Temos ouvido falar aqui e nos EUA do Deep State e sua influência na política mundial. Vou tentar abordar alguns fatos que podem nos ajudar a entender essa abordagem.
Estado dentro do Estado, Estado profundo ou Estado paralelo são termos usados para descrever uma situação política que acontece quando um órgão interno de um determinado país (como as forças armadas, as agências de inteligência ou a polícia) passa a não mais responder à liderança civil. O termo, como muitos na política, deriva da língua grega (κράτος εν κράτει, kratos en kratei, adotado mais tarde para o latim como imperium in imperio ou o status in statu).
Theodore Roosevelt foi o 26ª presidente dos Estados Unidos da América. Governou aquele país de 1901 a 1909 – e legou-nos uma acusação terrível: “Por detrás do Governo ostensivo acha-se um Governo invisível, que não deve fidelidade nem reconhece qualquer responsabilidade perante o povo. Destruir este Governo invisível, dissolver esta maligna aliança entre negócios corruptos e política corrupta, há que ser a primeira tarefa de Estado. Este país pertence ao povo. Seus recursos, seus negócios, suas leis, suas instituições, deveriam ser utilizadas, mantidas ou alteradas somente da maneira que melhor atendesse o interesse coletivo”.
Mais de um século se passou. Adentramos um novo milênio. E ouvimos, pela voz do atual presidente norte-americano, Donald Trump, as seguintes – e igualmente amargas – palavras sobre este “Deep State”: “É uma estrutura global de poder responsável pelas decisões econômicas, que rouba nossa classe trabalhadora, despe nosso país de sua riqueza e transfere o dinheiro para os bolsos de um seleto grupo de grandes corporações e entidades políticas”.
Para aqueles que acompanham criticamente a política externa dos EUA e a geopolítica em geral, a ascensão de Jair Bolsonaro no Brasil dificilmente pareceria desprovida de interesse e - ainda mais importante - de influência do “Deep State” (Estado profundo) americano. Até agora, alguns links indiretos foram apontados, obviamente pela mídia independente, entre Bolsonaro e as táticas de propaganda e guerra psicológica relacionadas à CIA e outras agências ligadas ao Executivo dos EUA, geralmente ligadas a Wall Street e a interesses comerciais.
O candidato de extrema-direita que venceu as eleições no Brasil há dois anos, ainda que representado muitas vezes como um “outsider” na política, é deputado federal há décadas, representante de uma elite militar reacionária e, mais recentemente, de uma população pentecostal conservadora guiada por líderes carismáticos com enorme influência entre as classes média e baixa brasileiras. Eles simplesmente dizem ao rebanho em quem votar.
Desde sua posse Bolsonaro vem conclamando golpes, assassinatos políticos e repressão violenta contra minorias e os pobres há quase 30 anos. Ele não é um outsider, mas a mídia joga o jogo, tratando-o como se fosse “inimigo” da corrupção e do crime, quando na verdade a implementação de suas propostas significaria a legalização da violência de Estado e de outras formas nefastas de crime. Nenhuma delas nova ou "anti establishment", muito pelo contrário. Seus seguidores sentem-se fortalecidos desde o surgimento de sua candidatura, e vêm aumentando vertiginosamente em frequência os ataques a oponentes e minorias, muitas vezes com consequências fatais, como a morte, no dia da eleição, do professor de capoeira Moa de Katendê, importante figura da cultura afro-brasileira. A comunidade LGBT também tem sido alvo frequente de ataques.
Mesmo quando Bolsonaro, um militar da reserva, tenta parecer mais civilizado para ganhar mais votos do centro político, alguns de seus principais seguidores se mostram racistas amantes de armas e prontos para formar milícias paramilitares e atacar as favelas ao modo de Rodrigo Duterte, das Filipinas.
Além de pregar a violência e o uso liberado de armas de fogo, Bolsonaro mente para confundir seus interlocutores, ataca a grande mídia enquanto financia seu exército de Sites e Blogs bajuladores que o ajudam a disseminar Fake News. A intenção é mesmo confundir e tentar levar o cidadão comum a não ler nem ouvir ou ver as matérias críticas e investigativas.
A mídia conservadora de direita entre outros atores tradicionais de que trataremos abaixo tem responsabilidade num futuro já em curso, aliás, derramamento de sangue. A questão seria: qual o tamanho desta responsabilidade?
A revista The Economist - entre outros "suspeitos de sempre" da máquina de propaganda ocidental -, afirmou que os militares agiriam como uma "força moderadora" em um eventual governo de Bolsonaro. Um excelente artigo da revista Jacobin mostra que é exatamente o contrário ao analisar algumas das façanhas e assassinatos dos conselheiros militares de Bolsonaro no Haiti.
Eis aí um quadro digno de reflexão, porquanto resistente ao tempo. Somos uma humanidade perplexa, a padecer de males os mais absurdos em um planeta riquíssimo. Muito pouco da rotina dos povos faz algum sentido, se a olharmos com olhos de ver. Vivemos a desmoralização do escândalo, indo de uma crise a outra como se vai à padaria comprar pão.
Começamos a perder – se é que já não
perdemos – o que de mais importante um povo pode ter: condições de pensar com
serenidade sobre o que se passa e a partir daí definir juízos e
ações. Vemos as gerações passando e os mesmos debates sobre os mesmos
problemas se repetindo, iludindo os jovens e desiludindo os velhos.
Autor:
Rafael Moia Filho: Escritor, Blogger e Graduado em Gestão Pública.
Fontes: Es Hoje – Carta maior.
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