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“Ainda há
lacunas não preenchidas, como indícios de participação de outros políticos do
poder legislativo não mencionados no plano macabro”, diz Elisabeth Lopes.
Elucubrações convenientemente oportunistas têm sido
publicadas nas redes sociais, ou veiculadas na grande mídia sobre os futuros
julgamentos, se houver a denúncia pela Procuradoria Geral da República (PGR) ao
Supremo Tribunal Federal (STF), das 37 pessoas indiciadas pela Polícia Federal,
entre estas, o ex Presidente Bolsonaro, além de um número expressivo de
militares e de alguns civis pelos crimes de: Abolição violenta do estado
democrático de direito, organização criminosa, tentativa de golpe de Estado e plano
de assassinato do Presidente da República, Luís Inácio Lula da Silva, do Vice
Presidente Geraldo Alckmin e do Ministro do STF Alexandre de Moraes.
O intuito dessas publicações, como a de Tarcísio de
Freitas (Republicanos), de Flávio Bolsonaro (PL) e de Janaína Paschoal (PP),
entre outros que simpatizam com o bolsonarismo, é seguramente confundir a
opinião pública, uma vez que essas elucubrações não se sustentam. Para os
distraídos, entretanto, bastam narrativas repetidas para tornarem-se validadas
e espalhadas em rodas de conversa, como: “há uma narrativa disseminada contra o
Presidente Jair Bolsonaro e que carece de provas”; “pensar em matar não é
crime; “para ser golpe de estado teria que ser intentado pela totalidade das
forças armadas”. São muitas teses sem fundamento nenhum, mas com fins
ideológicos de minimização dos fatos estarrecedores, ocorridos ao longo do ano
2022.
Os tempos de uma convivência minimamente aceitável
entre adversários ideológicos deixou de existir, desde o avanço de uma extrema
direita fascista, movida pelo ódio, pela aderência a regimes totalitários e a
pautas retrógradas, censoras de todo e qualquer avanço nos costumes. Esse
segmento da política ultraliberal defende a permanência da concentração de
renda nas mãos de poucos, inclusive nas suas próprias mãos atreladas
visceralmente ao mercado.
Nesse horizonte dominante, os projetos
progressistas do atual poder executivo federal em favor da diminuição da
desigualdade social, mediante políticas públicas de bem estar social destinadas
a maioria alijada de condições de existência decente, têm sido constantemente
limitados pelo avanço da composição fisiologista da direita e da extrema
direita na atual composição do congresso. Esses representantes enganadores do
povo e a reboque de seus direitos, só encontram alguns freios pela movimentação
de políticos progressistas na judicialização de temas frontalmente
inconstitucionais.
Essa atrofia na balança entre legislativo e
executivo, favorecida pelo governo anterior que emponderou o legislativo na
festa das emendas secretas, afasta qualquer governo que se volte para os
interesses do povo. Certamente, pelo golpe de Estado, os legisladores da ala da
direita liberal e extrema direita seriam os primeiros a dar guarida à futura
ditadura e aos planos de violação dos direitos humanos. Uma troca conveniente,
tal como ocorreu no passado, durante a trajetória hedionda dos 21 anos de chumbo. Nesse contexto adverso, é necessário ressaltar que
nas divulgações sobre a recente tentativa de golpe, ainda há lacunas não
preenchidas, pelo menos não reveladas até o presente, como indícios de
participação de outros políticos do poder legislativo não mencionados no plano
macabro acordado entre militares, civis e até mesmo com membros da justiça. Certamente essas eminências pardas, com elevado
poder de barganha, se locupletariam ao máximo pela extirpação dos valores
democráticos e pelos ganhos, sem limites, para atender seus obscuros
interesses. O papel desses inescrupulosos seria o de mascarar a realidade, dar
guarida, a partir de uma falaciosa configuração de legalidade, a exemplo do
concretizado durante o processo de impeachment da Presidenta Dilma.
Os oportunistas, mesmo sem a concretização do golpe
terrorista, persistem manobrando os destinos do país com poderes interessados
nos segmentos que os beneficiam. Perpetuam-se como o mais corrosivo câncer
comprometedor do bom funcionamento das células do sistema democrático. De
acordo com análise feita por Felipe Nunes na Globo News, com base em pesquisa
da Quaest sobre as menções ao inquérito do golpe nas redes sociais, foi
observado que nos dias 19, 20 e 21/11 ocorreu um percentual elevado de interações
plurais apoiando o inquérito, depois do dia 26/11 a mobilização plural diminui,
dando lugar a menções negativas sobre o tema, tendo em vista o engajamento de
bolhas de rede, de acordo com Felipe Nunes. O que confirma a sanha, a meu
juízo, da atuação da extrema direita nos espaços digitais com a intenção de
suavizar os graves efeitos dos indiciamentos pelos atos de preparação e
execução em parte, do referido golpe.
Com a divulgação, pelo Ministro Alexandre de
Morais, do relatório de mais de 800 páginas sobre tentativa de golpe enviado
pela PF, vários relatos robustos de evidências vêm à tona, fornecendo
indubitavelmente a atuação de cada personagem do golpe. No relatório fica
evidente que seus articuladores sempre se reportavam a Bolsonaro, como líder
principal no planejamento. O país está diante de uma oportunidade ímpar para
extirpar, ou pelo menos na pior das hipóteses, minimizar alguns sintomas dessa
patologia que vem reincidindo e afetando o funcionamento democrático da
República pós fim da ditadura militar, como o golpe de impeachment da
presidenta Dilma, a prisão injusta do Presidente Lula, que tinha como objetivo
retirá-lo da eleição presidencial de 2018, orquestrada pelas armações da
Operação Lava Jato, ao arrepio do devido processo legal. Para tanto, os
segmentos progressistas do país não podem se calar diante da gravidade dos
crimes efetivados e tentados.
O conjunto de provas que compõem o relatório da PF
são incontestáveis. Por mais que a parte aliada à organização criminosa tente
argumentar ao contrário, essas investidas não têm atingido os fins de confundir
a opinião pública. Com a efetivação dos futuros tramites processuais estará
aberta a temporada do salve-se quem puder na escuta dos envolvidos no plano do
golpe, nas oitivas de testemunhas e nas possíveis delações premiadas. No
entanto, a sociedade brasileira não poderá calar em berço esplêndido. A urgência do trabalho da Procuradoria Geral da
República, diante da robusta comprovação da trama criminosa golpista,
fartamente documentada no eficiente trabalho da PF, deve marcar os próximos
passos da denúncia pela PGR.
Por fim, é imprescindível ressaltar o Manifesto que
solicita expulsão com desonra dos militares protagonistas do plano de
assassinato de Lula, de Alckimin e de Alexandre de Morais. Tal documento
expresso em abaixo assinado, está disponível em: https://www.expulsaocomdesonra.com.br/.
Neste, os honrosos signatários referem em um dos trechos: “A horrorosa trama
vinda a público é, no entanto, uma oportunidade única para a República afirmar
na prática os princípios e fundamentos estampados em sua Constituição, com a
punição exemplar desses vilões disfarçados de soldados. Com todo o devido respeito
aos direitos à ampla defesa e ao contraditório, deve-se combater a impunidade
com medidas imediatas”.
Numa perspectiva democrática e de devido processo
legal, diferentemente do que já vivenciamos nos tempos da Lava Jato, é urgente
e necessária a punição dos golpistas antidemocráticos. O povo brasileiro merece
viver num país livre de golpes fardados e civis, livre de políticos algozes,
livre de fisiologistas, de fascistas e de falsos representantes do povo que
exercem seus mandatos unicamente em favor de seus interesses individuais e
corporativos.
Precisamos de mais Luizas Erundinas, que em seus
quase 90 anos de idade, marcou sua digna atuação parlamentar em potente
discurso na Câmara de Deputados pela defesa do mandato de Glauber Braga (PSOL),
em processo que pode resultar na injusta cassação deste deputado, em que disse:
“Nós perguntamos aos eleitores do Rio de Janeiro que elegeram em cinco mandatos
consecutivos o deputado Glauber Braga, se eles concordam que o seu mandato seja
cassado por essa comissão? [..] O povo é o soberano e em qualquer democracia,
soberano é o povo, é aquele que delega poder através do voto democrático
soberano, independente, secreto para que seja preservada a soberania popular”.
[..] Esse tempo é sagrado para a gente continuar lutando pela democracia, não
estamos com a democracia consolidada, é uma plantinha ameaçada quase todo dia
por golpes e mais golpes, temos que cessar com isso”. (A fala integral da
deputada está disponível em várias plataformas das redes sociais). Encerro este
texto mencionando mais uma fala de Erundina, a verdadeira deputada do povo, na
sessão 1.2021 21 da Câmara de Deputados: “Presidente, lamentavelmente,
repete-se de uma gestão para outra a mesma alienação desta Casa daqueles que
dizem que aqui é a Casa do Povo, porque é uma Casa sem povo, é uma Casa que não
governa pensando no povo, que não representa de fato o povo”.
Que possamos gravar esse recado em nossas mentes,
ao depositarmos nosso voto sagrado na urna, com a certeza de que nunca mais
sejam eleitos usurpadores da democracia.
Autora:
Elisabeth Lopes – Advogada, especializada em Direito do Trabalho, Pedagoga e
Doutora em Educação. Publicado no site Brasil 247.