Os brasileiros comemoraram o Globo de Ouro dado a Fernanda Torres, eleita a melhor atriz de filme dramático por sua atuação em "Ainda Estou Aqui". Sobraram buzinaços na madrugada das metrópoles, como se fosse uma vitória da seleção na Copa do Mundo. Carecemos de heróis e quando algum desponta temos mesmo é que festejar. Sem precisar levantar cadeira, Datena no SBT sentenciou que a artista "Tomou o lugar de Bolsonaro, se tornou um mito!"
Se o
homem é "mito", tenho lá minhas suspeições. Quanto a Fernandinha, as
estatísticas comprovam: foram 310 mil consultas à biografia da eleita no
Wikipédia, e mais de 3 milhões de espectadores que viram sua performance nas
telas. Quem não assistiu, correu para ver a maior bilheteria do cinema nacional
pós-pandemia.
A direita procurou amenizar a conquista. Houve quem adjetivasse Fernanda de
"nepobaby" - uma criança favorecida pelos pais famosos e com
influência nos meios teatrais e televisivos. O nepotismo na dramaturgia, criado
como ofensa, não produziu efeitos negativos. A unanimidade do país reconhece o
talento da atriz, assim como o mundo. Não é o primeiro prêmio que Fernanda
Torres ganhou em nível internacional. Há quase 40 anos, o júri de Cannes
presidido por Sidney Pollack já a havia consagrado com uma estatueta pelo seu
desempenho no filme "Eu sei que vou te amar", de Arnaldo Jabor.
A imprensa global, de fato, foi apanhada de surpresa. Nenhum cronista especializado poderia supor que Fernanda ganhasse de pesos-pesados de Hollywood - incluindo Kate Winslet, Nicole Kidman e Angelina Jolie.
Fernanda já havia destacado que a produção pode ajudar a nação a superar a polarização política recente. O filme não é sobre a esquerda ou a guerrilha contra a ditadura. É sobre uma família. Todo mundo tem uma família com pai, mãe e irmãos. Na primeira página do romance "Ana Karenina", Tolstói abre dizendo que todas as famílias são iguais. Só se diferenciam nas tragédias.
É evidente que existe na narrativa uma outra dimensão, a do momento histórico. "Ainda Estou Aqui" relembra, para quem viveu a ditadura. Mostra para os que nasceram após a redemocratização, os horrores de um Estado de exceção. Em regimes autoritários ninguém está livre do arbítrio. A história da persistência de Eunice em denunciar a morte do marido contada de forma não panfletária, emociona e ensina. No momento, o país está investigando uma tentativa de golpe ocorrida há apenas dois anos. O plano articulado previa o assassinato do presidente Lula, do vice Geraldo Alckmin e do ministro Alexandre de Moraes, então presidente do Tribunal Superior Eleitoral.
A democracia é o melhor dos regimes, mas precisa ser amada. Como uma amante, mais que a matriz como quer o Lula. Ainda na terça-feira, Mark Zuckerberg, presidente da Meta (Facebook, Instagram e WhatsApp), anunciou o fim do programa da checagem de fato e a redução de filtros que automaticamente retiram certos conteúdos das plataformas digitais. A decisão é muito boa para os negócios da Meta. Quanto mais polêmicas provoquem as mensagens divulgadas, mais cliques, mais publicidade e mais dinheiro. Significa, permitir que não haja censura prévia a discursos racistas, misóginos, fascistas, contra o direito das minorias, das mulheres. Contra a democracia amada.
A liberdade de expressão é um direito fundamental. Espalhar nas redes sociais que vacina desenvolve Aids, em plena pandemia, não é direito de ninguém.
Defendem
os expoentes do Vale do Silício que a invenção de Gutenberg com os tipos
moveis, proporcionou a maior circulação de ideias e, dois séculos depois,
aconteceu a Revolução Industrial. Como lembra Yuval Harari, nesse período o
continente europeu foi infestado de mentiras e teses conspiratórias que
incentivaram as piores guerras religiosas e caças às bruxas.
Autor: Zarcillo Barbosa – Jornalista, Articulista do Jornal da Cidade de Bauru.
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