O experimentado Geraldo Alckmin (PSDB), em seu quarto mandato à frente do Estado de São Paulo, parece ter aprendido só nesta sexta-feira (4) algo básico a respeito de governos democráticos: nem sempre a população aceitará políticas públicas impostas de cima para baixo, sem o devido debate e um mínimo de transparência.
Pouco mais de dois meses após anunciar sua intenção de reorganizar a rede de ensino paulista, Alckmin viu-se obrigado a suspender o plano. Tomou a decisão pressionado pelo desmoronamento de seus índices de popularidade e pelos rumorosos protestos estudantis.
Às vésperas de se reeleger, no ano passado, o governador ostentava aprovação de 48%, segundo o Datafolha; na pesquisa ora divulgada, a taxa caiu para 28%. Além disso, as manifestações contra a proposta do governo vinham se espraiando, com bloqueios de vias e sobretudo invasão de escolas.
Alckmin parecia apostar no desgaste do movimento. Errou. O número de colégios ocupados passou de poucas dezenas a quase duas centenas num intervalo de 15 dias, e 55% dos entrevistados pelo Datafolha apoiaram os alunos.
Sem saída, o tucano disse o óbvio: "Entendemos que devemos aprofundar o diálogo". É o que deveria ter dito há muito tempo.
O plano tem méritos, como vem afirmando esta Folha desde que foi delineado. Dado o evidente potencial de conflito implícito na medida, defendeu-se aqui implementá-la com vagar, em caráter experimental e área restrita.
Contudo, talvez imaginando que pudesse conter os críticos na base da truculência policial, o governo lançou a proposta sem nem indicar quais escolas seriam afetadas. Para os grupos que se opõem à gestão tucana, foi uma festa; dificilmente encontrariam pretexto melhor para mostrar aos alunos o reino das manifestações políticas.
Perderam espaço, nesse processo, os bons argumentos a favor da reorganização. Por força da queda nas taxas de natalidade, da municipalização de parte do ensino e da migração para o sistema particular, a rede estadual perdeu 2 milhões de alunos de 1998 a 2014 (são hoje 3,8 milhões). Muitas salas, portanto, estão ociosas.
Fechando 92 unidades (menos de 2% das mais de 5.000 existentes) e remanejando 311 mil estudantes (cerca de 8% do total), o governo espera ampliar em 30% as vagas de tempo integral e reabrir quase 3.000 classes desocupadas.
Pretende, ademais, aumentar de 1.443 para 2.197 as escolas em ciclo único, com estudantes de idade aproximada. É indiscutível que esse modelo facilita a gestão, permitindo equipamentos adaptados para determinada faixa etária.
Faz todo o sentido, como se vê, levar adiante a reorganização escolar. Os alunos mostraram-se intransigentes, mas ao final obtiveram sua vitória –e ensinaram a Geraldo Alckmin boas lições de política.
Editorial da Folha de SP - 05/12/2015.
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