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5 de setembro de 2023

Serendipidade versus Inteligência Artificial!

Carrapicho no microscópio eletrônico com ganchos nas pontas (de Amaral et al. UFRGS); em baixo, o velcro revela semelhança com camadas de ganchos e laços.

Serendipidade é a forma de descoberta “ao acaso” por uma mente preparada para percebê-la. A mesma coisa aconteceu para muitas pessoas, mas apenas ela, naquele momento, a detectou.

Ser bem-informado não dá cultura, nem inteligência. Conhecimento é informação interpretada pelo cérebro e, juntos, são combustíveis para a criatividade movimentar o mundo. Muitas coisas acontecem ao redor, mas as pessoas não percebem, não estão preparadas para captar a mensagem da natureza.

Descobrir o que se procura é busca bem-sucedida, mas encontrar algo que não se procura pode parecer “acaso” e não é, pois a mente deve estar preparada para esta percepção acontecer e isto se chama “serendipidade”.

Exemplo clássico de serendipidade foi a descoberta da penicilina que mudou a humanidade. A serendipidade é a capacidade de nossos radares naturais captarem o que pode ser importante como se fosse “sorte”. Outras descobertas por serendipidade: anestesia, borracha vulcanizada, dinamite, fotografia, implantes, insulina, iodo, náilon, oxigênio, raios x, sucrilhos, teflon, velcro e a gravidade.

Cabeça vazia

Frases horríveis ditas por muitos: “Cabeça vazia, morada do capeta!” ou “Ócio é a usina do diabo”. São justificativas para atribuir mil atividades às crianças e adolescentes, para que não tenham tempo para pensar, refletir, criar e questionar. Quem trabalha muito, não tem tempo para ser criativo.

A sociedade exige solução de problemas práticos, imediatos e financeiros. Aí fica difícil ter tempo para refletir, divagar e exercitar a serendipidade. Sem criatividade, tudo se copiará e mal. Dizer que tudo se copia, é frase de plagiador clássico. Não é a sorte que favorece as mentes preparadas, mas o conhecimento e a capacidade criativa e reflexiva.

A vida acadêmica “oferecia” várias situações para a serendipidade. Hoje está cada vez mais raro, pois as pessoas têm vários empregos e preocupações visto que a aposentadoria integral acabou, estabilidade também, além de outros benefícios. O uso da inteligência artificial pode diminuir a ocorrência da serendipidade, pois a sobrevivência se impõe! Mas, o genial Stephen Hawking comparou o computador como um cérebro de minhoca.

Exemplo: O velcro

Quando o engenheiro George de Mestral andou pelas montanhas da Suíça, sua terra natal, suas calças ficaram cheias de carrapicho. Ao tirá-los ficou intrigado como se aderiam aos tecidos e no microscópio, observou que os espinhentos tinham ganchos em suas extremidades que laçavam os fios do tecido.

Na hora, já pensou em duas fitas, uma com ganchos de náilon reforçados por poliéster resistentes a umidade e produtos químicos, e outra com laços de fios para os ganchos colar coisas. Anos depois, lançou os primeiros fechos de velcro. Do francês, “vel” veio de veludo e “cro” veio de “crochet” ou laços.

O velcro é usado em milhares de aplicações. Em quantas pessoas, os carrapichos já haviam grudados nas roupas? A busca maluca de soluções práticas, levaria o engenheiro a inventar uma limitada forma de tirar carrapicho das roupas e jamais teríamos o velcro.

Reflexões finais

1. Mentes preparadas tendem a ser mais criativas e perspicazes. Descobertas por “acidente” ou “acaso” não existem. O que existe é sagacidade, fino senso de observação e grande capacidade de traduzir o que vivemos. As sementes das grandes descobertas estão flutuando em torno de nós, mas só criam raízes nas mentes bem-preparadas.

2. A dependência da inteligência artificial para fazer coisas e solucionar problemas, levaria o engenheiro a uma forma de tirar o carrapicho das roupas, mas não criaria o velcro a partir desta observação. Se substituir a capacidade de raciocinar e criar, a IA pode atrapalhar a serendipidade! Reflita sobre isto.

Autor: Professor Alberto Consolaro – Publicado no JC de Bauru. 

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