As figuras de linguagem são ferramentas para
aprimorar a comunicação. Dizer sem ser explícito facilita o entendimento, pois
o sarcasmo, o exagero, a comparação, a ironia, etc., darão o tom do que
verdadeiramente está sendo dito. A fria letra impressa possui pouca importância
se não for lida com um mínimo de conhecimento das regras não escritas nesse
tipo de interlocução. O leitor deverá conhecer um pouco do escritor para saber
o que ele diz, e o escritor precisa dar pistas para que o leitor o descubra. Na
ausência desses fatores, restará apena o império da ignorância. Algumas figuras
são por demais carimbadas e viram lugares-comuns - os clichês que devem ser
evitados. Muita repetição faz perder a ênfase e torna o recurso enfadonho, daí
a condenação. Fácil falar, difícil fazer, porque ninguém anda com o ibope de
cada palavra ou expressão para saber se a frequência de seu uso é tão grande
que grudou feito chiclete (ou clichê, sempre confundi as duas palavras). Parece
uma coleção de vocábulos a ser preenchida que nunca é completada.
Nos álbuns antigos havia fotografias, imagens e desenhos a serem preenchidos com figurinhas aos pedaços. Uma ou outra página jamais seria completada porque o pedaço que faltava era a carimbada, figurinha que quase ninguém via, era impressa em outra cor e significava o recebimento de algum prêmio. Nos tempos em que vendi jornais pelas ruas de Campinas, havia "fregueses" que pediam também as figurinhas. Pacotes amarelos com três exemplares lá dentro, se me lembro bem. Os mais entendidos afirmavam que nos maços com dezenas de pacotinhos, vez ou outra, substituíam um deles por outro que continha a tal carimbada. Afinal de contas, os promotores dos álbuns precisavam de credibilidade e dar alguns prêmios. E não é que haver um pacotinho com cor ligeiramente diferente significava que tinha uma carimbada lá dentro? Um dos assíduos colecionadores reclamava que nunca ganhara prêmios. Pois, quando vi um dos pacotes diferentes nos maços que eu pegava para vender, selecionei-o para ele que ganhou um conjunto de canetinhas Sylvapen com seis cores. Quem viveu essa experiência sabe o que isso significa
(https://vejasp.abril.com.br/coluna/memoria/as-memoraveis-canetinhas-sylvapen).
Cativei ainda mais o freguês.
Falamos da comunicação escrita, mas a verbal a
antecede. A oralidade é a base da literatura, como afirmou Ailton Krenak, pois
toda história a ser registrada foi contada antes por alguém. Ouçamos as
perguntas e suas respostas. As dúvidas, as contradições, as explicações. A
resposta que se espera pode vir por um telefonema, uma mensagem de texto, um
e-mail. Ela não chega, mas os boatos a ela associados abundam. Sei dos
escolhidos, das figuras previamente carimbadas (ou tarimbadas) e do preterido.
E isso porque estou com os olhos e ouvidos atentos. Nossos sentidos são cinco e
nos põem em comunicação com o mundo. Não raras vezes, narramos paradoxos e contradições
para realçá-los, feito as figuras de linguagem. O som do silêncio, as luzes da
escuridão, claros ocultos, sabores insípidos, silêncio ensurdecedor, cheiros
inodoros... A liberdade poética brinca com a cegueira da visão, como fez Raul
Seixas. Por que não falam mais comigo?
Autor: Prof Adilson Roberto Gonçalves – Publicado no Blog dos Três Parágrafos.
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