Depois que as eleições terminaram e o governo Bolsonaro havia torrado bilhões com auxílios para tentar em vão comprar votos no afã de se reeleger, o novo governo eleito fez as negociações com o Congresso Nacional do montante total de R$ 168 bilhões com teto de gastos ampliado para R$ 145 bilhões. Com isso, a PEC da Transição foi finalmente aprovada na Câmara dos Deputados formalmente incluída no Orçamento para 2023.
A aprovação se constituiu na prática na primeira vitória do futuro de governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) justamente por viabilizar o retorno de programas sociais, outrora excluídos pelo teto de gastos, que além de serem promessas de campanha, pretendem remediar situações de calamidade pública como a volta do Brasil ao mapa da fome com cerca de 33 milhões efetivamente sem ter o que comer e outras 125 milhões de pessoas em situação de insegurança alimentar.
No entanto, a grande mídia nacional esqueceu de noticiar a emergência do combate à fome que incide, inclusive, sobre a economia do país, e preferiram direcionar os leitores para os bilhões de reais que serão gastos por fora do sacrossanto “teto de gastos” estabelecido durante o governo Temer, à toque de caixa.
Com o objetivo de argumentações mentirosas que apontam para “rombos no orçamento” e “quebra do equilíbrio fiscal” para atacar a volta dos programas sociais mediante a PEC da Transição, muitos analistas e pseudo economistas começaram a arrancar os cabelos e fazer previsões dignas de Nostradamus sobre fatos que sequer aconteceram. Deixando obviamente de lado todas as mazelas ocorridas em quatro anos de gestão de Guedes/Bolsonaro.
O rombo financeiro improdutivo do país é superior a 20% do PIB e eles estão fazendo um escândalo porque Lula quer assegurar 1,5% ou 2% do PIB para responder a uma situação absolutamente catastrófica. Como permitir que 33 milhões de seres humanos permaneçam passando fome? Isso é um crime. Um governo que tem sob seu comando um país que está entre os principais produtores de alimentos do planeta e deixa o povo passando fome está praticando prevaricação. É criminoso, uma vez que está na Constituição a garantia do direito à alimentação básica.
A PEC da Transição foi aprovada na Câmara dos Deputados após dois acordos, um no Senado que a reduziu para R$ 145 bilhões, e outro na Câmara que prevê a validade do orçamento apenas para 2023. Ainda assim permitirá o retorno do Bolsa Família a R$ 600 mensais, mais o adicional de R$ 150 por criança de até seis anos, além da recomposição de outros programas sociais, como o Farmácia Popular e a política de valorização do salário mínimo que podem, além de resolver problemas imediatos da população mais vulnerável, dinamizar a base da economia.
Esses que se arvoram com relação ao equilíbrio fiscal, arrancando cabelos, nunca se preocuparam com a sonegação fiscal que é gigantesca, principalmente entre os empresários mais ricos do país. Quando alguém consegue implantar 168 lojas às custas de sonegação fiscal ou um jogador que não recolhe impostos, mas compra helicópteros de luxo, esses analistas nunca ficam indignados. Bastou Lula apontar para a fome do nosso povo para que eles reclamassem: “meu Deus, e como fica o equilíbrio fiscal?”
A evasão fiscal em 2021 foi de cerca de R$ 570 bilhões, ou 6% do PIB. Em outras palavras são 6% do PIB nas mãos daqueles que não pagam impostos, e simplesmente evaporam do país. Sim, porque no Brasil quem mais paga impostos são os pobres, através do consumo. Os assalariados, como eu e você, pagam impostos que descontaram na folha. Já a evasão fiscal é essencialmente uma prática dos chamados ‘mercados’ e que curiosamente se chamam assim apesar de serem essencialmente grupos financeiros.
As isenções fiscais, que não são dadas para os pobres e a classe média, mas para esses grandes grupos financeiros, representam outros R$ 500 bilhões. São impostos que eles deveriam pagar e não estão pagando. Além disso, desde 1995, lucros e dividendos distribuídos são isentos de impostos, o que significa que praticamente todo o andar de cima da sociedade está liberado de impostos – e esta ‘liberação’ vai tranquilamente para 10% do PIB ou mais.
Sem contar que muitos bilhões são alocados em paraísos fiscais nas chamadas offshores. O próprio Ministro da Fazenda de Bolsonaro, Paulo Guedes, tem U$ 8,7 milhões lá fora com o nome fantasma de Dreadnoughts.
A população brasileira hoje paga R$ 130 no botijão de gás. O custo desse botijão mais do que dobrou, não aumentou o custo de extração e distribuição. Esse dinheiro então vai para onde? Simplesmente esse dinheiro é retirado das famílias e repassado para os donos das ações da Petrobrás, da Vale, da Samarco, enfim, de todos esses grupos. Isso inclui grupos nacionais e em particular grupos internacionais. Se olharmos para o setor agrícola, a maior parte dos lucros vai para 4 grupos: ADM, Bunge, Cargill e Dreyfus, que são ‘simpaticamente’ chamados de ABCD. Esses grupos detêm 80% do sistema de grãos do mundo.
Em resumo, se somarmos os R$ 600 bilhões de evasão fiscal, com os R$ 500 bilhões de subvenções, mais o que se retira de juros, que está acima de 10% do PIB, vemos um “orçamento” muito superior ao que se brigou na PEC destinado a setores improdutivos e que causou tanta “comoção” no tal mercado financeiro e nos pseudo economistas da TV.
Por que a distribuição de renda via programas sociais funcionou na fase Lula e não gerou inflação? Como chegar a esse equilíbrio?
Através de 149 programas sociais, entre os quais o Bolsa Família, Luz para Todos, a elevação de salário mínimo etc., gerou-se mais capacidade de compra na base da sociedade, o que gerou demanda para as empresas, o que aumentou o emprego. Paralelamente aumentou o consumo das famílias e pela dinamização da economia também retornou dinheiro para o Estado através do imposto sobre o consumo. Foi assim que a roda girou.
O país está parado. Em 2022 estamos no mesmo nível que 2012. O último ano que o país cresceu foi 2013, cerca de 3%. Durante os governos Lula e Dilma crescemos a uma média de 3,8% ao ano, mesmo com a crise mundial de 2008. A quebradeira se deu quando os bancos e os diversos grupos, com a Lava Jato e a paralisia pra Petrobrás, empenharam a guerra que acompanhamos para derrubar o sistema distributivo, e não apenas a Dilma. Derrubaram um sistema que funcionava e que agora a população quis de volta.
De lá pra cá, a economia estagnou. As famílias estão endividadas, as empresas não têm para quem vender e os juros das empresas são impagáveis e dificultam o desenvolvimento do setor produtivo. E para piorar, com o teto de gastos, o próprio Estado suspendeu as suas atividades de investimento. Além disso, no Brasil chama-se educação e saúde de ‘gasto’. No resto do mundo isso é ‘investimento’. Então paralisaram os processos de políticas sociais, de saúde, educação e segurança, como parou também todo o sistema ligado às infraestruturas. Aumentou o desemprego e a dívida pública.
Por puro preconceito, ódio aos partidos de esquerda que predominantemente priorizam a sociedade, combate à fome e ao desemprego, as nossas elites financeiras, mercado e parte da mídia reacionária tentam através de desinformação e mentiras colocar em pânico o cidadão comum. Durante a gestão pífia de Bolsonaro estavam calados assistindo há distribuição de terras indígenas para latifundiários, a destruição das nossas matas por madeireiros e garimpeiros ilegais, além de verem pessoas na fila por pedaços de ossos, num cenário macabro incondizente com o tamanho e a força do nosso país.
Autor:
Rafael Moia Filho – Escritor, Blogger, Analista Político e Graduado em Gestão
Pública.
Fontes: Revista Fórum.
2 comentários:
Texto incrível, acesso a informações importantíssimas explicadas de maneira clara e objetiva. Obrigada!
Excelente texto, Rafael Moia. Muitos dados desconhecidos dos brasileiros, evitados pela mídia e ignorados pela parcela mais rica. O que fizeram com o país em quatro anos é desumano e será um longo caminho para se reparar isso. Mas, com a intenção de trabalho duro e conciliação do novo governo, certamente venceremos.
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