Lei é como
elefante numa loja de cristais no que diz respeito a costumes e afetos!
Arte: Ricardo Cammarota - Folhapress
Não sou simpático à lei da Escola
sem Partido. Sou professor há 22 anos. Ela pode virar um belo sistema randômico
de censura. Pais de alunos são imprevisíveis. Um dia posso estar
falando de darwinismo e um pai evangélico considerar que estou pregando ateísmo.
Um dia posso estar dizendo que a espécie humana reproduziu e sobreviveu porque
a maioria dela é heterossexual e algum aluno filho de um casal gay pode me
acusar de homofobia.
Você duvida? Se sim é porque anda
alienado da realidade ridícula que o mundo está vivendo. As mídias sociais
tornaram o ressentimento uma categoria política de ação. Os ressentidos
perderam a vergonha na cara. Não gosto de leis, não confio em juízes,
promotores ou procuradores.
O Ministério Público com frequência
nos considera cidadãos hipossuficientes e decide processar você por descrever a
relação entre peso e massa na lei da gravidade numa aula —e essa lei não
respeitaria as sensibilidades de pessoas vulneráveis
psicologicamente devido ao maior peso delas.
Minha oposição à lei da Escola
sem Partido não é porque eu não saiba que grande parte dos professores prega
marxismo e similares em sala de aula. Prega sim. E a universidade não é um
espaço de debate livre de ideias. Isso é um fetiche, para não dizer diretamente
que é uma mentira deslavada.
A universidade é um espaço de
truculência na gestão, na sala de aula, nos colegiados, no movimento
estudantil. Lobbies ideológicos ou não dilaceram
as universidades quase as levando à inércia produtiva —principalmente nas
“humanas”.
Quem discordar da cartilha de esquerda
é “fascista”. Minha oposição à Escola sem Partido é porque ela é uma lei. Sei. Ficou confuso? Vou repetir: minha
oposição à Escola sem Partido é porque ela é uma lei. Com ela, aumentaríamos o
mercado para advogados e a justificativa pra mais gasto com o
Poder Judiciário.
Quem a defende parece não entender que
lei em matéria de costumes é como um elefante em loja de cristais. Outra área
em que lei é como um elefante em loja de cristais é no campo dos afetos.
Meu argumento, ao contrário do que
podem pensar inteligentinhos de direita e de esquerda, é profundamente
conservador, no sentido que o conceito tem na filosofia britânica a partir do
século 19 o conceito sem a palavra surge no final do 18 com Edmund Burke
(1729-1797), a palavra surge na França nos primeiros anos do século 19, segundo
o historiador das ideias Russel Kirk (1918-1994).
No sentido filosófico, e não no debate
empobrecidos das militâncias, ser conservador é ser cético em matéria de
invenções políticas, econômicas, sociais ou jurídicas. Um temperamento conservador, como
diria Michael Oakeshott (1901-1990), filósofo conservador britânico fundamental
para o assunto, desconfia da fúria “racionalista” de se inventar, por exemplo,
leis que interfiram sobre hábitos e costumes (estes, sim, pérolas para um
cético em política).
Aliás, pouco se sabe entre nós sobre o
que é, no sentido erudito e conceitual, ser conservador. Qual a razão de não
sabermos? Pergunte aos professores e coordenadores de escolas e universidades.
A bibliografia escolhida por eles é, na imensa maioria das vezes, uma
pregação em si.
Alunos de escola, de graduação e
pós-graduação, constantemente, são boicotados em sua intenção de conhecer
outros títulos que não seja a cartilha com Marx e seus avatares. A lei da Escola sem Partido é uma
solução ruim para um problema real. A crítica a ela, sem reconhecer que sua
motivação é justificada, presta um enorme desserviço ao debate.
Com isso não quero dizer que
professores marxistas de história mentindo pura e simplesmente ou restringindo
o acesso a múltiplas “narrativas” (como é chique falar agora) sejam a
principal questão no Brasil de hoje em dia.
Existem muitas outras, como economia,
corrupção, violência urbana, e outras mais. Mas, a formação educacional
ideologicamente enviesada, por exemplo, faz muita gente “educada” abraçar
movimentos como o Lula Livre, achando lindo.
A educação piorou muito depois que os
professores resolveram pregar em sala de aula em vez de ensinar rios e capitais
dos estados e países. Simples assim. Mas aumentar o mercado jurídico no
país é um engano grave. Já somos presas demais do crescente
lobby jurídico para não ver isso.
Autor:
Luiz Felipe Pondé
Escritor
e ensaísta, autor de “Dez Mandamentos” e “Marketing Existencial”. É doutor em
filosofia pela USP.
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