Quase todas as decisões adotadas pelo
presidente Jair Bolsonaro na condução da política externa deram em nada ou
impuseram severos prejuízos, sejam os de ordem econômica, sejam os danos à
imagem do Brasil no exterior.
O fiasco da diplomacia brasileira
observado neste ano era totalmente previsível porque o presidente da República
erra no básico e não emite qualquer sinal de que está disposto a aprender com
seus erros. Jair Bolsonaro crê que a relação entre as nações se estabelece por
meio da afinidade pessoal e ideológica entre chefes de Estado, e não pela
concertação dos interesses em jogo em uma complexa trama comercial e
geopolítica. Ou seja, o presidente Bolsonaro trata o que é um mero facilitador
na aproximação entre lideranças internacionais como princípio orientador de
suas ações.
A opção pelo alinhamento praticamente
automático ao presidente norte-americano, Donald Trump, parece ser a linha
mestra da política externa do governo Bolsonaro. Na visão do presidente, isso
implicaria resultados que nenhum outro governo antes dele conseguiu produzir,
como o ingresso do Brasil na Organização para Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OCDE) e a abertura do comércio entre os dois países. De fato, Donald
Trump apoiou a entrada do Brasil no chamado “clube dos ricos”, mas tratou-se de
um apoio vago, sem a definição de prazo ou condições para que o pleito do País
fosse de fato analisado. Na verdade, Trump optou por dar preferência aos
interesses argentinos no âmbito da OCDE, em detrimento dos brasileiros.
Quanto ao comércio entre Brasil e
Estados Unidos, a “proximidade” que haveria entre Bolsonaro e seu contraparte
norte-americano também não parece estar ajudando. A carne bovina brasileira
continua sob embargo e, em novo revés imposto ao País, Donald Trump decidiu
retomar a aplicação de tarifas sobre o aço e o alumínio provenientes do Brasil
e da Argentina, sob a alegação de que os dois países estariam praticando uma
“deliberada desvalorização de suas moedas a fim de prejudicar as empresas e os
trabalhadores dos Estados Unidos”. Sem atinar para a dimensão do problema, Jair
Bolsonaro está disposto a resolver a crise com um telefonema. “Se for o caso,
falo com Trump, tenho canal aberto”, disse o presidente.
Bolsonaro também tem trabalhado duro
para minar a posição de liderança do Brasil na América Latina. Evidente que as
dimensões do País, de sua população e a pujança da economia brasileira são os
fatores que pesam, e muito, na relação com os vizinhos. Mas o País teria muito
mais a ganhar caso Jair Bolsonaro pusesse os interesses do Estado acima de suas
predileções. Na Argentina, por exemplo, o presidente brasileiro manifestou
apoio à reeleição de Mauricio Macri, que foi derrotado pelo peronista Alberto
Fernández. A relação entre Bolsonaro e Fernández já começou estremecida, a bem
da verdade por erros que foram cometidos em ambos os lados da fronteira.
No Uruguai, o presidente Jair Bolsonaro
apostou na vitória de Luiz Lacalle Pou, que saiu vitorioso do pleito, mas não
sem antes recusar o apoio do presidente brasileiro, tido como “tóxico” em razão
de suas posições extremadas.
O ano diplomático também foi marcado
pelo amplo apoio dado pelo presidente Jair Bolsonaro à recondução do
primeiro-ministro israelense Binyamin Netanyahu, outro líder internacional de
quem o presidente brasileiro se julga próximo. Jair Bolsonaro chegou a prometer
a mudança do local da embaixada do Brasil em Israel, de Tel-Aviv para
Jerusalém, o que traria sérios abalos na relação comercial entre o País e as
nações árabes.
A nota positiva na condução da
diplomacia brasileira neste ano foi a recente mudança da visão do presidente
Bolsonaro em relação à China, cedendo ao pragmatismo. Já não era sem tempo o
despertar, dada a vibrante relação comercial com nosso principal parceiro.
A afinidade pessoal entre chefes de
Estado ajuda muito na fluidez das relações entre as nações. Entretanto, este
jamais deve ser o fio condutor da política externa de um país. Os riscos de uma
“diplomacia da camaradagem” são muito maiores do que os eventuais benefícios
que a proximidade entre os líderes, seja real ou imaginária, pode trazer.
Autor:
Notas & Informações, O Estado de S. Paulo.
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