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7 de fevereiro de 2025

A educação face ao alarme ecológico!

Educar não é encher uma vasilha vazia, mas acender uma luz na mente - Foto do Arquivo Pessoal.

Por mais que haja negacionistas, não se pode contestar o fato de que a Terra e a humanidade mudaram. Em primeiro lugar, é dado como certa a constatação de que um planeta pequeno e com bens e serviços (recursos) limitados como a Terra não suporta um projeto de desenvolvimento/crescimento ilimitado, o motor teórico e prático que pôs em marcha toda a modernidade. É a conhecida Sobrecarga da Terra (The Earth Overshoot).

O DeepSeek chinês, a mais avançada de todas as plataformas e de livre acesso, anunciou a “insustentabilidade humana e a obsolescência histórica do neoliberalismo do modelo econômico ocidental”. Ele está destinado a desaparecer, por mais que prolongue a agonia com violências, agressões e guerras. Tal anúncio deixou apavorados os donos das grandes plataformas que de um momento ao outro, ao todo, perderam um trilhão de dólares.

Em outras palavras: a Terra, tida como um super organismo vivo, sentindo-se agredida sistematicamente pela forma como os ocidentais decidiram se relacionar com a Terra e a natureza, nos últimos três séculos, explorando-a ao máximo em vista de uma ilimitada acumulação de riqueza material privada e feita mediante a mais feroz competição, está reagindo com cada vez mais frequência. Envia sinais como uma gama enorme de vírus, de bactérias, o último mais universal, o coronavírus, eventos extremos como severas secas, avassaladoras inundações, erosão da biodiversidade e, ultimamente, com incêndios, inaugurando, além do vigente antropoceno e do necroceno, uma nova era geológica, talvez a mais perigosa, o piroceno (a era do piros em grego, do fogo).

Mas a reação mais sensível e violenta feita por Gaia é o aquecimento global. Não estamos indo ao encontro dele. Já nos encontramos dentro dele. O que se havia acordado pelo Acordo de Paris de 2015 de minorar ao máximo a emissão de gases de efeito estufa para que não chegássemos até 2030 a 1,5 °C não foi respeitado. A data foi antecipada. O ano 2024 foi o mais quente da história conhecida, chegando a 1,55 °C como média e em alguns lugares até a 2 °C ou mais.

Cientistas reconhecem: a ciência chegou tarde demais. Ela não pode mais fazer retroceder esse aquecimento. No máximo, pode advertir a vinda dos eventos extremos e mitigar os efeitos danosos. Nem precisamos mais da ciência para fazer esta constatação: por todas as partes ocorrem eventos extremos, fazendo-nos perceber que o planeta Terra perdeu seu equilíbrio e está buscando um outro. Este mais aquecido, pode assolar grande parte da biosfera e dizimar milhões de pessoas humanas que não conseguem adaptar-se a um clima mais quente.

Como sair desta crise planetária? Não vemos outro caminho realístico senão inaugurar um outro paradigma na relação para com a natureza e a Terra viva: buscar viver aquele valor presente em todas as culturas. Sobre isso, dediquei dois livros, um deles, A busca da justa medida: Como equilibrar o Planeta Terra, sobre o quanto extrair da natureza para nossa subsistência e o quanto preservá-la para que possa se regenerar e continuar a oferecer-nos o que precisamos para viver.

Se o paradigma dominante era o do dominus, o ser humano senhor e dono da natureza, não se sentindo parte dela e nos levou a atual crise sistêmica, agora se impõe aquilo que o bom senso e a própria biologia nos tem ensinado: o frater (o irmão e a irmã). Todos os seres vivos possuem o mesmo código genético de base como Watson e Krick o demonstraram nos anos 50 quando identificaram a fórmula como se constrói a vida, o que nos faz, objetivamente, irmãs e irmãs uns dos outros.

Tal paradigma teria o condão de criar uma consciência coletiva de que devemos nos tratar, entre nós humanos e com todos os demais seres da natureza, de fato como irmãos e irmãs. O cuidado, a cooperação, a solidariedade, a compaixão e o amor constituiriam as bases desta nova forma de habitar o planeta Terra. Evitaríamos os riscos de autodestruição e criaríamos as condições para a continuidade de nossa vida sobre este planeta. Caso contrário, poderemos conhecer o caminho já percorrido pelos dinossauros, que há 67 milhões de anos não conseguiram se adaptar às mudanças da Terra e desapareceram definitivamente.

É dentro deste contexto que se faz urgente enriquecer a educação com o valor do cuidado, com a ética da solidariedade, com o sentimento de amorosidade para com todos os seres e iniciação à espiritualidade natural. Como asseverava Hannah Arendt: podemos nos informar durante toda a vida sem nunca nos educar. Hoje temos que nos educar de forma adequada às mudanças que estão ocorrendo. Não é ter um cabeça cheia com todo tipo de informação, mas uma cabeça bem feita. Educar não é encher uma vasilha vazia, mas acender uma luz na mente.

Como nos adverte a Carta da Terra: “Como nunca antes na história, o destino comum nos conclama a um novo começo. Isso exige uma nova mente e um novo coração”. Vale dizer: assumir que a Terra é viva e a nossa Grande Mãe; resgatar os direitos do coração: o laço de amorosidade para com todos os seres e superar o seu uso utilitarista, pois cada um possui um valor em si. Enriquecer a razão intelectual, tão desenvolvida na modernidade com a sensibilidade do coração que nos faz realmente sentirmo-nos irmãos e irmãs uns dos outros com o imperativo ético de guardar e cuidar da herança sagrada que é a Terra, nossa única Casa Comum.

Entre outros valores quero enfatizar um normalmente esquecido: recuperar a espiritualidade natural. Ela não é uma derivação das religiões, antes estas bebem desta fonte que é mais originária. A espiritualidade natural pertence à natureza humana como a inteligência, a vontade, o poder e a libido. A inteligência natural se expressa pelo amor que não exclui ninguém, pela solidariedade, pelo laço afetivo para com todos os seres, pela compaixão para com os que sofrem. Esta espiritualidade deve estar presente na escola, desde a mais tenra infância. Assim se formarão não consumidores e usuários dos meios tecnológicos, mas cidadãos conscientes, críticos, sensíveis, profundamente humanitários.

Autor: Leonardo Boff teólogo, filósofo, escritor. É autor de: A busca pela justa medida: o pescador ambicioso e o peixe encantado, Vozes 2022. Publicado no site Brasil de Fato.

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