País começa a ser um clássico no mundo
de como morrem as democracias e de como suas instituições vão se deteriorando
numa cadeia infernal.
Wilson Witzel, afastado pelo STF do governo do Rio de Janeiro por corrupção.Antonio Lacerda - EFE
O que está acontecendo com o Brasil, que
aparece aos olhos do mundo não como uma potência mundial, mas como um novo
Titanic que cada dia vai rachando politicamente, com efeitos econômicos
perversos que estão afogando os mais fracos?
A nova podridão que aparece no Rio de
Janeiro, com novos e graves escândalos de corrupção política —que já envolvem
quatro governadores consecutivos— e as ferozes intrigas de poder que vão
surgindo, está colocando de joelhos um dos Estados mais importantes do país.
Sua capital sempre foi uma vitrine mundial de beleza e um objeto de desejo do
turismo global.
E tudo parece cada dia mais grave
porque, das entranhas dos casos de corrupção, surge desta vez o roubo de
dinheiro destinado à luta contra a epidemia. Mais do que uma onda de corrupção
política e empresarial, tudo parece indicar que estamos diante de uma luta
feroz com vistas às eleições presidenciais de 2022 e a uma possível reeleição
de Bolsonaro.
Enquanto o chefe de Estado ameaça “dar
porrada” na cara dos jornalistas que o interrogam sobre os supostos escândalos
de sua família, em todo o país há uma luta entre os diferentes poderes, que
agem cada dia mais pelas costas da sociedade em guerras internas.
Sempre foi dito que o Brasil, o quinto
maior país do mundo, coração econômico da América Latina, estava destinado a
exercer um papel importante entre as demais potências mundiais. Lá de fora
olhavam com surpresa e admiração o desenvolvimento econômico e cultural do
país, que foi ganhando a simpatia mundial.
Hoje o céu do astro brasileiro começa a
escurecer. Parece mais um país abandonado à própria sorte, já que a corrupção e
a pequenez de seus dirigentes evidenciam o câncer que o devora por dentro do
poder, paralisando o ímpeto que começava a ter dentro e fora de suas
fronteiras.
Em meio a essa guerra entre os poderes e
às ameaças de golpes de Estado enquanto todas as instituições se deterioram, os
graves e atávicos problemas que este país nunca soube resolver — como a violência,
o racismo e a escandalosa distribuição de renda—, a cada sete horas uma mulher
é assassinada. A maioria dessas mulheres são negras ou pardas.
O Brasil começa a ser um clássico no
mundo de como morrem as democracias e de como suas instituições vão se
deteriorando numa cadeia infernal.
E agora que o mundo inteiro está em emergência
por causa da pandemia, e quando existe mais necessidade de que os poderes dos
Estados sejam fortes e capazes de fazer frente à emergência, o Brasil vai
afundando cada dia com a descoberta de novas tramas de poder e lutas internas.
Daí a urgência para que as forças da
sociedade e da oposição —a um Governo cada vez mais atropelado pelas inoperância de seus governantes e suas mesquinhas ambições— sejam capazes de
salvar um país cuja colaboração no xadrez mundial se torna cada dia mais
importante dentro e fora do continente.
O Brasil não é outro país bananeiro da
América do Sul. Tem vocação de influência na política global, cada vez mais
envolvida no retrocesso dos valores de liberdade e defesa dos direitos humanos,
no qual a pandemia está abrindo novas lacunas de exclusão.
O país precisa com urgência de uma
Justiça menos politizada e de uma política menos judicializada, num cenário
onde cada uma das instituições do Estado possa manter sua independência e agir
para o bem de toda a comunidade. O que vemos hoje é um país cada vez mais
sujeito a uma política com “p” minúsculo voltada a manter e ampliar seus
privilégios, dando as costas a uma sociedade cada dia mais perplexa e
desiludida.
Se um dia o mundo olhou até com inveja
para o desenvolvimento econômico e social do Brasil, hoje o país corre o risco
de se ver cada vez mais distante dos centros onde se forja o poder mundial. Uma
mesa da qual o país se afasta devido à quebra de seus melhores valores,
enquanto se desvanecem para os mais pobres as esperanças que os resgatavam de
seu inferno de escravidões passadas.
Que os políticos e juízes, em vez de
pensar em eleições e reeleições num puro jogo de poder, e em vez de trabalhar
para conseguir mais privilégios que escandalizam as pessoas comuns, que têm que
se sacrificar para poder comer, sejam capazes de uma renovação, algo que se
torna mais urgente e vital cada dia que passa e a cada novo escândalo que surge
de suas próprias entranhas.
O Brasil verdadeiro, o de suas tantas
riquezas materiais e espirituais acumuladas através dos séculos, necessita hoje
com urgência de novos líderes e estadistas que possam fazer renascer sua
verdadeira identidade dos escombros de tanta indignidade institucional.
Autor:
Juan Arias – El País.
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