O Pequeno Príncipe e a Terra vista desde os anéis de Saturno como um ponto minúsculo no universo. (sondas Voyager 1 e Corsini 13).
Um leitor de 45 anos me pediu que escrevesse sobre a Terra redonda. Mas, você tem dúvida? E me disse que ainda se encanta e se espanta com a capa do “O pequeno príncipe” de Antoine de Saint-Exupéry. Por anos, fiquei com esta dívida no coração.
Na casa de minha saudosa mãe, vi uma cena incrível. Debaixo da janela ensolarada, o disco de vinil rodava e refletia na parede os raios solares, reproduzindo as linhas e faixas das músicas extraídas pela agulha diamantada. A fotografia guardo até hoje, como um tesouro afetivo de ambiente e época.
Quando me falaram que algumas pessoas acreditavam que a terra era um disco, a memória resgatou a imagem do vinil rodando, tocando e, ao mesmo tempo, iluminando a parede da sala. Imaginei, como seria demais a Terra ser um disco! Logo saí de minha viagem hipnótica de Terra plana e resgatei meu ceticismo em um fato muito explorado por Carl Sagan e que mudou a humanidade, junto com suas obras científicas e ficcionais.
Nasa
A sonda Voyager 1, depois de passar por Saturno, cumprindo seu destino final,
ia partir para o infinito do espaço sideral. Antes de seu sistema de câmeras
ser desligado para economizar energia, Carl Sagan, convenceu os diretores da
Nasa para que a sonda fizesse um "retrato em família do sistema
solar". A sonda deu uma volta em si mesmo e fez uma “selfie”,
enquadrando todo o percurso percorrido de 6 bilhões de km da Terra. Se o sol
queimasse os sensores fotográficos, não haveria prejuízo, já que seriam
desligados.
A foto foi icônica e mudou a forma de vermos o planeta. Sagan a chamou de
“Pálido ponto azul” e é uma das melhores imagens espaciais de todos os tempos.
No livro “Pálido Ponto Azul: Uma Visão do Futuro do Homem no Espaço” passou a
descrever a Terra como "uma partícula de poeira suspensa em um raio de
sol". A sonda Cassini fez a mesma coisa em 2013, com Saturno em
primeiro plano.
Garry Hunt, da equipe da Voyager, acha que a foto de 34 anos fica cada vez mais
relevante hoje: "Toda vez que dou uma palestra sobre clima questiono o que
alguém está fazendo agora em prol de uma mudança e mostro esta imagem, fica
claro que a Terra é um pontinho isolado. Esse pequeno ponto azul é o único
lugar em que podemos viver e o estamos estragando". Para refletirmos sobre
nossa “grandeza”, reproduzo a seguir as palavras de Carl Sagan em palestra na
Universidade Cornell em 1994, em que mostrou esta imagem da Terra.
Que discurso
“É aqui a nossa casa, somos nós. É neste ponto que ficam todos a quem ama, a quem conhece, qualquer um sobre quem você ouviu falar, cada ser humano que já existiu, viveram as suas vidas. O conjunto da alegria e sofrimento, milhares de religiões, ideologias e doutrinas econômicas confiantes, cada caçador e coletor, cada herói e covarde, cada criador e destruidor da civilização, cada rei e camponês, cada casal de namorados, cada mãe e pai, criança cheia de esperança, inventor e explorador, cada professor de ética, cada político corrupto, cada "superestrela", cada "líder supremo", cada santo e pecador na história viveu ali: - um grão de pó suspenso num raio de sol.”
“A Terra é um cenário muito pequeno nesta vasta arena cósmica. Pense nos rios de sangue derramados por todos aqueles generais e imperadores, para que, na sua glória e triunfo, pudessem ser senhores momentâneos de uma fração de um ponto. Pense nas crueldades sem fim infligidas pelos moradores de um canto deste pixel aos praticamente indistinguíveis moradores de algum outro canto, quão frequentes seus desentendimentos, quão ávidos de matar uns aos outros, quão veementes os seus ódios.”
“Nossas posturas, a nossa suposta auto importância, a ilusão de termos qualquer posição de privilégio no Universo, são desafiadas por este pontinho de luz pálida. O nosso planeta é um grão solitário na imensa escuridão cósmica que nos cerca. Na obscuridade desta vastidão, não há indícios de que vá chegar ajuda de outro lugar para nos salvar de nós próprios.
“A Terra é o único mundo conhecido, até hoje, que abriga vida. Não há outro lugar, no futuro próximo, para onde a nossa espécie possa emigrar. Visitar, sim. Assentar-se, ainda não. Gostemos ou não, a Terra é onde temos de ficar por enquanto.”
“Já foi dito que astronomia é uma experiência de humildade e criadora de caráter. Não há, talvez, melhor demonstração da tola presunção humana, do que esta imagem distante da Terra. Destaco a nossa responsabilidade de sermos mais amáveis uns com os outros, para preservarmos e protegermos este "pálido ponto azul", o único lar que conhecemos até hoje.”
Reflexão final
A Terra é redonda, minúscula e única no universo!
Autor:
Alberto Consolaro - Professor Titular da USP e Colunista de Ciências do JC.
Publicado no JC Bauru.
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