Redes sociais. Foto Reprodução
Elas prejudicam a nossa paz de espírito
As plataformas sociodigitais operam na lógica da economia da atenção. Seu objetivo primário é fazer o usuário permanecer grudado nelas a maior quantidade de tempo possível. Atire a primeira pedra quem nunca entrou no Instagram e, depois de uma hora, parou e pensou: “Que diabos eu estou fazendo aqui”.
Além de ser um sumidouro de tempo, elas se tornaram um substituto para relações interpessoais reais e nos mantêm presos a tretas irrelevantes e sedentos por likes.
Elas fazem mal à democracia
As plataformas sociodigitais têm interesse objetivo na difusão de desinformação, na promoção do partidarismo cego e na ampliação da agressividade nos embates políticos. Tudo isso aumenta o “engajamento” dos usuários, que é o que elas buscam em primeiro lugar.
E não hesitam em jogar todo seu peso político e econômico para garantir que a internet continue uma terra ninguém. Usam, por exemplo, fake news para impedir a responsabilização pela difusão de fake news. Não por acaso, as big techs se tornaram grandes parceiras da extrema-direita.
Elas comprometem a nossa autonomia
Cada vez que entramos em uma dessas plataformas, nós nos tornamos matéria-prima para a coleta de dados, que são usados para induzir comportamentos e vendidos para terceiros.
A gigantesca massa de informações coletadas de cada usuário permite que os algoritmos apresentem os estímulos corretos para orientar sua ação – fazendo-nos desperdiçar mais tempo online, nos interessarmos por determinados produtos ou mesmo fazer escolhas políticas.
Sair das redes é também um passo para a reconquista de espaços de autonomia individual perdidos para as big techs.
Elas fazem mal à nossa inteligência
Nas plataformas, somos bombardeados com estímulos fáceis, de consumo imediato, que não exigem nenhum esforço intelectual e se sucedem sem deixar rastros.
Fofocas sobre famosos, fotos “comoventes” produzidas por IA, polêmicas de proveta, tudo isso se torna o centro de nossa dieta informacional.
Ao final de uma tarde de scrolling, estamos empanturrados de informação inútil, tão nauseados e mal alimentados quanto depois de nos enchermos de junkie food.
Elas fazem mal à verdade
As big techs e a extrema-direita aliada a elas dizem ser contra a regulação em nome da liberdade de expressão. É uma balela. Liberdade de expressão não é carta branca para espalhar mentiras e preconceitos ou incitar violência.
A liberdade de expressão, já diziam seus defensores liberais clássicos, deve ser ao público, permitindo escolhas mais bem fundamentadas graças à exposição a múltiplos pontos de vista.
E não é como se a expressão nas plataformas não fosse regulada. Ela é – só que pelas próprias big techs, em proveito de quem tem dinheiro para gastar com “impulsionamento” pago de conteúdos.
Elas fazem mal ao debate
Eu gosto de controvérsia e me esforço para não ser silenciado pelos consensos às vezes fáceis do nosso campo. Mas a boa controvérsia é aquela em que se esgrimem argumentos. Nas redes, é comum que o alarido das torcidas e a violência verbal lacradora substituam essa troca.
Além disso, tem gente que vive da treta – que “monetiza” seus canais com uma encenação de agressividade. Eu, não. Como não fujo da controvérsia, acabo me tornando alvo para esse tipo de manobra, com ataques baixos e mesmo formas de assédio. Eles ganham dinheiro e eu ganho só irritação.
Podemos, sim, viver sem elas (ou quase)
É verdade que o Instagram se tornou obrigatório para uma série de atividades, de espiar o cardápio de restaurantes a conferir se aquele médico que nos indicaram não é bolsonarista.
No meu caso, posso ter que conferir postagens de políticos por dever profissional.
Mas dá para limitar a isso (e mesmo entrar por meio de proxies). Não postar, não comentar, não comprar, entrar e sair sem dispersões.
E, em vez de perder tempo vendo um monte de besteiras, tomar uma cerveja com os amigos, ler um livro, ir ao cinema, passear no parque, pegar uma praia, brincar com as crianças ou com o gato, aprender a desenhar, jogar bola, enfim, viver.
A partir de agora:
· Não posto mais conteúdo novo em Facebook ou Instagram (apenas, no primeiro momento, anúncios de textos em outros espaços, como minhas postagens no Substack).
· Não leio mais mensagens diretas. Quem quiser falar comigo pode mandar e-mail.
· Apaguei os aplicativos do celular.
· Procuro ir direto para as páginas dos portais e blogs que costumo ler, em vez acessá-los pelas redes de Zuckerberg.
· Encontre-me no Substack (clique aqui)
Não, o
Substack não é o paraíso (virtual) na Terra. Mas não tem anúncios, tem menos
tretas e promete não vender dados dos usuários. Ao menos por enquanto, parecer
ser lugar para uma conversação mais saudável.
Autor:
Luis F. Miguel – Professor de ciência política da Universidade de Brasília
(UnB) e coordenador do Demodê - Grupo de Pesquisa sobre Democracia e
Desigualdades. Publicado no Diário do Centro do Mundo.