Intervenção
de Trump dificilmente influirá na divisão territorial consolidada em sete anos
de conflito.
O conflito da
Síria parece estar a um passo de se transformar em guerra
mundial, haja vista a internacionalização das forças em confronto, mas ainda
não ultrapassou a categoria de contenda regional com múltiplas frentes
abertas.
Depois de
sete anos de guerra civil — meio milhão de mortos, a metade da
população desabrigada pelos combates e dependente da ajuda exterior —, a
intervenção ordenada pelo presidente Donald Trump
para castigar Damasco pelo ataque químico de sábado passado
dificilmente influirá na divisão territorial do país. O presidente Bashar al
Assad controla quase dois terços do território e consolidou sua vitória sobre
os rebeldes, aquartelados no norte e em alguns bolsões restritos do centro e do
sul, graças ao apoio de Rússia, Irã e seus aliados xiitas.
Os Estados Unidos, que quase deram por
concluída a missão contra o Estado
Islâmico, se dispõem a deixar à própria sorte os aliados curdos que
o ajudaram a enfrentar o EI e que agora dominam outro terço do país. A Turquia
irrompeu em solo sírio para se apoderar de um cordão de segurança na fronteira
que lhe permita manter a influência sobre os insurgentes do norte. Israel e
outros vizinhos observam atentos as mudanças no tabuleiro sírio para reagir em
função de seus interesses. Estas são as posições do front depois da represália
dos EUA, secundada por França e Reino Unido.
Regime sírio
Domina a chamada Síria útil, as
grandes cidades, o litoral e as regiões férteis. Mediante assédios, ofensivas
esmagadoras e “pactos de reconciliação” (rendição em troca de uma evacuação
segura), está se apoderando dos redutos da oposição. A campanha da Guta
Oriental, na periferia da capital, termina exatamente com o recuo dos rebeldes
de Jaish al Islam depois do bombardeio químico denunciado em Duma. Al Assad praticamente
venceu a guerra, mas mantém-se associado e à mercê de seus aliados de Moscou e
Teerã, que o salvaram a três anos de uma derrota iminente.
Rússia
Vladimir
Putin reforçou o destacamento de sua melhor aviação de combate
na Síria em setembro de 2015. Agiu em defesa de sua única base aeronaval no
Mediterrâneo, apesar de que parece ter ocupado aos poucos o espaço abandonado
por Washington no Oriente Médio. Cerca de 50.000 militares russos passaram em
sucessivas rotações pelo front sírio. Com seus sistemas de mísseis terra-ar
S-400 domina o espaço aéreo, de forma que EUA e Israel notificam o país de seus
voos para evitar enfrentamentos acidentais. O Kremlin se apresenta como vencedor
visível do conflito.
Irã e as
milícias xiitas
Os oficiais da Guarda Revolucionária
enquadram dezenas de milhares de milicianos xiitas do Líbano (Hezbollah) e
Iraque, que constituem a verdadeira tropa de choque — e bucha de canhão — das
fileiras governamentais. Teerã tenta
erigir uma “ponte terrestre” até o Líbano passando por Iraque e Síria para
consolidar sua hegemonia sobre três nações com forte prevalência do ramo
muçulmano xiita. Este plano iraniano é visto com preocupação pelo Ocidente.
Oposição
sunita
Centenas de milhares de combatentes de
milícias islâmicas sunitas foram se reagrupando no norte da Síria, na província
de Idlib e em parte da de Alepo, depois de serem expulsos pelo Exército do regime
de seus territórios. Tahrir al-Sham, que integra a antiga Frente al Nusra
(filial da Al Qaeda) e outros grupos salafistas são as forças preponderantes. A
oposição no exílio conseguiu reunir-se em torno de uma plataforma que exige a
saída de Al Assad do poder para poder negociar com o regime.
Milícias
curdas
Mais de 50.000 combatentes curtidos na
luta contra o Estado Islâmico controlam duas terças partes da fronteira com a
Turquia e grandes trechos do vale do Eufrates. Tentam uma aproximação do
Governo de Damasco e da Rússia depois do anunciado recuo dos EUA, que até agora
foram seu principal defensor na contenda.
Estados Unidos
A Casa Branca pretendia retirar os
2.000 a 4.000 militares das forças especiais destacados na Síria para
assessorar as milícias curdas, apesar de o Pentágono considerar a ideia
prematura ainda. O voo dado por Trump depois das denúncias do ataque químico em
Duma pode levar os EUA a reconsiderar a presença militar e seu envolvimento na
guerra. Na campanha eleitoral Trump garantiu que o único objetivo era a derrota
do Estado Islâmico.
Turquia
O Exército de Ancara se apoderou de
uma ampla faixa de território sírio em paralelo à fronteira norte ocidental.
Com o apoio de forças rebeldes do Exército Livre da Síria desalojou este ano as
milícias curdas do cantão de Afrin e garantiu posições diante de uma divisão
territorial depois da guerra.
Estado
Islâmico
Centenas de jihadistas vagam ainda
pelo deserto que separa a Síria do Iraque, sem serem totalmente erradicados. O
califado territorial fundado por Abu Bakr al Baghdadi em 2014 passou para a
história. Mas a ameaça de terror jihadista global do EI não desapareceu.
Israel
Putin telefonou para o
primeiro-ministro Benjamin Netanyahu para estimulá-lo a não desestabilizar a
Síria com uma intervenção como a que foi atribuída à aviação israelense esta
semana. Israel rechaça “a qualquer preço” que o Irã se estabeleça como potência
militar no vizinho país árabe.
Autor: Juan Carlos Sanz
Autor: Juan Carlos Sanz
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