País
deixará de arrecadar pelo menos R$ 5 bilhões neste ano com aplicações que
beneficiam bancos, construtoras, agronegócio e investidores mais ricos.
Uma renúncia fiscal bilionária que
beneficia principalmente os mais ricos entrou na mira de Michel Temer, Henrique
Meirelles e companhia: a isenção de Imposto de Renda para aplicações em letras
de crédito imobiliário (LCIs) e do agronegócio (LCAs).
A ideia de acabar com o incentivo, no
entanto, ficou restrita aos relatos de bastidores e não foi abordada em público
pelo presidente. Não se sabe se o governo pensa em acabar também com a isenção
para títulos similares, como os certificados de recebíveis desses mesmos dois
setores (CRIs e CRAs).
Ao não cobrar Imposto de Renda desses
investimentos, o governo abrirá mão neste ano de pelo menos R$ 5 bilhões – R$
3,6 bilhões referentes às letras de crédito e R$ 1,4 bilhão dos certificados de
recebíveis.
Essa seria a arrecadação caso
incidisse sobre os rendimentos a menor alíquota de IR cobrada de outras
aplicações, de 15% para quem deixar o dinheiro aplicado por no mínimo dois
anos. A estimativa considera um rendimento anual próximo ao da taxa Selic, que,
segundo as projeções do mercado financeiro, ficará em 9,9% na média de 2017.
Governo quer
reduzir benefícios ao setor privado e aos mais ricos. Mas está falhando. O interesse do governo em tributar
esses títulos enfrenta a resistência dos bancos, que ganham dinheiro
intermediando a compra e a venda de letras e certificados, e também de construtoras
e produtores rurais, cujos projetos são financiados com o dinheiro aplicado
pelos investidores. São setores bem representados no Congresso. O agronegócio,
principalmente: a bancada ruralista, reunida na Frente Parlamentar da
Agropecuária, tem 210 deputados e 24 senadores.
Dinheiro
barato para empresas
Os títulos isentos de IR não
beneficiam apenas quem aplica neles, mas também as empresas que emitem os
títulos. Como o investidor não paga imposto e, portanto, tem um ganho líquido
maior que o de outras aplicações semelhantes, as companhias não precisam
oferecer um “prêmio” – rendimento acima da renda fixa convencional – muito alto
para tornar a aplicação interessante. Assim, conseguem se financiar a custos
mais baixos que emitindo títulos de dívida (debêntures) ou pegando dinheiro
emprestado no mercado financeiro.
Um ponto polêmico é que mesmo empresas
sem ligação com o agronegócio têm conseguido levantar recursos baratos por meio
de CRA, com o aval da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). No ano passado, o
Burger King arrecadou o equivalente a R$ 150 milhões e o Grupo Pão de Açúcar,
R$ 750 milhões. Os recursos seriam usados para a compra de insumos, como
produtos agropecuários e hortifrutigranjeiros.
Os bancos também saem ganhando,
cobrando taxas sobre as operações. Que, por sinal, cresceram muito nos últimos
anos, tomando espaço de aplicações de renda fixa que pagam imposto, como os
tradicionais Certificados de Depósito Bancário (CDBs).
Investimento
para poucos
Entre o fim de 2010 e o fim de 2016, o
estoque de aplicações em LCIs, LCAs, CRIs e CRAs saltou de R$ 61 bilhões para
R$ 332 bilhões. No mesmo intervalo, a carteira de CDBs encolheu de R$ 854
bilhões para R$ 553 bilhões.
Mas, ao contrário do que ocorre com os
CBDs, que exigem aplicações mais baixas (a partir de R$ 200, em alguns casos),
investir em título isento de imposto não é para qualquer um.
O valor mínimo fica a critério de cada
banco, e é comum que as instituições deem preferência a clientes que movimentam
mais dinheiro, já que existe um número limitado de títulos a serem
distribuídos. Na Caixa, por exemplo, a aplicação mínima é de R$ 30 mil. Alguns
bancos exigem pelo menos R$ 50 mil.
Governo queria reduzir benefícios ao
setor privado e aos mais ricos. Mas está falhando
A equipe econômica defendeu em
diversas ocasiões a redução dos subsídios e incentivos fiscais para o setor
privado. Até agora, com pouco resultado.
Foi assim com a tentativa de reverter à
desoneração da folha de pagamentos. A “reoneração” vigorou por poucos meses,
porque o governo não conseguiu aprovar a medida provisória (MP) no Congresso e
ela perdeu efeito.
No momento, o Planalto tenta aprovar a
MP que eleva a taxa de juros cobrada pelo BNDES, com a troca da TLJP pela TLP,
que reduzirá o subsídio para empréstimos a empresas.
Outra medida que pode ser anunciada em
breve é o aumento da tributação dos chamados fundos de investimentos
exclusivos, restritos a grandes investidores, que poderia gerar uma arrecadação
extra de R$ 6 bilhões.
O governo também cogitou cobrar mais
Imposto de Renda das camadas mais ricas da população, com a criação de um
alíquota de 35% para quem ganha mais de R$ 20 mil por mês e o fim da isenção de
lucros e dividendos. Mas o presidente Michel Temer desistiu da iniciativa horas
depois de afirmar em público que ela estava em estudo.
Medidas como essas buscavam, antes de
mais nada, diminuir o rombo das contas públicas, mas também poderiam aliviar as
distorções no tratamento que o governo dá às diferentes classes de renda da
população.
Como a tributação no Brasil é
excessivamente concentrada sobre o consumo e sobre os salários, os mais pobres
e a maioria dos assalariados acabam pagando proporcionalmente mais imposto que
os ocupantes do topo da pirâmide social.
Autor:
Fernando Jasper – Publicado na Gazeta do Povo - Curitiba
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