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2 de dezembro de 2019

O estelionato do fim da crise!

Desde 2014, quando a crise se instala definitivamente na economia brasileira, todo final de ano os aparelhos ideológicos da burguesia são mobilizados para difundir a ideia de que a recuperação está a caminho. Seguindo a orientação do Ministério da Economia, os sacerdotes da ordem divulgam previsões otimistas sobre as perspectivas da economia, com o incondicional apoio da grande mídia.
Ao contrário de um exercício objetivo, baseado em dados reais sobre os condicionantes do nível de atividade e os mecanismos que determinam o crescimento econômico, trata-se de uma operação meramente ideológica destinada a alimentar a ilusão de que a crise está sendo superada. Quem lê os boletins oficiais não apreende nada sobre a realidade concreta.
A falsidade é travestida de uma pseudossofisticada modelagem matemática, cujo elemento mágico é a “confiança”, categoria arbitrária, que teria o condão de reviver o espírito empreendedor dos capitalistas e reativar a economia. A mensagem é sempre a mesma: “no próximo ano, a economia deslancha e o sufoco termina”.
No entanto, nos últimos seis anos, as estimativas sobre o desempenho do PIB ficaram sempre muito distantes da realidade. Os erros foram grosseiros. A gravidade da recessão foi invariavelmente subestimada. Em 2018, por exemplo, a previsão era de que a economia brasileira cresceria 2,5% em 2019, mas, mesmo com a liberação de quase R$ 45 bilhões do FGTS dos trabalhadores, o PIB mal atingirá aumento de 1%, completando o sexto ano de estagnação — o pior desempenho da história do Brasil. Nesse ritmo, o país precisaria de 37 anos para recuperar a renda per capita de 2013.
Nem por isso os ventríloquos do capital perderam a arrogância. Na mitologia neoliberal, todo equívoco de análise pode sempre ser atribuído à necessidade de diminuir ainda mais a presença do Estado e dos sindicatos na economia. Para 2020, a Secretaria de Política Econômica do Ministério da Economia acaba de divulgar a estimativa de um crescimento de 2,32%. E, para os dois anos seguintes, uma expansão de 2,5% ao ano. Em alvoroço, mais uma vez, economistas e jornalistas replicam o número oficial e comemoram antecipadamente o fim da crise.
No entanto, ainda que a liberação de recursos do FGTS, a redução das taxas de juros e os efeitos expansionistas dos gastos associados à eleição municipal possam dar um fôlego temporário ao consumo das famílias e a investimentos marginais de rentistas que buscam aplicações mais rentáveis, sobretudo na construção civil, não há nenhum elemento objetivo que permita imaginar que a estagnação tenha sido superada.
De um lado, a política econômica, baseada no arrocho salarial, na austeridade fiscal, na liberalização da economia e no crescente endividamento das famílias, asfixia o mercado interno. De outro, as incertezas provocadas pelo agravamento da crise capitalista e pela instabilidade política continuam deprimindo as expectativas de investimentos das grandes corporações.
Na ausência de mecanismos endógenos de expansão da demanda agregada, a recuperação da economia brasileira dependerá fundamentalmente das exportações. Entretanto, a perspectiva de evolução do comércio internacional não é nada favorável, sobretudo quando se considera a deterioração da situação econômica de nossos principais parceiros comerciais — China, Estados Unidos, União Europeia e Argentina -, os quais representam quase 2/3 das vendas externas do país.
Nessas circunstâncias, mais realista (e honesto) seria supor que, em 2020, como nos três anos anteriores, o PIB oscilará entre 0,5 a 1,5% ao ano. A modesta expansão do consumo das famílias e dos investimentos da construção civil deve ser compensada pela contração da demanda externa.
Consciente de que a suposta superação da crise carece de qualquer fundamento, o Ministério da Economia alerta que a confirmação das previsões depende do aprofundamento das reformas liberais. É um embuste. Depois de dizerem que a solução da crise dependia da flexibilização das leis trabalhistas, do congelamento por vinte anos da política social e da reforma da previdência — que não tiveram qualquer efeito anticíclico -, as autoridades econômicas voltam a insistir na mentira de que a recuperação depende do avanço das privatizações, da aprovação da PEC federativa e do sucesso da reforma administrativa.
Como não há espaço para a crítica e o debate democrático, não há limite para as sandices repetidas pela propaganda neoliberal com ares de grande autoridade teórica nos meios de comunicação. Não existe nenhuma base analítica ou empírica para supor que o mágico “choque de confiança” provocado pelas reformas liberais possa conduzir à recuperação do crescimento e do emprego.
O objetivo do neoliberalismo selvagem nada tem a ver com a melhoria das condições de vida da população. Trata-se pura e simplesmente de aumentar a taxa de exploração do trabalho; transferir recursos fiscais para o setor privado; fomentar a mercantilização das políticas públicas; impulsionar a privatização do patrimônio público; franquear o mercado nacional à operação do capital internacional; desregulamentar a economia, eliminando qualquer tipo de obstáculo à operação dos capitais; e garantir a sustentabilidade intertemporal da dívida pública.
No capitalismo da reversão neocolonial, o mito do crescimento como panaceia não tem mais nenhuma aderência à realidade. Sem ter o que oferecer à população, às classes dominantes só resta a manipulação deslavada da opinião pública e a repressão violenta do protesto social.

Autor: Contrapoder – Publicado no Correio da Cidadania.

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