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1 de janeiro de 2023

Regulamentação do lobby chega ao Senado. Há motivos para celebrar?

Muito preconceito e incompreensão envolvem o debate acerca da regulamentação do lobby no Brasil, que se arrasta por três décadas. O texto aprovado na última semana, no Plenário da Câmara dos Deputados, tem causado forte reação. De um lado, há os profissionais de Relações Institucionais e Governamentais que defendiam uma regulamentação pouco robusta e sem burocracia. Do outro lado, organizações da sociedade civil, que demandavam maior robustez, expressam maior incentivo à transparência, integridade e acesso.

 Essa é a hora para aprovar a regulamentação do lobby no Brasil e as organizações da civil têm um papel essencial neste processo. Foto de Freepik.

Independentemente dos argumentos em disputa, houve avanço nessa discussão. Jamais um projeto de lei versando sobre esse tema foi encaminhado ao Senado. Em 2018, após ter recebido parecer da deputada federal Cristiane Brasil (PTB-RJ), o PL 1202/07 entrou e saiu da pauta do Plenário da Câmara dos Deputados diversas vezes. Caiu no esquecimento.

Quem acompanha o desenrolar desse processo, há de concordar comigo que o texto aprovado recentemente é muito superior ao substitutivo aglutinativo global de Cristiane Brasil.

Quero oferecer ao leitor um ponto de vista diferente do apresentado até agora pela mídia. Sim, o projeto tem lacunas e poderia ser muito melhor. No entanto, ele traz avanços substanciais que poderão contribuir muito para incrementar a transparência do processo decisório.

Até o presente momento, sociedade civil e mercado não possuem acesso a informações sobre quem está falando com quem, sobre o quê e quando. A única forma de conhecer os interesses em jogo é buscar saber quem participou das audiências e consultas públicas.

Sendo assim, ter acesso não só à agenda dos agentes públicos, como também às interações que tiveram com agentes privados, é um passo importante para trazer mais transparência para o processo decisório, garantir o controle mútuo entre os grupos de interesse, diminuindo assim a assimetria informacional.

O ideal seria que, tanto agentes públicos quanto agentes privados, registrassem as interações e que o sistema de registro “cruzasse” essas informações. Seria ideal, também, a inclusão dos encontros informais entre agentes públicos e privados. Além disso, que todos os documentos trocados, durante a interação, fossem disponibilizados para consulta. Esses pontos ainda poderão ser adicionados no Senado Federal.

O texto aprovado possibilita que os representantes de interesse se credenciem junto aos órgãos e entidades do Poder Público. Apesar de não ser obrigatório, o credenciamento é uma demanda antiga, tanto de profissionais de relações institucionais e governamentais, quanto de ativistas que sofrem cotidianamente ao serem impedidos de entrar no Congresso Nacional e com longas filas. O credenciamento voluntário é uma medida que tem potencial para diminuir a assimetria informacional entre grupos de interesses mais e menos poderosos, já que os mais poderosos, muitas vezes, possuem credenciais de jornalista ou são agraciados com credenciais concedidas pelos gabinetes.

O projeto que será avaliado pelos senadores foi capaz de driblar um dos grandes desafios da regulamentação do lobby: definir quem é ou não é lobista. Ao lançar mão da autodeclaração, o legislador se imiscuiu da responsabilidade de aferir a veracidade das informações fornecidas pelo representante profissional de interesses. Tal projeto impede qualquer tipo de reserva de mercado, uma vez que o exercício da representação em caráter profissional não requer formação acadêmica específica, associação a órgão ou entidade, onerosidade, mandato expresso, contrato de trabalho ou de prestação de serviços com o titular do interesse representado, objeto social, estatuto ou finalidade institucional específicos no ato constitutivo da pessoa jurídica.

Por último, gostaria de ressaltar que o texto aprovado pelo Plenário da Câmara dos Deputados, em seu artigo 7º, insere uma cláusula de quarentena ao agente público, proibindo-o de exercer representação profissional de interesses nos doze meses subsequentes que deixar de ocupar cargo, emprego ou função pública. Eis aqui, mais uma medida que diminui a assimetria informacional entre os grupos de interesse.

Devido a esses argumentos, escolho olhar também para os pontos positivos que o projeto enviado ao Senado apresenta e, por isso, acredito que há motivos para celebrar!

Autora: Andréa Oliveira Gozetto Possui pós-doutorado em Administração Pública e Governo (FGV/Eaesp), doutorado em Ciências Sociais (Unicamp), mestrado em Sociologia Política (Unesp-Araraquara) e bacharelado em Ciências Sociais (UFSCar). Publicado no Site Congresso em Foco.

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