Escândalo financeiro mundial e
vitória contra austeridade
ficam escondidos na imprensa
Aproveitando a mais do que merecida
folga da querida e competente Vera Guimarães, vou dar uma de ombudsman
acidental. É de estranhar, para dizer o mínimo, o laconismo com que a imprensa
"mainstream" local vem tratando um dos maiores escândalos da história
financeira mundial.
Falo da revelação de que o HSBC na
Suíça ajudou milionários a ocultar bilhões de dólares e assim fugir do fisco em
seus países de origem. A lista é ecumênica: inclui desde ricaços tidos como
"limpos" até traficantes, ditadores e criminosos dos mais variados.
São mais de 100 mil contas. O valor da
maracutaia internacional passa de US$ 100 bilhões. Em moeda local, algo perto
de R$ 300 bilhões. O argumento de que o tema está distante do leitor nacional
não resiste aos fatos: cerca de 9.000 clientes envolvidos na falcatrua são
brasileiros; o HSBC é um dos maiores bancos a operar no país; e, pelo que a
investigação conseguiu apurar, a roubalheira decolou depois da aquisição, pelo HSBC,
de um banco e de uma holding de propriedade de Edmond Safra. A familiaridade do
sobrenome com o Brasil, embora não seja prova de nada, dispensa comentários e
deveria ser suficiente para aguçar a curiosidade de qualquer jornalista.
Surpresa: o assunto praticamente
desapareceu, a não ser quando encontraram supostas conexões com o pessoal da
Lava Jato. Esquisito. E os outros milhares de correntistas brasileiros
premiados, desapareceram? A história não fecha. Aliás, é a segunda vez que um
trabalho do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos recebe
tratamento desprezível no Brasil.
Há pouco tempo, a mesma equipe
escancarou manobras tributárias de bancos e multinacionais, brasileiros
incluídos, para fugir de impostos com operações em Luxemburgo. Uma das empresas
acusadas na artimanha, a Pricewaterhouse, por acaso vem a ser uma das que
aprovavam balanços podres de instituições protagonistas da crise de 2008. Hoje
a Price examina a contabilidade da Petrobras... Detalhe: o premiê de Luxemburgo
na época das sonegações, Jean-Claude Juncker, é o atual presidente da Comissão
Europeia. E o homem forte do HSBC no período do vale-tudo da Suíça virou
ministro no governo britânico do conservador David Cameron. Precisa mais?
PARANÁ NA MODA; E NA MÍDIA?
PARANÁ NA MODA; E NA MÍDIA?
Curitiba viveu recentemente uma das
maiores manifestações de sua história. Milhares de servidores públicos,
trabalhadores e estudantes obrigaram o governador reeleito Beto Richa, do PSDB,
a recuar no chamado "pacote de maldades" enviado à Assembleia
Legislativa.
Entre outros disparates, o tucano
propunha confiscar a previdência dos servidores para tapar rombos da antiga
administração --dirigida por ele mesmo! Deputados chegaram de camburão,
reuniram-se no restaurante e, ainda assim, não conseguiram votar o pacote.
Notícia daquelas, de repercussão nacional, exceto na mídia de fora da região.
Foi na capital do Paraná. Mesmo Estado
onde fica a Londrina do juiz Sérgio Moro, sede do antigo Bamerindus vendido a
preço simbólico ao HSBC e do Banestado (Banco do Estado do Paraná), pivô da CPI
que durante os anos 90 catapultou o doleiro Alberto Yousseff para manchetes.
Mera coincidência, talvez.
Ricardo
Melo – Colunista da Folha de SP. Artigo publicado na Folha de SP em 16/02/15.
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