A
Câmara dos Deputados aprovou nesta segunda-feira (10) o texto base da proposta
de emenda à Constituição que congela os
gastos federais pelos próximos 20 anos, prioridade do governo
Michel Temer para 2016. A proposta restringe as despesas do governo à inflação
dos 12 meses anteriores, e tem duração de duas décadas, com possibilidade de
mudança na forma de limitar os gastos a partir do décimo ano.
Em dez pontos,
entenda o que é a medida, porque ela foi criada e como ela ajuda o Brasil, mas
não tira o país da recessão.
1 - O que é
PEC e por que é Teto?
É
um mecanismo proposto pelo governo para limitar o crescimento dos gastos
públicos a longo prazo, fixando como teto a inflação passada.
Como
algumas despesas têm regras ditadas pela Constituição, como saúde e educação,
para alterá-las é preciso fazer uma proposta de emenda constitucional (PEC),
cuja votação tem um rito especial. Depende de dois turnos na Câmara dos
Deputados e dois no Senado e só passa com aprovação de ampla maioria três
quintos dos deputados (308 votos) e dos senadores (49 votos).
Tratada
como prioridade número 1 do governo, a proposta tem boas chances de ser
aprovada neste ano.
2 - Gastando
chegamos até aqui.
Os
gastos do governo crescem mais do que o PIB há duas décadas e, repetidas vezes,
o buraco foi tapado com aumento de impostos ou criação de tributos como a
extinta CPMF ou a Cide (que incide sobre a gasolina). Outra forma foi aumentar
a dívida pública, que chegou a 70% do PIB neste ano bem acima da média dos
países com o mesmo estágio de desenvolvimento do Brasil (45% do PIB).
A
recessão, iniciada em 2014, piorou tudo: fez cair às receitas públicas e gerou
desconfiança com o futuro do Brasil, o que se traduziu em aumento das taxas de
juros cobrada pelos investidores para financiar o governo. Com isso, a dívida
assumiu uma trajetória insustentável no longo prazo.
3- O prazo de
validade do teto é longo.
O
teto do gasto proposto pelo governo durará pelo menos nove anos, se for
aprovado pelo Congresso. Depois disso, ou seja, em 2025, o presidente da
República poderia propor uma nova regra para contenção dos gastos, válida para
o seu mandato. E assim seria até 2036. Segundo economistas do governo, o prazo
dilatado é importante para sintonizar o ritmo das despesas com o das receitas
sem recorrer a mais impostos ou a um corte drástico de gastos. Economistas como
Felipe Salto, assessor do senador José Aníbal (PSDB), argumentam, porém que é
tempo demais para uma medida tão dura, que na prática congela os gastos do
governo.
Alternativas
chegaram a ser ventiladas, como atrelar o teto à evolução da dívida pública ou
reduzir o prazo de vigência, mas até agora prevaleceu o argumento do governo.
4 - A PEC não
resolve o problema.
Para
funcionar, o teto dos gastos públicos depende de mudanças na Previdência que
limitem o aumento dos gastos com benefícios e pensões. Por isso, a reforma
previdenciária é a segunda prioridade do governo.
Os
gastos da Previdência representam cerca de 45% das despesas públicas e crescem
atualmente 4% acima da inflação por ano, segundo o economista Bernard Appy, do
Centro de Estudos e Políticas Públicas. Para analistas do Itaú Unibanco, sem a
reforma da Previdência o teto só contribuiria para o equilíbrio das contas
públicas até 2019.
5 - O
resultado do teto só aparece no longo prazo.
Com
o teto, os gastos do governo devem cair como proporção do PIB, mas isso só vai
acontecer quando o país (e as receitas do governo) voltarem a crescer a um
ritmo superior à inflação, o que deve levar algum tempo.
Hoje
o país enfrenta uma recessão que deve chegar a 3,1% neste ano e inflação de
7,2%. Assim, no curto prazo, afirma o economista Felipe Salto, o efeito do teto
será nulo e até permitirá mais gastos. E, ao fim de 20 anos, produziria um superávit
primário brutal (equivalente a 6,5% do PIB), muito superior ao necessário para
reduzir a dívida pública.
Analistas
que defendem o teto, como Mauricio Oreng, do holandês Rabobank, dizem que,
mesmo com o teto, o governo só conseguirá fazer com que a dívida pare de subir
por volta de 2022, quando ela terá atingido um nível elevado (86% do PIB). Ou
seja, o endividamento público subirá por mais seis anos antes de estabilizar e
depois cair.
6- Tudo muda
na saúde e na educação.
Depois
da Previdência, saúde e educação são as duas áreas de maior despesa do governo.
Por isso, foram incluídas nos gastos sujeitos ao teto. Isso altera as atuais
regras, que destinam às duas áreas uma fatia fixa das receitas públicas.
7- Mas por que
a polêmica na saúde e educação?
Especialistas
em educação e saúde temem que as duas áreas percam a disputa de recursos para
grupos com lobby mais bem organizado no Congresso. E reclamam que, com as
regras em vigor, receberiam mais no longo prazo.
O
governo argumenta que, com a recessão, as receitas caíram sem que houvesse
redução dos gastos. Ou seja, a regra atual não protege as duas áreas no momento
mais difícil e quando mais gente recorre aos serviços públicos.
Além
disso, o teto estabelece que saúde e educação devam receber, no mínimo, o mesmo
que gastaram no ano anterior mais a inflação. Se durante a elaboração do
Orçamento os deputados quiserem destinar mais dinheiro para essas duas áreas,
será permitido, desde que cortem outras despesas. O teto global para a expansão
do gasto público não poderia ser desrespeitado.
8- A PEC do
Teto não tira o Brasil da recessão. Mas ajuda.
Conter
gastos não estimula a economia, mas indica que as contas do governo são
sustentáveis. No curto prazo, isso se traduz em mais confiança para os
empresários -que podem voltar a investir e produzir- e de consumidores. A
confiança começou a voltar lentamente. Com sinais de que o governo vai ajustar
suas contas, a taxa de juros também deverá cair, o que ajuda a reativar a
economia. O Itaú Unibanco prevê que, neste cenário, o país poderá crescer 4% em
2018.
No
longo prazo, porém, o Brasil deveria discutir outras reformas para melhorar a
eficiência da economia, observa o economista Bernard Appy, com mudanças no
sistema tributário e nas leis trabalhistas.
9- Se não
fizer é o precipício. Mas o que é o precipício?
A
primeira alternativa ao teto seria aumentar impostos. O governo prevê um déficit
de R$ 170,5 bilhões neste ano, equivalente a cinco vezes o que o governo previa
arrecadar com a CPMF em um ano. Ainda que coloque as despesas do passado em
dia, os gastos continuarão subindo e exigirão mais impostos a cada ano.
Segundo
analistas do Itaú Unibanco, sem o teto, o governo teria que aumentar a carga
tributária em 4 pontos percentuais do PIB, o que levaria os brasileiros a
entregar ao governo quase R$ 4 a cada R$ 10 que produzirem o que é muito para
um país em desenvolvimento.
A
segunda opção seria reduzir os gastos públicos artificialmente. O governo
imprimiria reais para pagar suas contas e deixaria a inflação subir para
corroer as despesas. A saída foi muito aplicada no passado e levou o país à
hiperinflação no início dos anos 1990.
A
terceira possibilidade seria deixar a dívida subir e não pagar, o que seria um
calote. E mais de 80% dos credores são poupadores brasileiros, que aplicam em
fundos de investimento e no Tesouro Direto, por exemplo, ou são ainda fundos de
pensão e de previdência privada.
10- O que
acontece se o teto for aprovado?
A
expectativa de economistas como Eduardo Loyo, do banco BTG Pactual, é que o
reordenamento das contas do governo permitirá uma queda permanente da taxa de
juros do Brasil, uma das mais elevadas do mundo, o que facilitaria o acesso de
empresários e consumidores a crédito. Para outros economistas, seria a chance
de o governo gerenciar melhor o dinheiro público e escolher políticas que deem
melhor resultado caso queiram permanecer no poder.
Autora Jornalista Mariana Carneiro
Publicado na Folha de SP em 11/10/16.
Autora Jornalista Mariana Carneiro
Publicado na Folha de SP em 11/10/16.
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