Aquela criança sentada na soleira, tristonha e sem
perspectiva alguma, era o reflexo da noite escura que dominava o horizonte
naquela pobre cidade do interior do Brasil. O frio característico das noites de
Natal europeu era substituído pelo clima tropical quente e abafado que sufocava
a todos em suas casas.
Autor: Rafael Moia Filho - Escritor, Blogger e Gestor Público.
A criança olhava para o céu escuro como se quisesse
encontrar uma luminosa estrela cadente ou como querendo avistar algo além das árvores
intransponíveis que faziam a guarda oficial da sua cidade. A noite apenas
estava começando, os sonhos daquela pobre criança movimentavam suas fantasias e
lhe traziam à mente um tempo de felicidade e alegria que jamais haviam saído de
seus melhores sonhos.
Os pais, trabalhadores humildes do campo nada podiam fazer e
sequer ousavam prometer algo que sabiam ser impossível de cumprir. Nenhum tio
afortunado, nenhum padrinho na cidade, nada com que pudesse sonhar naquela
noite especial de Natal.
Então, por que sonhar na soleira do alpendre de madeira
desgastado pela corrosão do tempo? Isso ninguém poderia responder por aquela
criança. Nas ruas um tímido movimento de pessoas apressadas, querendo chegar
com seus pacotes pequenos, geralmente alimentos para a ceia que estava por vir.
Poucas surpresas, nenhuma loucura e muito cansaço apenas naquelas pernas e
braços que carregavam as últimas compras do ano.
Um misto de alivio e comiseração confundia os corações
daquela gente nos minutos que antecediam o Natal. O aniversário de Jesus era o
motivo da festa, o aniversariante estava ali no meio de todos e sua presença
aquecia o corpo surrado daquelas pobres almas sofridas.
A criança triste, cansada e sonolenta não conseguia mais
suportar o peso de seu pobre corpo mirrado, suas pálpebras pendiam para baixo
de forma suave, mas constante. O sono era o alimento para seus sonhos e
fantasias, acordar seria muito mais difícil do que necessariamente dormir. Ao
fechar os olhos esqueceria a pobreza, as dificuldades financeiras de seus pais,
os desencantos e tantos desencontros que a vida já havia lhe reservado naqueles
poucos anos de vida.
Ser pobre á algo com que ele e todos seus vizinhos
aceitavam, resignados, entendiam, porém o que incomodava era a falta de
quaisquer perspectivas para o futuro. Sonhos eram apenas e tão somente sonhos
para aquele garoto mirrado da periferia daquela pequena cidade.
Mas como que por milagre um carro parou na porta de sua
casa, não era ninguém conhecido, não era alguém que seus pais aguardavam, até
por que a família não esperava por ninguém àquela hora, aliás, não tinham
amizades com ninguém que tivesse um carro tão bonito como aquele parado
misteriosamente a frente do seu portão.
Do carro desceram duas crianças bem vestidas com alguns
pacotes nas mãos e os entregaram ao casal que os atendeu, disseram que se
tratava de uma ajuda e que os brinquedos eram para o garoto que sempre estava
sentado naquela porta, como se assim esperasse ganhar um presente a qualquer
momento.
Em seguida, chamada por seus pais, as crianças entraram
naquele lindo automóvel e foram distribuir mais felicidades e sonhos para
outras famílias vizinhas. Os olhos do menino brilharam mais do que a última
estrela do céu naquela noite quente. Por alguns instantes, por um momento fugaz
ele percebeu que havia esperança, que havia motivos para acreditar em Deus, em
Papai Noel ou simplesmente na magia do natal.
Arte: SlidePlayer
Autor: Rafael Moia Filho - Escritor, Blogger e Gestor Público.
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