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1 de fevereiro de 2022

Até quando a mídia vai ignorar a espionagem do gabinete do ódio?

Por várias vezes insisti que, a despeito dos disparates estapafúrdios (pra copiar a fala do JN no famoso editorial contra Jair) e estúpidos do presidente incomível, a turma que o cerca, que o alimenta, que mantém sua base alucinada e alucinógena não é estúpida. Tem um projeto de poder bem desenhado. Bem definido. Bem delineado. E não mede esforços para alcançar o propósito.

Em excelente reportagem no dia 17/01, o jornalista Jamil Chade denunciou que o gabinete do ódio do governo Bolsonaro está interessado em uma poderosa tecnologia espiã desenvolvida por empresas de Israel.

De acordo com a matéria, um assessor ligado ao vereador Carlos Bolsonaro conversou com as empresas Dark Matter e Polus Tech.

A reportagem informa ainda que “as negociações com as duas empresas, que forneceriam ao grupo controlado por Carlos Bolsonaro uma ferramenta para espionar opositores, jornalistas e críticos em ano eleitoral ainda não foram finalizadas”.

A denúncia é grave, e Jamil Chade recebeu várias ameaças. Mas essa intenção dos Bolsonaros não é recente.

Vamos lembrar dois outros momentos, no ano passado, quando o assunto espionagem veio à tona.

Em março de 2021, uma comitiva do governo federal com 10 pessoas foi até Israel para testar um spray contra Covid – cujos estudos eram bem preliminares. O assunto nunca andou adiante e foi questionado – sem explicações – durante a CPI da Covid.

A comitiva, bancada por dinheiro público, não contribuiu para nada no tocante à doença.

Estiveram na viagem, entre outros: o deputado federal Eduardo Bolsonaro, que não é médico nem pesquisador na área; o então ministro das Comunicações, Fabio Wajngarten, que também não é médico – e, até onde eu sei, testar medicamento para Covid não é exatamente atribuição da área de comunicação; Filipe Martins, aquele assessor polêmico da presidência da República que fazia gesto neonazista.

Muito bem, no depoimento à CPI, o ex-ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, não conseguiu explicar os motivos da viagem e nem a presença da comitiva tão grande e de pessoas que efetivamente não fariam diferença na testagem de um spray contra Covid.

Trocando em miúdos: a viagem com o fim alegado não se justificou e não se justifica. O que efetivamente motivou aquela viagem com aquela comitiva ao país então governado por Benjamin Netanyahu, famoso pelo desenvolvimento de tecnologias espiãs? Algum dia saberemos.

Em maio de 2021, o vereador Carlos Bolsonaro (aquele filho de Jair que todo mundo acha que é abilolado por causa das coisas aparentemente sem sentido que escreve nas redes sociais), articulador do gabinete do ódio, se envolveu numa disputa com o alto comando militar do país para comprar um programa de espionagem, o Pegasus, que possibilita o monitoramento de empresas e pessoas.

À época, segundo informou o UOL, Carluxo, como é conhecido, tinha o firme propósito de diminuir o poder militar na área de inteligência do governo. Ou seja, ele quer ter o domínio de uma área importantíssima, e não parece ser o Tonho da Lua como muitos acham.

E agora, neste ano, já vemos nova tentativa de compra de tecnologia para espionar jornalistas, empresas, desafetos…

A imprensa que gasta editorial pra criar a absurdamente falsa simetria entre Lula e Bolsonaro ou que acusa Lula de fazer mal à democracia brasileira deveria se mobilizar para expor com força esse rol de intenções nada republicano. Para não repetir o que fez em 2018, mais especificamente no segundo turno da eleição, quando a jornalista Patrícia Campos Mello fez um excelente trabalho de investigação e mostrou a tática do impulsionamento de fake news a favor de Bolsonaro.

Era o segundo turno, e talvez desse tempo de reverter o apoio a Jair, o incomível. Não fizeram nada, a repercussão foi ínfima, ignoraram solenemente as denúncias e a enxurrada de fake news porque a ideia era tirar o PT do poder. Deu no que deu.

A denúncia feita pelo jornalista Jamil Chade é grave e deveria nos deixar a todos que, de alguma forma, nos expomos, com o cabelo em pé. Não estamos lidando com imbecis, e talvez se a imprensa deixar de naturalizar certas coisas e começar a usar os nomes corretos – grupos de extrema-direita – o processo e as manobras possam ficar mais claras para as batalhas intensas que virão neste ano. 


Autora: Eliara Santana é jornalista e doutora em Linguística pela PUC-MG.

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