Seguidores

1 de março de 2025

Mudança de direção!

Reler escritos antigos leva a refletir sobre o seu conteúdo. Opiniões mudam com o tempo. A base moral é sempre a mesma, é apenas aperfeiçoada, lapidada. A pessoa não muda e, por isso, julgo ser difícil que mudanças drásticas nessa base moral aconteçam. As surpresas que nos acontecem são fruto de não conhecermos a fundo a índole alheia - talvez nem entendamos por completo a nossa própria. Por isso é bom explicar para si o que vai pela mente. Eu uso da escrita há um bom tempo, não apenas o que compartilho e público, mas aquilo que segue em cadernos de capa dura, feito a intimidade de um diário que nunca ninguém lerá. Gosto de rever os escritos antigos para explicar para mim o que mudou, se tenho justificativa para uma ou outra posição que seja criticada, ou se é fruto do transcurso esperado no desenvolvimento humano. Lauro Péricles Gonçalves faleceu nesta semana e foram muitas as homenagens e lembranças a sua vida e a seu legado, em particular à valorização da cultura campineira. Meu respeito aqui é devido à obra realizada pelo ex-prefeito de Campinas. A morte não levará à mínima alteração da posição política em relação ao que ele defendia, alguns disparates recentes, talvez já decorrentes de um entendimento não amplo das circunstâncias. O mundo muda e nós somos o mundo.

Outros que mudam constantemente de direção são os veículos em trânsito. Porém, motoristas têm aversão à seta indicadora dessa mudança de direção. Ao menos em Campinas é assim. Certa vez escrevi uma crônica abordando essa situação, intitulada "A sociedade secreta campineira", publicada na revista Escritores, de setembro de 2015, editada pelo saudoso Carlos de Moraes Júnior (https://adilson3paragrafos.blogspot.com/2019/03/ciclos-culturais.html). Desta vez, para combater a irritação no trânsito, procurei classificar os colegas condutores em quatro categorias básicas. Há os indecisos, que até dão seta, mas desistem de entrar na via para a qual sinalizaram. Os despistadores são os que dão seta para um lado e entram para o outro, com diferentes velocidades para dar ênfase à confusão. Estava procurando uma palavra melhor para os retardados, aqueles que dão a seta somente depois que fizeram a conversão ou mudaram de faixa. Por mim, os omissos ou reservados são a maioria, são todos os motoristas que não dão seta de jeito nenhum, economizando as lampadinhas e aumentando as chances de acidentes.

Não sei se me levará a mudar a direção de minha crítica, mas quanto à ativista e pesquisadora Etiene Martins, que não aplaude o filme Ainda estou aqui, lamento, porém entendo sua posição ao ver em Walter Salles apenas um herdeiro de escravocratas. Só quem carrega na pele a marca da discriminação, do racismo, do preconceito, da opressão, dos crimes sofridos pode saber e dizer o que está passando ao ver a lembrança e discussão social em relação às duas décadas de ditadura em comparação com os quase quatro séculos de escravidão no país. O artigo dela no jornal Estado de Minas causou bastante ruído, creio que por quem não tem lugar de fala para criticá-la. Na Folha de S. Paulo desta sexta-feira, 21/2, ela escreve novamente, convidando a assistirem ao curso que ministra em que discute o jornalismo e as relações étnico-raciais na Universidade Federal Fluminense. A direção do filme é dele, não há o que mudar. Também não posso mudar o rumo do que foi minha origem e minha trajetória. Lamento que não estamos juntos aplaudindo o sucesso do filme e de Fernanda Torres, mas conte comigo para aplaudir outros filmes, os movimentos sociais e as ações políticas que tratem dos escravizados e do racismo aqui instituído.

Autor: Professor Adilson Roberto Gonçalves – Publicado no Blog Três Parágrafos.

Nenhum comentário: