Se nomear um
evangélico, tem de nomear um protestante, um mórmon, um batista, um pai de
santo, um pajé...
S.
Fenerek é homem justo, democrata, deseja igualdade para todos. Gosto de
conversar com ele sobre generalidades e dia desses, logo depois que o
presidente emitiu novo parecer fálico, para entender melhor o alcance de certas
ações corremos ao primeiro volume da História da Virilidade, organizada
por Jean Corbin, Jean Jacques Courtine e Georges Vigarello, editora Vozes, e
ali encontramos uma nota sobre Jacques de Fonteny (século 17), que escreveu uma
pastorinha, L’Eumorphopémie ou Le Beau Pastor, na qual o autor
imaginou um mundo de homens, exclusivamente de homossexuais apaixonados e
viris. Machos. Teria a ver?
Imaginamos
um seminário estilo Casa do Saber, mas fomos atraídos para outro assunto.
Porque o homem lá em cima é um repositório precioso, enciclopédico. Não é que
ele pensa em nomear um evangélico como ministro do Supremo? Nada com o
evangélico, desde que versado em leis, sábio, ponderado. Fenerek, o erudito de
Santa Adélia, ficou indignado.
“Como?
Somos ou não somos um país laico? Se nomear um evangélico tem de nomear um
protestante.”
Antes
que ele continuasse, acrescentei:
“E
um mórmon.”
“Tem
razão. E por que não também um batista?”
“E
um da Igreja Universal.”
“Sem
esquecer uma Testemunha de Jeová.”
“E
não pode faltar um espírita kardecista.”
“Deve
caber lá também um pentecostal.”
“E
um pai de santo.”
“Do
jeito que anda o Supremo vai precisar de muitos pais de santo.”
“E
alguém bahá’í.”
“Ponha
também um messiânico.”
“O
Messi também criou uma religião?”
“Nada
a ver, falo do culto.”
“Epa,
e o budismo?”
“Acrescente
o taoismo.”
“Também
o xintoísmo.”
“Ah!
E o umbandista.”
“Os
sikhs indianos.”
“E
um pajé.”
“Xi!
Se põe índio, o ministro do Meio Ambiente e o pessoal do agronegócio fazem
manifestação de rua.”
“Falta
alguém do judaísmo.”
“Se
entra um, vem também um islâmico, afinal democracia é democracia.”
“Já
colocamos alguém do Evangelho Quadrangular?”
“Tem
também a Igreja Deus e Amor.”
“E
o do candomblé.”
“O
da macumba.”
“Isso,
temos de ter cuidado para não nos acusarem de preconceituosos ou politicamente
incorretos.”
“Acabei
de me lembrar da Religião da Divina Sabedoria.”
“E
a das Treze Cruzes Sobre o Altar.”
“Há
igualmente a dos Adoradores da Verdadeira Bíblia.”
“Acabei
de me lembrar dos Seguidores de Mahavira.”
“Já
pusemos os brâmanes?”
“Não
esqueçamos os Seguidores do Barqueiro de Utnapishtim.”
De
repente, veio um silêncio. Nem S. Fenerek, o venerável, e eu nos lembrávamos de
mais religiões, apesar de sabermos que são milhares. E, portanto, os ministros
terão de ser milhares. E como o Supremo trata de Justiça, os ministros teriam
de saber leis, Constituição, etc. Ou não? Passariam a rezar, cada um orando
pelo seu deus, esperando que assim o País caminhe? Afinal, Deus está acima da
pátria. Será necessário construir centenas de edifícios que abriguem milhares
de religiosos-ministros e seus assessores. Epa, epa! Como dizem em Santa Adélia
e em Araraquara. E se um dos três filhos indicar o Queiroz, o milagroso das
finanças, para comandar e pagar os assessores?
Autor: Ignácio
de Loyola Brandão, O Estado de S. Paulo.
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