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11 de junho de 2019

A mente nos engana (e não nos damos conta)

Comece a perceber que o seu cérebro está cheio de armadilhas
As consequências de pensar depressa demais.
Foto: El País
Nem tudo é o que parece. Basta uma simples experiência para comprovar isso. Suponhamos que Steve seja uma pessoa selecionada ao acaso de uma amostra representativa. Um morador o descreve como alguém "muito tímido e retraído, sempre prestativo, mas pouco interessado nas pessoas ou no mundo real. De natureza disciplinada e metódica, precisa ordená-la e organizar tudo. Além disso, tem obsessão pelo detalhe". Talvez, a primeira resposta que nos venha à cabeça é que Steve seja bibliotecário? Afinal, parece reunir as qualidades típicas desses profissionais. No entanto, a resposta correta é agricultor. Nos países ocidentais, como os Estados Unidos, existe um bibliotecário para cada 20 agricultores. Se Steve foi escolhido aleatoriamente, é mais provável que ele cultive a terra. Nossa mente nos engana. Ou, melhor dizendo, pensar rápido nos engana.
Em 1974, os psicólogos Amos Tversky e Daniel Kahneman publicaram esse exercício na revista Science, abrindo terreno para toda uma corrente de pesquisa sobre como nossa mente funciona e as peças que ela nos prega. Kahneman ganhou o Prêmio Nobel de Economia em 2002 graças a esse trabalho (Tversky morrera alguns anos antes). Chegaram à conclusão de que temos duas formas de pensar, dois sistemas operacionais. O sistema 1, reativo, é ligado ao pensamento rápido e automático. Nele são formados os julgamentos e as ideias preestabelecidas. Nessa etapa também são processadas as decisões intuitivas e as do especialista, que depois de muitos anos de trabalho é capaz de reconhecer algo apenas batendo o olho. O sistema reativo é também o encarregado de responder quando uma pessoa está em pleno sequestro emocional, ou seja, quando vive uma emoção com muita intensidade, o que dificulta ver as coisas com clareza.
O sistema 2, ou consciente, está ligado ao pensamento lento, que precisa de tempo para elaborar a conclusão. É ativado quando a atenção é plena e se encarrega dos cálculos complexos e da concentração. Todos nós temos esses dois sistemas, mas o mais curioso é que o sistema 2 está normalmente em segundo plano. Como reconhece Kahneman em seu interessantíssimo livro Rápido e Devagar: Duas Formas de Pensar (Objetiva), nosso cérebro é preguiçoso por pura sobrevivência. Consome cerca de 20% da glicose e do oxigênio que estão em nosso corpo, apesar de representar menos 5% de sua massa. Para evitar um consumo excessivo, ativamos o modo automático, o sistema 1 ou reativo. Em outras palavras, respondemos e agimos segundo a primeira coisa que nos vem à cabeça, sem elaborar muito.
Esse fazer sem pensar nos leva a colocar rótulos nas pessoas que vemos ou que acabamos de conhecer. Nos deixamos arrastar por seu estilo na hora de vestir, por sua forma de ser, por sua tendência sexual e por tantos outros vieses inconscientes que evitam que tomemos decisões mais reflexivas e inteligentes. Diversas pesquisas indicam que as pessoas que se movem pelo sistema 1 costumam tomar decisões mais egoístas, mais superficiais e, claro, usam uma linguagem mais sexista.
Mas nem tudo está perdido. Temos a capacidade de evitar cair nos braços do sistema reativo ante o primeiro desafio que surja. A chave consiste em refletir antes de tomar uma decisão importante ou quando conhecemos alguém. No fundo, é despertar o sistema 2, prestar maior atenção.
 Por isso, não surpreende que muitas empresas de vanguarda, que buscam diversidade e inovação, capacitem seus funcionários sobre como evitar os vieses inconscientes. Podemos realizar esse trabalho nós mesmos levando em conta como o nosso cérebro funciona, sendo conscientes de que está cheio de armadilhas. Se aplicarmos esse aprendizado no exercício de Steve, valeria à pena perguntar se não existem agricultores meticulosos. Essa pergunta abriria novas possíveis respostas.

Autora: Pilar Jericó – Publicado no El País

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