
especialmente penalizadas e algumas tiveram perdas enormes em seu valor de
mercado. Algumas empresas médias do setor passam a ser alvos de aquisições
hostis, o que pode indicar uma nova onda de fusões e aquisições envolvendo,
inclusive, grandes empresas estatais, fundos soberanos e fundos abutres.
Petróleo WTI cai 140% e tem preço negativo pela 1ª vez na história
Quem se
aproveitou desse cenário foram os chineses que aumentaram suas importações de
petróleo recompondo suas reservas estratégicas. Apesar das refinarias chinesas,
principalmente as estatais, trabalharem com contratos de longo prazo e, por
isso, não poderem substituir facilmente os fornecedores, o país se prepara para
uma retomada do mercado de derivados no médio prazo e, ao mesmo tempo, auxilia
a manutenção dos preços em patamares mais baixos no curtíssimo prazo.
Nos EUA, a
depressão prolongada dos preços já provoca uma reação do sistema financeiro que
começa a tomar o controle de petrolíferas que ficaram em extrema fragilidade
financeira. Desde a queda dos preços de 2015, pequenos e médios produtores
americanos do Shale gas e Tight oil aproveitaram as baixas
taxas de juros e aumentaram seu endividamento, acreditando que a queda dos
preços daquele ano seria temporária. As financeiras agora procuram manter a
garantia dos fluxos de caixa dessas empresas, embora desprezem os investimentos
necessários para a manutenção da produção física. A médio prazo, isso pode
significar a destruição permanente das chances de retomada de produção, já que
essas operações de exploração precisam manter uma pressão mínima em seus
reservatórios para que eles continuem produzindo.
No Brasil, essa
onda ainda não afetou a produção da Petrobrás, entretanto, como exportamos combustíveis,
percebemos que os preços do Diesel e Gasolina caíram cerca de 10% nas bombas de
combustíveis da região sudeste. Porém, não percebemos nenhuma preocupação do governo
brasileiro em ter uma estratégia para a pós pandemia no que se refere a compra
de petróleo.
Obs: Alguns dados extraídos do Instituto de
Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep).
Autor:
Rafael Moia Filho: Escritor, Blogger e Graduado em Gestão Pública.
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