Mentirinhas tendem a se
tornar maiores, pois sentimento negativo se reduz.
RIO — “A mentira é como uma bola de neve; quanto mais rola,
mais cresce”. O dito popular, atribuído a Martinho Lutero, tem agora uma
explicação científica. Pesquisadores da Universidade College London, na
Inglaterra, descobriram que o ato de contar mentiras, mesmo as pequenas que
parecem inofensivas, acostuma o cérebro às emoções negativas associadas e, com
o tempo, pode encorajar as pessoas a contarem mentiras maiores.
—
Os exemplos estão em todo o lugar, seja nas fraudes políticas ou financeiras ou
na infidelidade — disse Tali Sharot, coautora do estudo publicado nesta
segunda-feira no periódico “Nature Neuroscience”.
Tali e seus colegas se questionaram se o cérebro se acostuma
com as mentiras, da mesma forma que acontece com o horror gerado por uma imagem
violenta se ela for vista várias vezes. Normalmente, as pessoas se sentem
culpadas por mentir, mas será que este sentimento desaparece com a prática?
Aparentemente, a resposta é sim.
O estudo envolveu 80 voluntários, que participaram de um
experimento que os encorajava a mentir, enquanto a atividade cerebral era
monitorada. Basicamente, cada pessoa recebia um jarro com diferentes
quantidades de moedas, e deveria enviar uma estimativa do valor no pote a um
parceiro em outra sala, que via apenas uma imagem borrada do jarro e precisava
acertar a quantia com base nas estimativas que recebia.
No primeiro cenário, foi dito aos participantes que quanto
mais correta fosse à estimativa, melhor seria para o voluntário e o parceiro na
outra sala. Dessa forma, seria benéfico para ambos enviar uma estimativa
verdadeira. Mas em outros cenários, respostas erradas beneficiavam os
voluntários em detrimento dos parceiros, e quanto maior fosse o erro, maior
seria a recompensa.
Resposta cerebral diminui
Os pesquisadores perceberam que as pessoas começaram a
fornecer estimativas com um pequeno erro, e o ato de contar essas mentiras
provocavam uma forte atividade na amígdala cerebelosa, região do cérebro
associada com a emoção. Mas com o tempo, a margem de erro na estimativa
aumentava, enquanto a resposta da amígdala diminuía.
— Quando você rouba ou mente em seu próprio benefício, você
se sente mal — disse Sophie van der Zee, da Universidade Livre de Amsterdã, na
Holanda, à revista “New Scientist”. — Mas quando você continua mentindo, esse
sentimento desaparece então você está mais disposto a mentir novamente.
A correspondência entre a mentira e os efeitos na amígdala
era tão forte que os pesquisadores puderam usar os resultados do monitoramento
cerebral para prever qual seria o tamanho da próxima mentira. Para Neil Garret,
coautor do estudo, ficou claro que “atos repetidos de desonestidade refletem
numa redução da resposta emocional para esses atos”.
— Isso está de acordo com a nossa sugestão de que a amígdala
sinaliza aversão a atos que consideramos errados ou imorais — disse Garret. —
Nós testamos apenas a desonestidade nesse experimento, mas o mesmo princípio
talvez seja aplicável ao escalonamento de outras ações, como comportamento de
risco e violência.
Fonte da reportagem: Jornal O Globo –
24/10/2016.
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