E se o jovem jornalista não seguir a moda desinformada da cobertura midiática e lançar nova moda: a recuperação dos valores da civilização?
Em O Globo, o jovem comentarista garante que o candidato da ultradireita da Argentina, Javier Milei, é diferente da extrema direita bolsonarista. Isso porque “defende um estado mínimo, com foco apenas na Justiça e na segurança. Bolsonaro jamais foi um defensor destas ideias mais libertárias”.
O fantástico mundo das ideologias! O que o pensamento miliciano defende:
O fim de qualquer forma de regulação na economia. Assim como o pensamento libertário,
O pagamento por todos os serviços públicos, que passarão a ser oferecidos pelo setor privado. Assim como o pensamento libertário.
O controle total da segurança pela milícia. O libertário propõe que o Estado atue apenas na Justiça e na segurança. Mas, se não houver regulação, onde ficará a segurança jurídica? Sem regulação, nada é ilegal, nem construção de casas sem alvará, nem distribuição de gás sem autorização, nem a gatonet. Não haverá mais diferenças entre atividade formal e criminosa, simplesmente porque o fim da regulação acaba com a noção de crime econômico.
Em outras palavras, libertário é um miliciano que completou o curso médio.
Aliás, há outra diferença fundamental: ao que se saiba, até agora os milicianos não começaram a recorrer ao comércio de órgãos humanos e de crianças. Há um risco grande de começar a exercitar o ofício por influência dos libertários.
É possível que o jovem comentarista endosse esses princípios aberrantes? Provavelmente, não. Em outros temas, mostra uma razoável dose de boa índole. Mas o episódio demonstra o tragíco processo de construção da inteligência na mídia.
De uma maneira geral, a inteligência jornalística – entendido como a inteligência geral de uma redação – despencou assustadoramente desde o início do jornalismo de ódio inaugurado década e meia atrás. O comentarista, em questão, saiu correndo na frente para dizer algo “novo” sobre a discussão do momento – no caso, o ultradireitista Milei. Consultou o Google, viu o que saiu até agora sobre ele e tascou sua visão “diferenciada” sobre a questão. Não havia um pingo de inteligência analítica, de capacidade de correlação de fatos. Nem uma gota de inteligência sobre o processo de formação de uma Nação.
Um Estado civilizado depende de valores que estimulem a solidariedade, a busca de justiça, a busca do bem estar de todos seus cidadãos. A indústria está no cerne dos modernos estados nacionais pela necessidade de defender a produção e o emprego interno contra produtos de países mais avançados. Políticas sociais são essenciais para garantir a paz interna e a promoção da população. Educação obrigatória é essencial, inclusive, para o próprio desenvolvimento do mercado, ao oferecer mão de obra especializada.
O que as milícias e os libertários oferecem é o fim de todas as redes de proteção social, de todas as políticas de promoção social, de todo sentimento de solidariedade. É cada um por si, os mais fortes esmagando os mais fracos e a polícia para impedir a revolta de desempregados, vulneráveis e desprotegidos. Na economia, será o primado dos cartéis sobre as empresas menores, o esmagamento do consumidor pelo cartel. E polícia em quem ousar reclamar, assim como fazem milicianos.
O absolutismo monárquico acabou entre 1788 e 1799 com a revolução francesa. No século 19, um religioso dominicano, jornalista, educador, deputado, Jean Baptiste Henri Dominique Lacordaire, nascido em 1806, produziu a frase símbolo do novo período civilizatório: “Entre os fortes e fracos, entre ricos e pobres, entre senhor e servo é a liberdade que oprime e a lei que liberta”.
Que tal o jovem jornalista, em vez de seguir a moda
desinformada da cobertura midiática, lançar uma nova moda: a recuperação dos
valores eternos da civilização e um entendimento mínimo sobre o que é
democracia?
Autor: Luis Nassif – Publicado no Jornal GGN.
Nenhum comentário:
Postar um comentário