Nove crimes impunes de Jair Bolsonaro (Foto Divulgação).
Condenação por golpe não apaga legado de mortes e crimes ignorados na pandemia de Covid-19. O mais nefasto político da História do Brasil acaba condenado a 27 anos de prisão por liderar uma tentativa de golpe de Estado para conservar o poder em suas mãos. O julgamento de Jair Bolsonaro e comparsas constitui o segundo maior avanço civilizatório brasileiro desde que o país se tornou uma República – o primeiro é a Constituição de 1988. Mas não se pode afirmar que é feita justiça completa em relação ao tirano: seus crimes durante a pandemia de Covid-19 estão e deverão permanecer impunes. A gravidade deles é absoluta. Se não punidos, que pelo menos não sejam esquecidos.
A pusilanimidade do então procurador-geral da República, Augusto Aras, relegou às gavetas um relatório portentoso elaborado pela Comissão Parlamentar de Inquérito que investigou os atos e as omissões do Governo Federal durante a pandemia. Faz pouquíssimo tempo, e tudo parece já destinado ao esquecimento.
A imagem símbolo de Bolsonaro na pandemia pode ser a do cruel imitador da pessoa sem ar, a sufocar em um hospital público por falta de oxigênio. Ou seria a da ridícula coreografia com uma caixa de cloroquina nas mãos em torno de uma ema? Que tal a do causador de aglomerações sem máscara e promotor de “motociatas”? A do combatente contra a vacina, por outro lado, tem potencial de ser a mais forte.
O monstruoso e o ridículo personificam-se em Bolsonaro.
Afora a tristeza pelas mortes com as quais contribuiu, restam sem denúncia formal nove crimes a ele atribuídos, apurados pela CPI, que Augusto Aras tratou de ignorar. Vamos a eles:
- Prevaricação — omissão ou atraso em proceder quando tinha o dever funcional de fazê-lo, favorecendo terceiros. A CPI apontou que Bolsonaro postergou decisões e deixou de agir para aquisição de vacinas ou medidas de proteção, favorecendo interesses políticos próprios ou evitando admitir a gravidade da pandemia.
- Charlatanismo — Bolsonaro promoveu e incentivou o uso de medicamentos sem eficácia comprovada contra a Covid-19, como cloroquina e ivermectina (“kit covid”), mesmo sabendo de estudos que refutavam sua eficácia.
- Epidemia com resultado de morte (art. 267 do Código Penal) — A CPI apontou que a negligência do Governo Federal em medidas sanitárias, a promoção de tratamentos ineficazes e a desinformação contribuíram para milhares de mortes evitáveis.
- Infração de medida sanitária preventiva (art. 268 do Código Penal) — desrespeito ou obstáculo a medidas sanitárias. Bolsonaro participou de aglomerações, minimizou o uso de máscaras e promoveu a abertura de comércio e escolas em desacordo com protocolos sanitários oficiais.
- Emprego irregular de verbas públicas — uso indevido de recursos públicos relacionados à pandemia. A CPI apontou indícios de irregularidades na compra de cloroquina, testes rápidos de eficácia duvidosa, respiradores e vacinas de forma superfaturada ou sem licitação adequada.
- Incitação ao crime (art. 286 do Código Penal) — Bolsonaro incentivou o descumprimento de medidas de isolamento e do uso de máscara, desobedecendo leis e decretos estaduais e municipais, além de convocar manifestações contrárias às restrições.
- Falsificação de documento particular — A CPI levantou casos de documentos oficiais ou notas técnicas apresentados para justificar ações do governo que não correspondiam à realidade, como relatórios sobre medicamentos ou vacinas.
- Crimes de responsabilidade — infrações que justificariam procedimento de impeachment (violação de direito social, incompatibilidade com a dignidade do cargo etc.). O relatório qualificou diversas condutas de Bolsonaro como violação de deveres constitucionais, justificando potencial impedimento.
- Crimes contra a humanidade — atos generalizados ou sistemáticos contra a população, incluindo extermínio, perseguição ou outros atos desumanos. A CPI recomendou encaminhamento de provas ao Tribunal Penal Internacional, apontando que a condução da pandemia pelo governo Bolsonaro poderia se enquadrar em crimes contra a humanidade, devido à combinação de omissões, desinformação e incentivo a condutas arriscadas para a população.
Autor: Paulo Henrique Arantes - Jornalista há quase quatro décadas, é autor do livro "Retratos da Destruição: Flashes dos Anos em que Jair Bolsonaro Tentou Acabar com o Brasil". Editor da newsletter Noticiário Comentado paulohenriquearantes.substack.com